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A Ciranda das Agrocommodities e o Abastecimento Global
                                 
É muito difícil fazer previsões a respeito dos preços de commodities, 
principalmente para as de origem agrícola e, sobretudo, detectar com precisão 
suas tendências, embora existam esforços, de várias entidades em todo o mundo, 
para diminuir riscos e aumentar a credibilidade dos resultados 
apresentados.              
Mesmo com os recursos de requintados métodos econométricos e análises gráficas 
de longo prazo, nem sempre é possível captar as interferências exógenas, pois os 
modelos formulados nem sempre comportam a inclusão de variáveis de caráter 
incontrolável, tais como fatores climáticos, rebeliões, cataclismos, quebras 
financeiras, redução de ofertas de bens imprescindíveis (petróleo, por exemplo) 
e mesmo boatos nem sempre muito bem fundamentados, que acarretam severos efeitos 
sobre os mercados globais.              
Como se sabe, em termos simplistas, os modelos de previsão possuem dois 
componentes básicos – determinístico e estocástico. O primeiro refere-se a uma 
função matemática, perfeitamente determinada com base em série histórica de 
dados, enquanto o segundo envolve componentes aleatórios ou estocásticos de 
difícil previsibilidade.              
A BM&FBOVESPA, única bolsa de valores, mercadorias e futuros em operação no 
Brasil e que negocia cinco commodities de origem agrícola (milho, soja, 
boi, café e etanol), realizou há pouco tempo um evento para familiarizar 
estudiosos e investidores com o tema e incentivar o desenvolvimento de estudos 
nesta área.1 O objetivo da 1ª Conferência em Gestão de Risco e 
Comercialização de Commodities, que ocorreu em novembro de 2011, foi o de 
promover o debate entre a comunidade acadêmica e agentes de mercado sobre: 
previsão, transmissão e volatilidade de preços, derivativos de 
commodities, mercado de seguro, estrutura de mercado, oferta, demanda e 
comportamento de preços e instrumentos de crédito e financiamento. 
             
Os agentes do agronegócio podem se proteger dos riscos decorrentes das grandes 
oscilações de preços utilizando o hedge, prática de grande aceitação nos 
países de base agrícola, mas ainda pouco expressiva no Brasil. A BM&F tem 
feito exaustivos esforços para sua consolidação, mas o desconhecimento deste 
instrumento ainda é muito grande, segundo sondagens realizadas no meio 
rural.              
Os gráficos de evolução diária de preços das agrocommodities muito se 
assemelham aos dos eletrocardiogramas que registram sistemáticas variações, de 
alta e de baixa (sístole e diástole). Para efeito de ilustração, um gráfico do 
índice diário de preços do Conselho Internacional de Grãos (IGC) que engloba 
sete produtos (milho, trigo, sorgo, arroz, cevada, soja e canola) é apresentado 
na figura 1.2 
               
A relativamente recente elevação dos preços de ativos agrícolas e a baixa nas 
taxas de juros induziram a entrada de fundos de pensão internacionais neste 
mercado, sobretudo estadunidenses que sempre estão sempreà procura de maiores 
oportunidades de lucros, mesmo sem quaisquer vínculos com o bem negociado, 
aumentando sobremaneira a volatilidade dos preços. Isto ocorre por que, ao menor 
sinal de perda de rentabilidade ou de notícias de arrefecimento das cotações, 
somas astronômicas são retiradas e o mercado entra em convulsão – declínio 
acentuado.              
Por outro lado, oscilações nos preços de petróleo (também uma importante 
commodity) têm um efeito nefasto na economia em razão da forte 
dependência do mundo em relação a este bem. Fontes energéticas alternativas 
ainda não são capazes de conter as altas de preços decorrentes da redução da 
oferta dessa fonte carburante, comandada pelo cartel da OPEP.              
Os esforços são incessantes na busca de novas opções - algumas até esdrúxulas - 
mas a biomassa, as energias eólica e solar, entre outras ainda têm pouca 
representatividade no contexto global. A evolução é gradativa e morosa e só a 
longo prazo poderão ser obtidos resultados satisfatórios.              
Atualmente tem-se afirmado que a elevação dos preços dos alimentos ocorre em 
parte pela destinação da biomassa – milho em especial – para a fabricação de 
etanol nos Estados Unidos, a ser usado como carburante, provocando um efeito em 
cadeia nos preços dos grãos em geral. E, no caso da soja, sua utilização como 
biodiesel também é contestada.              
Quanto à produção do etanol brasileiro, a partir da cana-de-açúcar, as críticas 
se referem à suposta ocupação de áreas destinadas à obtenção de alimentos e pelo 
desmatamento da Amazônia, desfigurando a imagem do país como potência agrícola 
frente ao cenário internacional.              
Enquanto permanece o impasse, os países do (hemisfério) norte criticam o etanol 
de cana-de-açúcar e os do sul culpam o milho pela crise e elevação dos preços de 
grãos com efeitos mais graves sobre as nações da África, da Ásia e da América 
Latina.              
A propósito, o discurso corrente é que os povos pobres estão sendo prejudicados 
pela utilização de grãos como combustíveis. Na realidade, em parte isto pode ser 
contestado, pelo menos no momento, já que os dados da FAO registram para 2011 
uma produção recorde de 2,3 bilhões de toneladas de grãos que foi 3,5% superior 
a do ano precedente. Os estoques finais atingiram 511,3 milhões de toneladas 
contra 501,3 milhões de toneladas em 2010. A relação estoque/consumo foi mantida 
em 21,8%.3              
A África tem sido assolada há muito tempo pela fome em decorrência da escassez 
que lá impera quanto à produção de alimentos essenciais. A questão passa pela 
falta de poder aquisitivo da população e mesmo por dificuldades (logísticas) de 
acesso, agravadas pelos conflitos raciais e pela ineficiente oferta de 
alimentos.              
Como é sabido, os países ricos foram paulatinamente abandonando suas 
ex--colônias e a ajuda humanitária foi se esvaindo com o passar do tempo. Lógico 
que só a ajuda não resolve os sérios problemas estruturais, pois é preciso criar 
condições para alavancar a produção local, respeitando as vantagens comparativas 
de cada país para diminuir sua dependência externa e promover seu 
desenvolvimento. O uso da tecnologia disponível é fundamental.              
As próprias multinacionais da área de insumos – sementes em especial –, agora 
diante da crise que se apresenta, estão prometendo conceder apoio às zonas 
pobres que haviam sido abandonadas de vez por não terem rentabilidade adequada. 
Já cogitam em aplicar parte dos lucros obtidos nas commodities principais 
- milho e soja em especial – e em pesquisa com arroz e trigo para favorecer 
essas nações.              
Na realidade o potencial da África, por exemplo, já foi vislumbrado pela China, 
que vem investindo pesadamente nos países daquele continente. Também, nações 
mais pobres da própria Ásia e América Latina têm sido vistas com maior atenção 
em relação a investimentos futuros por parte de investidores do hemisfério 
norte, além da China.              
Para que se busque o equilíbrio global de abastecimento tornam-se necessários 
aumentos progressivos de produtividade agrícola, pois são poucos os países com 
áreas ainda passíveis de serem ocupadas, caso do Brasil em especial. Cabe 
lembrar que, nos últimos anos, a produtividade agrícola brasileira tem sido mais 
elevada que a média mundial.              
O ritmo da evolução do consumo em países emergentes tem crescido mais do que a 
oferta. E, também, a demanda nos industrializados vem sendo suprida pela oferta 
dos países em desenvolvimento, já que aqueles estão estacionários em termos de 
produção, tanto pelo pouco entusiasmo de seus agricultores como pela grande 
preocupação com a preservação ambiental.              
Portanto, só com muito esforço e incentivos poder-se-á alcançar o tão sonhado 
ponto de equilíbrio entre essas duas forças de mercado no âmbito global. Nesse 
sentido, os líderes do G20, em sua reunião de cúpula realizada em novembro de 
2010, solicitaram a várias entidades internacionais (FAO, FMI, UNCTAD, Banco 
Mundial e OMC, entre outras) ações que possam mitigar e gerir os riscos 
associados à volatilidade dos preços de commodities agrícolas, de modo a 
proteger os mais vulneráveis sem distorcer o comportamento do mercado. As 
propostas constam do documento publicado pela OCDE.4              
Com a recente crise econômica que se estabeleceu nos Estados Unidos, na Europa e 
no Japão, a necessidade de reformas estruturais profundas provocou efeitos 
drásticos em todo o mundo. Como não poderia deixar de acontecer, o mercado, de 
commodities em geral sofreu os efeitos recessivos e já vem registrando 
quedas sucessivas após um período de substanciais elevações nas cotações 
internacionais – os elevados níveis atingidos foram recordes e se tornaram 
insustentáveis diante do crítico cenário econômico vigente.              
Diante desses avanços previstos, poderá até haver um equilíbrio futuro no 
mercado das agrocommodities, mas no curto prazo não se espera redução na 
volatilidade dos preços, que deverão permanecer em patamares elevados mesmo com 
a crise econômica.              
A desaceleração da economia mundial ao final do ano passado amenizou, em parte, 
a disparada dos preços dos alimentos em 2011. O índice de alimentos da FAO, que 
engloba cinco grupos de commodities – cereais, óleos, carnes, laticínios 
e açúcar –, foi de 228 pontos comparada ao ano-base (1990), quando começou a 
medição.              
Pontualmente, o efeito La Niña (estiagem) na parte meridional do planeta, 
atingindo o Sul do Brasil, a Argentina e o Paraguai – importantes produtores de 
grãos – pode novamente reverter a situação do mercado. Um exemplo dos efeitos da 
seca no Brasil foi o aumento recente dos preços de grãos (milho, soja e 
feijão).              
E, assim, a volatilidade dos preços permanece e o agronegócio continua assumindo 
os riscos. A proteção à produção e à comercialização via seguro e prática do 
hedge, aliada à infraestrutura adequada e a eficientes canais de 
distribuição constituem ações essenciais para a regularização dos mercados 
agrícolas e a garantia de segurança alimentar no mundo. Além, é claro, da 
inclusão social de um elevado contingente de pessoas.  ____________________  2FOOD AND AGRICULTURE 
ORGANIZATION OF DE UNITED NATIONS – FAO. The FAO food price ended the year 
with sharp decline. Rome: FAO, 2012. Disponível em: 
<http://www.fao.org/worldfoodsituation/wfs-home/foodpricesindex/en/> 
Acesso em: 20 jan. 2012. 
 3INTERNATIONAL GRAINS 
COUNCIL – IGC. IGC launches new daily grains and oilseeds index (GOI). 
London: IGC, 2012. Disponível em: 
<http://www.igc.int/downloads/pr/pr_GOI.pdf>. Acesso em: 12 jan. 
2012. 
 4ORGANISATION FOR ECONOMIC 
CO-OPERATION AND DEVELOPMENT - OCDE. Price volatility in food and 
agricultural markets: policy responses. Paris: OCDE, 2012. Disponível em: 
<http://www.oecd.org/document/20/0,3746,en_2649_37401_48152724_1_1_1_37401,00.html>. 
Acesso em: 12 jan. 2012.  Palavras-chave: commodities, 
preços, abastecimento. 
  
  
  
  
  

Figura 1 - Índice Diário de Cereais e 
Oleaginosas (GOI) do Conselho Internacional de Grãos (IGC), Janeiro de 2000 a 
Janeiro de 2012. 
Fonte: INTERNATIONAL 
GRAINS COUNCIL – IGC. IGC launches new daily grains and oilseeds index 
(GOI). London: IGC, 2012. Disponível em: 
<http://www.igc.int/downloads/pr/pr_GOI.pdf>. Acesso em: 12 jan. 
2012. 
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
1BOLSA DE VALORES, MERCADORIAS E FUTUROS - 
BM&FBOVESPA. Sobre a bolsa. São Paulo: BMF&Bovespa, 2012. 
Disponível em: <http://www.bmfbovespa.com.br>. Acesso em: 13 jan. 
2012. 
  
Data de Publicação: 16/02/2012
                Autor(es): 
                Sebastião Nogueira Junior (senior@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Elizabeth Alves e Nogueira (enogueira@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor              

                    
                        