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Aspectos Econômicos Da Recomposição De Matas Ciliares E Preservação De Mananciais
                                 No 
início do século passado, como não havia pressão generalizada sobre as reservas 
de recursos naturais, ainda não existia uma consciência da necessidade de 
preservar e conservar os sistemas naturais. Muitas vezes, pela absoluta 
inexistência de conhecimento sobre a complexidade e a fragilidade dos sistemas 
ecológicos, foram organizadas ações altamente predatórias. Por exemplo, por 
força da chamada 'Lei Oswaldo Cruz', os proprietários de áreas com matas 
ciliares foram obrigados a derrubá-las, com vista ao controle e eliminação do 
mosquito transmissor da febre amarela.  1TOLEDO, Paulo. E. N. de & MONTICELLI,, Cícero 
J.    Estimativa do custo privado da recuperação de matas 
ciliares.    Informações Econômicas, SP, v.26, n.1, janeiro de 
1996. p.13-21.   2 TOLEDO, Paulo. E. N. 
de   Relação Custo/Benefício da Adequação Ambiental da Produção 
Agropecuária, Microbacia do Córrego São Joaquim, Pirassununga, SP   
In: FOURTH INTER-AMERICAN DIALOGUE ON WATER MANAGEMENT.   Foz do 
Iguaçu, 02-02 de setembro de 2001.   Abstracts.   Foz de 
Iguaçu: Inter-American Water Resources Network/ Organização do Estados 
Americanos - OEA, 285p.   3O conceito de 'excedente do consumidor' é definido 
como a diferença entre o valor efetivamente pago pelo produto e o valor máximo 
que o consumidor estaria disposto a pagar para ter uma quantidade adicional, 
versus a alternativa de não tê-lo. Permite estimar os benefícios sociais de um 
projeto de investimento.  
            
Porém, com crescimento da população mundial e o desenvolvimento econômico das 
nações, começa a ocorrer o chamado 'consumo' de meio ambiente, e a se alterar de 
forma marcante as relações entre o homem e a natureza. A industrialização e a 
evolução tecnológica, usualmente aplaudidas como conquistas da sociedade 
moderna, passam a ser responsabilizadas pelas agressões ao meio ambiente e pelo 
uso predatório dos recursos naturais e vistas, inclusive, como formas potenciais 
de restrições ao próprio crescimento econômico. 
            
Dentre os muitos problemas de preservação e recuperação de ecossistemas com que 
a comunidade paulista se depara, destaca-se sobremaneira a questão da 
preservação e restauração florestal do Estado de São Paulo. Recente levantamento 
da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Estado de São Paulo (SMA) estima a 
existência de 3,4 milhões de hectares cobertos por vegetação nativa, 
representando cerca de 13,7% da área total. Os pequenos fragmentos remanescentes 
distribuem-se de forma heterogênea, notando-se certa concentração na Serra do 
Mar e nas unidades de conservação sob gestão pública. 
            
As áreas florestadas são de suma importância não apenas pela sua contribuição 
como berço de biodiversidade como também pela sua reconhecida afinidade e 
funcionalidade no ciclo da água. Neste atributo, destaca-se a mata ciliar, 
fundamental para o equilíbrio ambiental, cuja recuperação proporciona benefícios 
muito significativos sob vários aspectos. 
            
Do ponto de vista local, protege a água e o solo, reduzindo o assoreamento dos 
rios e o aporte de poluentes; constitui-se em corredores, possibilitando o fluxo 
gênico entre remanescentes florestais; fornece alimentação e abrigo para a 
fauna; e funciona como filtros naturais controlando a disseminação de pragas e 
doenças nas culturas agrícolas. Do ponto de vista global, destaca-se sua função 
estratégica na contenção do efeito 'estufa', pois florestas em crescimento fixam 
carbono e contribuem para a redução dos gases de efeito estufa. 
            
Uma das preocupações do legislador ao instituir o Código Florestal (Lei Federal 
n.º 4.771/65) foi a proteção da flora, da fauna, do solo e das águas. As 
chamadas florestas de preservação permanente demonstram esta preocupação. O 
Artigo 3º desta Lei cria outras situações de proteção, na mesma defesa, desde 
que declaradas por ato do poder público. 
            
Embora o Código Florestal tenha mais de 30 anos, não houve mecanismo que pudesse 
incentivar a reposição das áreas desmatadas. O custo é por demais oneroso para 
ser absorvido apenas pelos agricultores, visto que o interesse é de toda a 
sociedade. Um programa destes, financiado pelo poder público para que o custo 
fosse diluído por todos, seria também por demais oneroso. 
            
Com o propósito de avaliar o peso dessa legislação para o proprietário rural, 
através de uso da programação linear, obteve-se uma diminuição de 10,76% na 
renda bruta anual de uma propriedade à margem do Rio Pardo, referente à 
implantação de mata ciliar em 30 hectares classificados como área de preservação 
permanente1. 
            
Posteriormente, ao observar a questão tendo como referência geográfica a 
microbacia do Córrego São Joaquim, em Pirassununga (SP), foi realizada a 
simulação de um projeto de adequação ambiental à luz da legislação vigente, onde 
foram avaliadas 28 propriedades, individualmente e para a microbacia como um 
todo2. Verificou-se que, em um horizonte de 
projeto de 20 anos, em 19 das propriedades analisadas, os fluxos financeiros 
apresentavam taxa interna de retorno (TIR) acima de 15%; em 4 delas, a TIR 
encontrada foi positiva, porém abaixo de 15%; e, para 5 propriedades, o fluxo 
apresentou-se negativo, não permitindo estimar a TIR. 
            
Os resultados apresentados na análise econômica mostram que, apesar de ser um 
investimento atraente, para mais de 50% dos agricultores, o fluxo de caixa dos 
primeiros 10 anos dificulta sua adoção, pois invariavelmente as propriedades 
apresentaram rentabilidade negativa nos anos iniciais do projeto. Assim sendo, 
possíveis programas de recuperação e preservação ambiental nessas áreas deverão 
levar em conta essa questão. 
            
O agricultor, ao praticar uma agricultura que respeite a sustentabilidade do 
sistema ambiental explorado, estará também contribuindo para a manutenção de uma 
produção de água mais regular e segura, além de melhor qualidade. 
Consequentemente, a sociedade urbana precisa melhor avaliar e reconhecer essa 
contribuição da agricultura, compartilhando dos custos impostos pela observância 
das restrições ao uso do solo que conduzam a uma agricultura moderna e 
sustentável. A esse propósito, através da estimativa do excedente do 
consumidor3, verificou-se que um aumento na vazão 
média do córrego São Joaquim, que possibilite captação de mais 4,1% de água, já 
seria suficiente para tornar a estimativa do valor do benefício social igual ao 
montante despendido pelos agricultores com a adoção das medidas mitigadoras. 
            
Finalmente, creio ser bastante oportuna uma política de 'renda mínima' para as 
pequenas propriedades que necessitem recompor as áreas de preservação permanente 
às margens de cursos d'água. Essa política, aplicada em áreas de mananciais, 
poderia viabilizar as pequenas propriedades sem condições de cumprir a lei, pois 
têm de ser cultivadas em toda a sua extensão para propiciar uma expectativa de 
renda compatível com a subsistência de uma família. 
   
Data de Publicação: 26/03/2003
                Autor(es): 
                Paulo Edgard Nascimento De Toledo (ptoledo@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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