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Programa Biodiesel: agora é para valer?
                                 A 
pergunta da hora é se esta nova onda do biodiesel vai de fato deslanchar. 
Aparentemente, desta vez deve se concretizar, embora na visão de especialistas 
do setor do jeito como foi concebido o Probiodiesel não possa ser considerado um 
programa energético, mas sim um programa social, opinião endossada pela 
professora Suzana K. Ribeiro, do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação 
e Pesquisa de Engenharia (COPPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro 
(UFRJ).  Retorno econômico 
             O que 
de fato vai determinar o uso das diversas opções de oleaginosas é o retorno 
econômico que pode ser avaliado pelo rendimento do óleo por hectare, do lado da 
produção da matéria-prima, e do poder calorífico no caso da utilização pelo 
usuário final. Isto ao lado do índice de cetano que, quanto maior for, 
possibilitará melhor funcionamento dos motores de 
compressão.5  _______________________ 

            A 
crítica ao Programa reside na preferência pelos produtos oriundos da agricultura 
familiar, em especial mamona e dendê, que são isentos de taxas tributárias, como 
Pis/Pasep e Cofins. Este é um fato que vai na contramão da inserção dos óleos 
vegetais na matriz energética brasileira, pois na Europa, onde o óleo diesel tem 
grande utilização, as grandes corporações têm sido importantes investidores em 
razão de programas públicos de biodiesel que incentivam grandes negócios e ainda 
concedem subsídios aos produtores de oleaginosas.1 
            E a 
concessão de financiamentos, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e 
Social (BNDES), também oferece incentivos a detentores ou adquirentes de 
produtos com o Selo Combustível Social. Além disso, há quem considere por 
critérios técnicos a mamona como excelente lubrificante, mas pouco indicada para 
biodiesel, em decorrência de sua viscosidade. O dendê por sua vez apresenta 
limitações por conta da produção concentrada no Norte do país, implicando em 
questões de logística para sua distribuição, além do elevado custo da 
atividade. 
            Nada 
contra, pois a geração de emprego e renda deve ser o objetivo de todos os 
governantes. Acontece que para atender as exigências do próprio governo federal, 
que determina adição de 2% de biomassa ao diesel, têm de ser obtidos grandes 
volumes de oleaginosas que viabilizem a instalação de um parque industrial 
condizente com as necessidades da demanda. 
            
Assim, são necessários certos ajustes para que o Programa Brasileiro de 
Biocombustíveis (Probiodiesel) proposto pelo Ministério da Ciência e Tecnologia 
em 2002 e regulamentado pela Lei 11.097 de 2005, cumpra seus 
propósitos. 
            A 
discussão atual é sobre qual a oleaginosa a ser industrializada, pois como se 
sabe existem múltiplas opções, com destaque para soja, algodão, palma (dendê), 
mamona, girassol, nabo forrageiro, canola e pinhão manso. Qualquer óleo 
vegetal/gordura animal pode ser utilizado desde que preparado de maneira 
adequada. Ocorre que nem todas têm disponível um "pacote tecnológico" que 
possibilite de pronto a sua exploração racional. Os órgãos de pesquisa devem ser 
acionados para que muitas das opções possam se tornar viáveis. 
            Em 
razão da instabilidade na oferta e das flutuações periódicas dos preços de 
petróleo, o mundo está buscando diversificar suas fontes energéticas, sobretudo 
a partir de biomassa que tem a vantagem de ser renovável e provocar menos 
poluição. Recentemente, em razão dos conflitos em zonas de extração do mineral e 
com o controle da oferta por parte do cartel da Organização dos Países 
Exportadores de Petróleo (OPEP), os preços internacionais do barril de petróleo 
chegaram a atingir em julho US$ 78,40 e ainda se mantém em patamares 
elevados.Hoje, estão ao redor de US$ 60, mas acaba de ser anunciado o corte de 
1,2 milhão de barris na produção diária de petróleo, visando manter os níveis de 
preço2. 
            
Embora o álcool (etanol/metanol) também possa fazer parte da mistura componente 
do biodiesel, aqui será dada ênfase ao uso de óleos vegetais na composição deste 
combustível para motor de explosão, ciclo diesel. 
            
Experiências e tentativas de uso de óleos vegetais como combustíveis vêm de 
longa data: em 1900, Rudolph Diesel utilizou na Alemanha o óleo de 
amendoim para demonstração do funcionamento do seu invento-motor de ignição por 
compressão. Por coincidência, este país é hoje o maior produtor de biodiesel 
utilizando a canola como matéria-prima. 
            Aqui 
no Brasil, desde a década de 20 do século XX, o Instituto Nacional de Tecnologia 
(INT) já pesquisava combustível alternativo e renovável. E no decorrer do tempo 
até o momento tem sido registradas várias tentativas e experiências de 
campo.3 
            Cabe 
lembrar que, ao final da década dos setenta, foi requerida a primeira patente 
mundial de biodiesel pelo professor Expedito Parente, da Universidade Federal do 
Ceará, que hoje se dedica a fabricação de equipamentos para obtenção de 
biodiesel. 
            Em 
1982, foi realizado o 1o Encontro sobre Óleos Vegetais Combustíveis 
na sede da fábrica de ônibus e caminhões da Scania-Vabis, em São Bernardo do 
Campo (SP). À época do evento, já se conhecia com relativa profundidade a 
tecnologia, como, por exemplo, a necessidade da transesterificação do óleo antes 
de sua adição ao diesel para evitar a formação de carbono na câmara de combustão 
e nos bicos injetores.4 
            Logo 
em seguida, foram testadas misturas diversas com a proposição do Programa 
Nacional de Energia de Óleos Vegetais (Projeto OVEG), do Ministério de 
Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), mas a relação desfavorável de 
preços não permitiu a produção do biodiesel em escala comercial. Assim o diesel 
mineral continuou a ser o preferido. 
            
Contudo, passado quase um quarto de século da implantação do Projeto OVEG, o 
assunto volta à baila. Neste ínterim, a utilização de óleos vegetais 
combustíveis foi acelerada em vários países, sobretudo da Europa, enquanto no 
Brasil o assunto foi quase esquecido, pois apenas algumas discretas ações 
tiveram continuidade. 
            Cabe 
lembrar que o PROALCOOL, cuja primeira fase ocorreu entre 1975 e 1990, também 
passou por uma período de descrédito com as vendas quase nulas de carros movidos 
a álcool, mas por conta da elevação dos preços dos combustíveis fósseis houve 
uma retomada em ritmo intenso de sua produção. A exigência da adição do álcool à 
gasolina, na proporção de até 25% com vistas a diminuir a poluição ambiental, e 
a possibilidade de uso de mais de um tipo de combustível no mesmo motor – 
tecnologia flex fuel, foram os fatores que colocaram o Brasil na berlinda 
quanto ao uso de energia alternativa. 
            A 
planta que oferece as melhores condições é o dendê, pois chega a render cinco 
mil litros de óleo por hectare, ou seja, quase dez vezes mais que a soja. Também 
tem o mais elevado poder calorífico dentre um grupo selecionado de oleaginosas, 
além de elevado índice de cetano, o que propicia uma mistura que mais se 
aproxima do diesel. 
            
Acontece que a exploração do dendê é regional e tem a sua expansão limitada por 
questões ecológicas, além de exigir elevados investimentos para a instalação e 
condução da lavoura. A exploração no cerrado está em fase de estudos e pode ser 
interessante. 
            A 
soja - principal lavoura anual do Brasil e dona de grande fatia do comércio 
internacional graças a sua competitividade - é a que tem a possibilidade de ser 
prontamente usada. Esta oleaginosa tem oferta garantida e, por ser uma lavoura 
anual, pode aumentar a colheita rapidamente caso os preços sejam favoráveis aos 
produtores. Situação que não pode ser agilizada para outros óleos oriundos de 
culturas permanentes, caso do dendê (palma), da macaúba e do pinhão manso, por 
exemplo, com ciclos produtivos mais longos, mas que uma vez instalados podem 
oferecer vantagens temporais. 
            O 
grão de soja no momento é o principal produto de exportação, por força da Lei 
Kandir que isenta do ICMS o produto in natura destinado à exportação. 
Ainda por conta do câmbio e da logística desfavoráveis no Brasil, bem como da 
existência de plantas industriais mais modernas na Argentina, o país vizinho tem 
sido preferido pelas empresas multinacionais para a moagem da oleaginosa e 
exportação de co-produtos. Assim, o aumento da sua destinação para fins 
energéticos seria um incentivo à industrialização e à redução da capacidade 
ociosa das esmagadoras, que, além de gerar emprego e renda, redundariam em maior 
oferta de farelo com benefícios para a produção de carnes, dada a sua 
importância na composição de rações. 
            A 
canola, usada comercialmente como opção de inverno no Sul-Sudeste, já está sendo 
testada quanto a sua viabilidade no Centro-Oeste, mais especificamente em Goiás. 
E poderá futuramente ser uma importante fonte de combustível, a exemplo do que 
ocorre na Alemanha, o grande produtor de biodiesel no Mundo, que produziu em 
2005 cerca de 2,0 bilhões de litros e tem crescido 20% ao 
ano.6 
            O 
processo usual para a obtenção de biocombustível é a transesterificação, feita 
num reator com o uso de álcool na presença de um catalisador, onde são reduzidas 
as propriedades indesejáveis do óleo vegetal/gordura com a retirada da 
glicerina, composto que acarreta prejuízos aos motores, mas que é usado como 
insumo numa série de produtos. 
            Um 
fato positivo recém-anunciado, que pode alavancar o uso de oleaginosas em 
misturas carburantes, é a tecnologia H-Diesel ou Diesel Verde desenvolvida pela 
Petrobrás que permite adicionar o bioóleo na proporção de até 10% (B-10) ao 
diesel antes do processo de refino. Este processo é 
feito nas refinarias de petróleo e, embora dispense o uso de álcool e 
catalisador exige economia de escala para sua 
viabilidade7. 
            A 
soja foi a oleaginosa eleita para dar início à fase produtiva do H-Diesel devido 
à grande disponibilidade de oferta no Brasil. Os primeiros resultados deverão 
ocorrer de forma efetiva a partir de 2007. Espera-se que haja uma economia 
substancial de divisas com a redução da importação de óleo 
mineral. 
            No 
momento, os postos da Petrobrás e alguns de bandeira privada já comercializam o 
biodiesel, obtido via transesterificação em um número significativo de fábricas 
já instaladas no país e adquirido em leilões. 
            O 
mercado apresenta-se favorável e espera-se que desta vez o programa tenha êxito, 
pois já está bem mais avançado que os anteriores e poderá repetir o sucesso do 
etanol da cana. Fato, aliás que tem sido alvo de preocupação por parte dos 
países desenvolvidos, sobretudo Estados Unidos e União Européia, por conta da 
competitividade agrícola brasileira.8 
            
Contudo, para a plena consolidação do Programa, o "Biodiesel" deve firmar-se 
como um produto criando seu próprio espaço, e não continuar na categoria de um 
bem alternativo ou substituto. Para tanto, são necessários esforços e disposição 
dos órgãos oficiais e da iniciativa privada a fim de resolver questões ainda 
pendentes - investimentos, tributação, pesquisa e logística - de modo a 
fortalecer ainda mais a inserção do país no cenário mundial de 
agroenergia.9 
1 SALOMÃO, A. A fazenda virou usina. Anuário Exame 
-Agronegócio 2006/2007, p.48-50, 2006 
2 Folha de S. Paulo. Combustíveis: Opep cortará 1,2 milhão de 
barris da produção de óleo. 20/10/2006. B-4 
3 PROBIODIESEl. Disponível em www.dabdoub-labs.com.br/pdf/probiodiesel.pdf. 
Acesso em 29 maio 2006 
4 Combustíveis alternativos para motores diesel.Culturas 
energéticas. v.1, n.2, p. 4, 1982 
5 MELO, Fernando H. Proálcool, energia 
e transportes. São Paulo: Pioneira: FIPE, 1981, 163 p 
6 GAZZONI, Décio. O Brasil 
começa a plantar energia. A Granja. v. 62, p.4-7. fev. 2006 
7 Stavisk, Norberto. H-Bio 
reduzirá a importação de diesel em 25% até 2008. Gazeta Mercantil. 
21/06/2006.C-2 
8 
IBIAPABBA NETO. Protecionismo: o gigante assusta o mundo.Panorama Rural. 
v.8, n.88,p. 34-39, 2006 
9 Artigo registrado no CCTC-IEA sob número 
HP-056/2006.
Data de Publicação: 27/10/2006
Autor(es): Sebastião Nogueira Junior (senior@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor

                    
                        