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Óleos Vegetais para Alimentos ou para Biodiesel?
                                   
No transcorrer da década de 2000, os biocombustíveis ganham maior importância a 
partir do comprometimento para a redução de gases efeito estufa e da alta nas 
cotações do petróleo1. A produção mundial, incluindo etanol e 
biodiesel, salta de 661,5 mil barris por dia em 2005 para 1,6 milhão de barris 
por dia em 2009, dos quais 81% correspondem a etanol2. O biodiesel, 
ainda que em quantidade menor, foi o que mais cresceu, de 77,2 mil barris por 
dia para 308,2 mil de barris por dia (Tabela 1), de forma a ampliar sua 
participação relativa de 12% para 19% da produção total de 
biocombustíveis. 
 
  
  
Tabela 1 - Evolução da Produção Mundial de 
Biodiesel, Principais Países, de 2005 a 2009 
(em 1.000 barris/dia)
| 
       País  | 
    
       2005  | 
    
       2006  | 
    
       2007  | 
    
       2008  | 
    
       2009  | 
| 
       Alemanha  | 
    
       39,0  | 
    
       70,4  | 
    
       78,3  | 
    
       61,7  | 
    
       51,2  | 
| 
       França  | 
    
       8,4  | 
    
       11,6  | 
    
       18,7  | 
    
       34,4  | 
    
       41,1  | 
| 
       Estados Unidos  | 
    
       5,9  | 
    
       16,3  | 
    
       32,0  | 
    
       44,1  | 
    
       32,9  | 
| 
       Brasil  | 
    
       0,0  | 
    
       1,2  | 
    
       7,0  | 
    
       20,1  | 
    
       27,7  | 
| 
       Argentina  | 
    
       0,2  | 
    
       0,6  | 
    
       7,5  | 
    
       15,3  | 
    
       23,1  | 
| 
       Itália  | 
    
       7,7  | 
    
       11,6  | 
    
       9,2  | 
    
       13,1  | 
    
       13,1  | 
| 
       Espanha  | 
    
       3,2  | 
    
       1,2  | 
    
       3,3  | 
    
       4,3  | 
    
       11,0  | 
| 
       Tailândia  | 
    
       0,4  | 
    
       0,4  | 
    
       1,2  | 
    
       7,7  | 
    
       10,5  | 
| 
       Bélgica  | 
    
       0,0  | 
    
       0,5  | 
    
       3,2  | 
    
       5,4  | 
    
       8,1  | 
| 
       China  | 
    
       0,8  | 
    
       4  | 
    
       6  | 
    
       8  | 
    
       8  | 
| 
       Outros  | 
    
       11,571  | 
    
       24,2103  | 
    
       36,60031  | 
    
       56,876  | 
    
       81,4441  | 
| 
       Mundo  | 
    
       77,2  | 
    
       142,0  | 
    
       202,9  | 
    
       270,9  | 
    
       308,2  | 
            
A União Europeia é a maior produtora mundial de biodiesel, com o equivalente a 
60% e onde o interesse pelo biocombustível data do primeiro choque do petróleo, 
no início dos anos 1970. Na década de 1990, entrou em operação a primeira 
indústria em escala comercial na França que, hoje juntamente com a Alemanha, 
responde pela maior parcela da produção3. Com o Protocolo de Kyoto, a 
importância do biodiesel é consolidada na matriz de combustíveis renováveis 
naquele bloco econômico4. A meta para 2020 é a adição de 10% de 
biodiesel ao óleo diesel5. 
  
            
A crescente produção de biodiesel remete à discussão sobre a disponibilidade de 
óleos vegetais para essa finalidade, que traz modificações no mercado 
internacional de oleaginosas, ao incorporar o segmento energético além do 
tradicional setor de alimentos6. A intenção deste artigo consiste em 
abordar o comportamento do consumo de óleos vegetais a partir do aumento do 
interesse mundial na produção de biodiesel. 
  
            
Segundo estudo realizado por FAO7, a emergência dos 
biocombustíveis se torna fator importante para os mercados agrícolas em função 
do aumento na demanda por matérias-primas, especialmente grãos e oleaginosas. A 
interferência da produção de biocombustíveis cria um link entre os preços 
agrícolas e o do petróleo, como visto na mais recente fase de alta do trigo, 
milho e oleaginosas. Isso porque, além dos reflexos sobre os preços dos insumos, 
os preços do petróleo tendem a influenciar cada vez mais a demanda das 
matérias-primas agrícolas utilizadas na produção de biocombustíveis. 
  
            
Quando as cotações dos derivados fósseis alcançam ou superam os custos de 
produção dos biocombustíveis, o mercado energético cria demanda por produtos 
agrícolas. Dessa forma, elevações nas cotações do petróleo tendem a ampliar o 
uso e os preços das matérias-primas agrícolas, estabelecendo um vínculo do lado 
da demanda, além da relação entre os preços dos insumos usados na produção 
agrícola8. Como exemplo, pode ser mencionada a alta nos preços da 
soja e do óleo com reflexo sobre os demais óleos vegetais ocorrida em 2007/08, 
quando a produção de soja é reduzida nos Estados Unidos em favor do milho para 
etanol. 
  
            
Diversas são as oleaginosas para o atendimento da demanda de óleos vegetais, mas 
apenas três delas respondem pelo equivalente a 77% do consumo. O óleo de palma, 
ou óleo de dendê, é o mais consumido com a representação de 32%. A produção é 
concentrada na Malásia e na Indonésia, os quais respondem por 87% da oferta 
mundial. O óleo de soja é o segundo mais importante ao representar 29%, com os 
Estados Unidos na liderança da produção do grão, seguidos pelo Brasil e pela 
Argentina. O uso de óleo de canola responde por 16% do total mundial e a União 
Europeia é a principal ofertante, seguida pela China e Canadá (Figura 1). 
  
            
A produção de óleos vegetais na União Europeia é estimada em 28,9 milhões de 
toneladas em 2010/11 (outubro-setembro), dos quais 72% correspondem ao de 
canola. O consumo desse óleo para produção de biodiesel alcançou 6,9 milhões de 
toneladas contra apenas 2,7 milhões de toneladas para uso 
alimentar9. 
  
  

Figura 1 – Consumo Mundial de 
Óleos Vegetais1, 2010/11. 
1Os outros óleos vegetais 
compreendem os de oliva, palmiste e de coco. 
Fonte: Elaborada pela autora com base 
em: UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE. The Oilseeds Group. World 
markets and trade 2001-2011. Washington: USDA, 2011. Disponível em: 
<http://www.fas.usda.gov/oilseeds/circular/2011/May/oilseeds.pdf>. Acesso 
em: maio 2011.
            
Os Estados Unidos ocupam a terceira colocação na produção de biodiesel e a soja 
é principal matéria-prima. O país praticamente não participa do mercado 
exportador de óleos, em virtude da produção ser consumida predominantemente no 
mercado doméstico, mesmo antes da presença do biodiesel em sua matriz de 
energética. Conforme o 
Economic Research 
Servioce (ERS)10, o biodiesel representa 13% do consumo de óleo de 
soja no país. 
  
            
No caso do óleo de palma, seu consumo voltado à produção de biodiesel também é 
crescente e alcança cerca de 30% no sudeste asiático11. Fica 
configurada assim a importância que a disponibilidade de óleos vegetais assume 
para a produção de biodiesel. 
  
            
No âmbito mundial, a quantidade de óleo vegetal destinada ao biodiesel passou de 
10,6 milhões de toneladas em 2001/02 para 34 milhões de toneladas na temporada 
2010/11. Em termos relativos, a representação mais que dobra, de 11,7% para 
23,4%, opostamente ao declínio de 88,3% para 76,6% da parcela para alimentos 
(Tabela 2). 
  
            
A perspectiva para 2011/12 é de que a produção mundial de óleos vegetais alcance 
151,5 milhões de toneladas, com aumento de 4% em relação a da temporada atual. O 
consumo, por sua vez, deve crescer 3,6% e atingir 150,3 milhões de toneladas. 
Mudança mais expressiva é prevista para o estoque, que deve manter a tendência 
decrescente, já registrada nas últimas temporadas, e ser reduzido em 8,6%. Dessa 
forma, a quantidade de óleos vegetais disponível ao final da temporada deve ser 
de apenas 10,1 milhões de toneladas, a menor dos últimos cinco 
anos12. 
  
  
Tabela 2 - Evolução do Consumo Mundial de 
Óleos Vegetais1 para Alimentos e Biodiesel, 2001/02 a 2010/11 
(em milhões de t e porcentagem)
| 
       Ano  | 
    
       Total 
    (a)  | 
    
       Alimentos 
      (b)  | 
    
       Industrial 
      (c)  | 
    
       (b/a)  | 
    
       (c/a)  | 
| 
       2001/02  | 
    
       91,06  | 
    
       80,42  | 
    
       10,6  | 
    
       88,3  | 
    
       11,7  | 
| 
       2002/03  | 
    
       95,36  | 
    
       83,27  | 
    
       12,1  | 
    
       87,3  | 
    
       12,7  | 
| 
       2003/04  | 
    
       100,5  | 
    
       86,9  | 
    
       13,7  | 
    
       86,4  | 
    
       13,6  | 
| 
       2004/05  | 
    
       108,1  | 
    
       91,4  | 
    
       16,6  | 
    
       84,6  | 
    
       15,4  | 
| 
       2005/06  | 
    
       114,8  | 
    
       94,4  | 
    
       20,5  | 
    
       82,2  | 
    
       17,8  | 
| 
       2006/07  | 
    
       119,9  | 
    
       96,2  | 
    
       23,8  | 
    
       80,2  | 
    
       19,8  | 
| 
       2007/08  | 
    
       125,8  | 
    
       99,7  | 
    
       26,1  | 
    
       79,2  | 
    
       20,8  | 
| 
       2008/09  | 
    
       129,8  | 
    
       101,4  | 
    
       28,4  | 
    
       78,1  | 
    
       21,9  | 
| 
       2009/10  | 
    
       137,8  | 
    
       106,4  | 
    
       31,4  | 
    
       77,2  | 
    
       22,8  | 
| 
       2010/11  | 
    
       145,1  | 
    
       111,1  | 
    
       34,0  | 
    
       76,6  | 
    
       23,4  | 
Fonte: Elaborada pela autora com base em: UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE. The Oilseeds Group. World markets and trade 2001-2011. Washington: USDA, 2011. Disponível em: <http://www.fas.usda.gov/oilseeds/circular/2011/May/oilseeds.pdf>. Acesso em: maio 2011.
            
É possível observar os movimentos simultâneos dos preços, justificados pela 
substituibilidade entre os óleos e principalmente a alta durante a presente 
temporada. Comparativamente a anterior, as cotações do óleo de palma passam de 
US$793/tonelada para US$1.172/t; o de soja, de US$924/t para US$1.298/t e o de 
canola, de US$927/t para US$1.359/t(Figura 2). 
  
  

Figura 2 – Evolução dos 
Preços dos Óleos de Palma, Soja e Canola Praticados no Mercado Internacional, 
2001/02 a 2010/111. 
1Preliminar. 
Fonte: Elaborada pela autora 
com base em: UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE. The Oilseeds Group. 
World markets and trade 2001-2011. Washington: USDA, 2011. Disponível em: 
<http://www.fas.usda.gov/oilseeds/circular/2011/May/oilseeds.pdf>. Acesso 
em: maio 2011.
            
Da perspectiva dos efeitos do aumento do interesse na produção de biodiesel, é 
possível verificar que o consumo de óleos vegetais exerce concorrência sobre a 
finalidade alimentícia. No mercado internacional, os preços se tornam ainda mais 
voláteis com o crescente segmento energético. 
  
            
Acrescenta-se, ainda, que é questionável a afirmação de que a produção de óleo 
de soja para o biodiesel contribui para a contenção nos preços dos alimentos por 
proporcionar uma maior quantidade de farelo para a produção de carnes, posto que 
os comportamentos dos preços do grão e do farelo são similares ao do óleo 
(Figura 3). 
  
  
 

1Preliminar.
Fonte: Elaborada pela autora com base em: UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE. The Oilseeds Group. World markets and trade 2001-2011. Washington: USDA, 2011. Disponível em: <http://www.fas.usda.gov/oilseeds/circular/2011/May/oilseeds.pdf>. Acesso em: maio 2011.
            
O panorama que se apresenta no mercado internacional de óleos vegetais pode ser 
sintetizado pela ideia Gurkan13, que considera como "bênção ou 
maldição" os efeitos causados pelo aumento na produção de biocombustíveis. 
Além da concorrência por recursos produtivos, podem ocasionar um desvio de 
matérias-primas agrícolas e alta nos preços, o que deverá exigir atenção maior 
em relação à segurança alimentar em países importadores de alimentos, em 
especial os mais pobres. Por outro lado, representam oportunidades comerciais às 
nações que contam com excedentes desses produtos. O Brasil, os Estados Unidos e 
a União Europeia deverão ratificar suas posições no grupo dos maiores 
consumidores e produtores de biocombustíveis. 
  
_________________________ 
1O 
preço médio do petróleo tipo brent no mercado spot saltou de 
US$28,39/barril em 2000 para US$54,42/barril em 2005, até alcançar 
US$99,04/barril durante 2008, conforme: BRASIL. Agência Nacional do Petróleo Gás 
Natural e Biocombustíveis - ANP. Petróleo: preço médio no mercado spot, 
2000-2009. Brasília: ANP, 2010. Disponível em: <http://www.anp.gov.br>. 
Acesso em: out. 2010. 
2ENERGY INFORMATION ADMNISTRATION - EIA. International energy statistics. Washington: EIA, 2010 Disponível em: <http://tonto.eia.gov/cfapps/ipdbproject/IEDIndex3.cfm?tid=79&pid=79&aid=1>. Acesso em: novembro, 2010.
3ORGANIZATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT – OECD. Economic assessment of biofuel support policies.Paris: OECD, 2008. Disponível em: <http://www.oecd.org/document/30/0,3343,en_2649_33785_41211998_1_1_1_1,00.html>. Acesso em: nov. 2008.
4FRIEDRICH, S. A Word wide review of the commercial production of biodiesel: a technological, economic and ecological investigacion based on case studies. Wien: Wirtschafts Universitat, 2004. 154 p.
5FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS - FAO. El estado mundial de la agricultura y la alimentación: biocombustibles: perspectivas, riesgos y oportunidades. Rome: FAO, 2008, 162 p.
6BARBOSA, M. Z.; NOGUEIRA-JUNIOR, S. ; FREITAS, S. M. Agricultura de alimentos x de energia: impactos nas cotações internacionais. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 3, n. 1, jan. 2008.
7FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS - FAO. The market and food security implications of the development of biofuel production. Rome: FAO, 2009. Disponível em: <ftp://ftp.fao.og/docrep/fao/meeting/016/k4477e.pdf>. Acesso em: mar., 2011.
8Op. cit. nota 5.
9UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE. The Oilseeds Group. World markets and trade 2001-2011. Washington: USDA, 2011. Disponível em: <http://www.fas.usda.gov/oilseeds/circular/2011/May/oilseeds.pdf>. Acesso em: maio 2011.
10ECONOMIC RESEARCH SERVICE – ERS (2010). Soybean and oil crops: market outlook soybean, USDA baseline, 2010-19. Washington: USDA, 2010. Disponível em: <http://www.ers.usda.gov/Briefing/SoybeansOilcrops/2010_19baseline.htm>. Acesso em: nov. 2010.
11Op. cit. nota 9.
12Op. cit. nota 9.
13GURKAN, A. A. (2007). Rising 
biofuels prices: blessing or curse for food security? In: US GLOBAL CONFERENCE 
ON AGRICULTURAL BIOFUELS: Research and Economics. 2007. Mineapolis. 
Meetings... Washington: USDA, 2007. Disponível em: 
<http://www.ars.usda.gov/meetings/Biofuel2007/presentations/Econ%20Outlook/ 
Gurkan.pdf.> Acesso em: jul. 
2010. 
  
  
Palavras-chave: biodiesel, óleos vegetais, mercado internacional.
Data de Publicação: 15/06/2011
Autor(es): Marisa Zeferino (marisa.zeferino@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor

                    
                        