Artigos
Evolução da Indústria Rural Paulista, 2001-2005
                                 Na última década o debate sobre o desenvolvimento agrícola sustentável revalorizou a Indústria Rural (IR) de bases artesanais enquanto indutora desse novo padrão de crescimento.              Mas são raras as informações quantitativas que permitam dimensionar econômica e socialmente a IR. Assim, este estudo busca captar a dimensão e a importância da IR paulista em termos de geração de renda e de emprego. A IR foi definida como o beneficiamento ou transformação, em bases artesanais, de matérias-primas vegetais ou animais, próprias ou adquiridas de outros produtores nas propriedades rurais para a venda externa, sendo desconsideradas agroindústrias, como usinas de açúcar, destilarias de álcool, extratoras de suco de laranja, fábricas de laticínios e outras grandes instalações. Foram elaboradas questões básicas: valor anual da produção comercializada com base em matéria-prima agrícola; percentual da matéria-prima utilizado na IR, produzida na própria UPA¹; percentual da renda total da UPA obtido com a IR; destino do produto processado na UPA; e ocupação e emprego na IR.              As estimativas foram obtidas por meio da pesquisa amostral probabilística direcionada ao levantamento de previsão e estimativas de safras da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA). Os dados foram levantados pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA) e pela Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI) junto ao produtor ou responsável pela UPA, nos levantamentos de junho de 2002 a 2006².              No período analisado, o total de UPAs que desenvolviam atividades industriais variou desde o mínimo de 3.112 em 2001 até o máximo de 4.375 em 2004. O valor anual da produção da IR paulista em 2001, em R$ de 2005 pelo IPCA/IBGE, foi de R$180.560.067, passando a R$258.915.709 em 2005, com crescimento de 43,4%. O maior valor de produção foi obtido em 2004, de R$307.746.165 (Tabela 1).              Dentre as atividades, destacaram-se as participações de torrefação e moagem de café e de leite pasteurizado, que, em 2005, foram de 42,0% e 25,6%, respectivamente. Ressalte-se que a primeira apresentou oscilações durante o período, explicadas pelo fato de a cultura cafeeira ser bienal quanto a sua produção, especialmente nas lavouras conduzidas a pleno sol. Seguem-se o processamento de frutas e o de madeira, com participações de 6,3% e 2,4% em 2005, respectivamente, além da fabricação de queijos, iogurte, manteiga, creme e doce de leite, com 3,2% e a confecção de doces, compotas, geléias, conservas, pães, roscas e bolachas, com 1,6%. A categoria 'outros' mostrou relevância por incluir packing-house (Tabela 1). 
Tabela 1 - Valor Anual da Produção da Indústria Rural, por Atividade, Estado de São Paulo, 2001 a 2005 
(em R$ de 2005)1
| Atividade |        2001  |            2002  |            2003  |            2004  |            2005  | 
| Doces, comp., gel., cons., pães, roscas, bol. |        5.975.839  |            4.194.298   |            4.850.906   |            5.019.051   |            4.236.430   | 
| Queijos, iogurte, mant., creme e doce de leite |        8.424.889   |            7.512.468   |            9.200.165   |            10.201.340   |            8.251.320   | 
| Mel |        28.335   |            26.128   |            33.856   |            139.551   |            611.000   | 
| Pescado |        116.251   |            107.194   |            132.964   |            124.733   |            108.000   | 
| Process. hortaliças2 |        141.677   |            130.638   |            1.692.823   |            1.588.040   |            1.375.000   | 
| Process. frutas, sucos |        -   |            22.942.823   |            19.999.931   |            18.761.974   |            16.425.000   | 
| Farinhas e polvilho |        413.543   |            381.321   |            369.897   |            347.001   |            876.000   | 
| Torrefação e moagem de café |        98.163.897   |            92.248.664   |            58.869.487   |            118.853.339   |            108.854.925   | 
| Aguardente |        -   |            496.508   |            2.154.502   |            3.124.974   |            2.705.750   | 
| Leite Pasteurizado3 |        12.596.201   |            106.984.621   |            93.736.580   |            80.847.764   |            66.403.600   | 
| Processamento de madeira |        10.905.272   |            10.055.580   |            9.857.276   |            9.386.692   |            6.160.000   | 
| Processamento de cereais |        -   |            -   |            101.200   |            60.288   |            52.200   | 
| Embutidos e defumados |        -   |            -   |            -   |            -   |            480.000   | 
| Açúcar mascavo, melado e rapadura |        -   |            -   |            -   |            -   |            4.680.000   | 
| Fumo |        -   |            -   |            1.292.701   |            1.600.745   |            1.386.000   | 
| Outros (inclusive packing-house) |        43.794.162   |            43.768.785   |            48.404.265   |            57.690.673   |            36.310.484   | 
| Total |        |            |            |            |            | 
1Em R$ de 2005 pelo IPCA/IBGE. 
2A partir de 2003, foram informadas novas UPAs com esta atividade, o que justifica o acréscimo observado. 
3No levantamento de 2001, o leite pasteurizado estava incluso no item outros, tendo sido considerado separadamente quando assinalados pelo informante. 
Fonte: IEA/CATI. 
O percentual da renda total nas UPAs respodentes desta questão, obtido com a IR, apresentou oscilações no período estudado, explicadas pelo fato de ser, notadamente para os produtores familiares, atividade que se alterna com a produção agrícola, conforme as oportunidades de preço e comercialização. Assim, em 2001, 929 UPAS (37,2%) obtiveram entre 20,1% e 60% de sua renda anual com a indústria rural. A seguir vêm as faixas de 60,1% a 80%, com 559 UPAs (22,4%), de 80,1% a 100% com 522 UPAs (20,9%) e finalmente a de até 20% com 489 UPAs (19,6%). Em 2005, verificaram-se participações com menor diversidade, variando de 27,6% na faixa de 80,1% a 100% da renda a 21,4% na faixa de 20,1% a 60% da renda obtida (Tabela 2).
Com relação ao percentual da matéria-prima produzida na própria UPA e utilizada na IR, observou-se que, no período 2001-2005, entre 70% e 78% do total das UPAs utilizaram entre 90,1% e 100% de sua própria produção. Variações na proporção da renda são esperadas uma vez que as UPAs, em geral, possuem além da IR, atividades agropecuária. Sendo assim, a composição da renda pode se alterar de um ano para outro.
Tabela 2 - Número de UPAs de Acordo com Percentual da Renda Total Obtida com a IR, 2001 a 2005
| Limite (%) |        2001  |            2002  |            2003  |            2004  |            2005  | 
| 80,1-100 |        522  |            417   |            666   |            1.096   |            802   | 
| 60,1-80 |        559  |            897   |            697   |            665   |            739   | 
| 20,1-60 |        929  |            58   |            816   |            480   |            623   | 
| até 20 |        489  |            1.654   |            346   |            760   |            743   | 
| Total |        2.499  |            3.026   |            2.525   |            3.001   |            2.907   | 
Fonte: IEA/CATI.
No período analisado, em média, 33,1% das UPAs realizaram vendas diretas do produto processado, na própria UPA; 31,5% delas, em média, comercializaram o produto processado junto a atacadistas; 30,4% através dos supermercados e mercearias dos centros urbanos mais próximos; e 3,9% do total de UPAs, em média, venderam para outra indústria. A venda para associações só teve importância em 2004, totalizando 23,8% das UPAs. Observou-se que entre 2002 e 2003 uma parcela de UPAs deixam de comercializar seus produtos na propriedade, o que pode estar relacionado ao fato de ter sido ano ruim para a produção de café e, conseqüentemente, para a torrefação de café, o que pode ter alterado as participações (Tabela 3).
Tabela 3 - Número de UPAs Segundo o Destino da Produção da Indústria Rural, 2001 a 20051
| Ano | Venda na UPA   | Atacadista  | Outra indústria  | Supermercado e mercearia  | Cooperativa  | Associação  | 
| 2001 | 1.333  | 830  | 83  | 1.507  | -  | -  | 
| 2002 | 2.603  | 1.371  | 400  | 1.340  | 176  | -  | 
| 2003 | 684  | 1.563  | 145  | 1.566  | -  | 667  | 
| 2004 | 1.555  | 1.169  | 140  | 909  | 87  | 1.041  | 
| 2005 | 1.041  | 1.461  | 115  | 907  | 359  | 457  | 
¹ A mesma UPA pode ter informado mais de um destino.
Fonte: IEA/CATI.
A ocupação de trabalhadores na IR paulista cresceu de 2001 a 2005, à exceção de 2005, passando de 10.161 pessoas em 2001 para 23.504 em 2004, com aumento de 131,3% (em média, 3 a 5 pessoas por UPA). Sobre 2005, deve-se ressaltar a baixa do valor da produção da IR naquele ano, bem como a maior demanda por trabalhadores na agroindústria sucroalcooleira, devido à expansão desse segmento da agropecuária paulista, sugerindo que trabalhadores ainda residentes na UPA não mais trabalhem na IR.
A distribuição anual entre residentes e não residentes nas UPAs variou, de um máximo de 54,0% em 2004 para um mínimo de 42,8% em 2002 para os residentes. Nestes últimos, destacaram-se as participações dos proprietários e familiares e dos trabalhadores permanentes, de 66,4% e 31,5%, respectivamente, em 2004. Com relação aos não residentes, os empregados permanentes tiveram maior participação, atingindo até 77,1% em 2001. Note-se que 4: em 2002 apenas 2 parceiros foram informados, passando para 757 em 2003, enquanto a ocupação de empregados permanentes foi de 1.444 para 2.735, sugerindo que alterações nas formas de contrato podem ocorrer (Tabela 4).
A ocupação da categoria de trabalho temporário apresenta oscilações também nas atividades agropecuárias. A diferença observada entre 2002 e 2003 pode ser explicada pela queda na torrefação de café que, neste caso, pode ter afetado, principalmente, essa categoria.
Tabela 4 - População Ocupada na Indústria Rural, por Categoria, 2001 a 2005
| Categoria | 2001  | 2002  | 2003  | 2004  | 2005  | 
| Residente na UPA | |||||
| Proprietário, familiares e agregados | 3.418   | 3.268   | 6.081   | 8.424   | 5.174   | 
| Parceiro, sócio, familiares e agregados | 74   | 2   | 757   | 273   | 263   | 
| Empregados permanentes | 1.444   | 2.735   | 2.897   | 4.000   | 903   | 
| Empregados temporários | 278   | -   | -   | -   | -   | 
| Subtotal | 5.213   | 6.006   | 9.735   | 12.697   | 6.340   | 
| Não residente na UPA | |||||
| Proprietário, familiares e agregados | 1.011   | 976   | 2.742   | 3.328   | 1.786   | 
| Parceiro, sócio, familiares e agregados | -   | 303   | 494   | -   | 168   | 
| Empregados permanentes | 2.519   | 3.535   | 4.499   | 5.065   | 3.963   | 
| Empregados temporários | 1.418   | 3.217   | 610   | 2.414   | 1.976   | 
| Subtotal | 4.948   | 8.031   | 8.345   | 10.807   | 7.893   | 
| Total | 10.161   | 14.037   | 18.080   | 23.504   | 14.233   | 
Fonte: IEA/CATI.
A agregação de valor aos produtos agropecuários via industrialização em bases artesanais nas UPAs pode-se constituir em promissora fonte de geração de renda e emprego para os produtores rurais e, também, de valorização do espaço rural. Em geral, os investimentos para constituir uma atividade de IR são relativamente baixos, e os insumos estão facilmente disponíveis na unidade produtiva. Por serem atividades artesanais, são intensivas em mão-de-obra e, portanto, potencialmente geradoras de novas ocupações no campo, especialmente de jovens, evitando, assim, o êxodo rural. Afora isso, contribuem para a circulação da renda e riqueza gerada em seus locais de origem, visto que, a comercialização dos produtos restringe-se, basicamente, aos mercados locais, o que ampliaria, em tese, a renda municipal.
            Os resultados permitem tecer recomendações de políticas de apoio a IR. Políticas públicas, vinculadas à melhoria dos padrões tecnológicos utilizados nesses empreendimentos, surgem como prioridades. Nesse sentido, a ação pública poderia intensificar os investimentos em pesquisa técnica e mercadológica conjugada com o aprimoramento do sistema de assistência técnica e de defesa fitossanitária. Também compete às estruturas públicas criar mecanismos de estímulo à estruturação de modalidades mais eficazes de comercialização tal como associações e cooperativas, pouco utilizadas pelas UPAs analisadas. 
___________________________________________________ 
¹A amostra probabilística é composta por 3.204 Unidades de Produção Agropecuária (UPAs), sorteada do cadastro obtido no Censo Agropecuário realizado pela SAA (Projeto LUPA). 
²As perguntas referem-se ao fechamento do ano anterior ao do levantamento, que não mais foi realizado a partir de 2006. 
Palavras-chave: indústria rural, emprego na indústria rural, valor da produção na indústria rural.
Data de Publicação: 11/07/2008
                Autor(es): 
                Marina Brasil Rocha (mabrasil@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Maria Carlota Meloni Vicente (carlota@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor              

                    
                        