Algodão do Brasil no Contexto Internacional, 2015/16 a 2023/24


 

Recentemente o Brasil reforça sua presença como agroexportador ao assumir a primeira colocação nas exportações globais de algodão, ainda que ocupe o terceiro lugar no ranking da produção, depois da China e Índia. As transformações ocorridas nos sistemas produtivos com ênfase na adoção tecnológica na cotonicultura, bem como os esforços no sentido do aprimoramento da qualidade da fibra, constituem os alicerces para a conquista da liderança brasileira no mercado mundial1.

O artigo tem por objetivo a análise da evolução da produção, da produtividade, do consumo interno e das exportações de algodão em pluma no Brasil no período compreendido entre 2015/16 e 2023/242, seguida pela abordagem do panorama vigente no mercado internacional na atualidade da temporada 2024/25. As séries de dados referentes aos suprimentos de algodão em pluma no Brasil e no mundo têm como fonte o International Cotton Advisory Committee (ICAC)3.

 A produção de algodão no Brasil mais que dobrou no último decênio em face do aumento de 104,7% no período, ao saltar de 1.563,0 mil toneladas em 2015/16 para o nível recorde de 3.200,0 mil toneladas em 2023/24 (Figura 1). Para tanto contribuiu, principalmente, o crescimento em produtividade dos algodoais brasileiros, cuja média trienal passou de 1.499 kg/ha para 1.839kg/ha de algodão em pluma entre os subperíodos compreendidos pelas safras 2014/15 a 2016/17 e 2021/22 a 2023/24, de acordo com o ICAC4.

 

 

Por sua vez, as vendas de algodão para o mercado internacional realizadas pelo Brasil passaram de 939,0 mil toneladas para 2.700,0 mil toneladas entre 2015/16 e 2023/24, evolução que representou crescimento da ordem de 187,5% entre os extremos do período (Figura 1). O principal destino das exportações foi a China, para onde seguiu o equivalente a 49,1% da quantidade total exportada durante o ano comercial 2023/24. Por sua vez, Vietnam, Bangladesh, Turquia, Paquistão e Indonésia também constituíram o grupo de países principais importadores da fibra brasileira, conforme ICAC5.           

Quanto ao consumo doméstico de algodão no Brasil, a figura 1 demonstra a estabilidade desse item da demanda no transcorrer de todo período analisado. Esse comportamento é justificado pela existência de fatores que tendem a inibir o crescimento do emprego da fibra natural de algodão na fabricação de têxteis e de confecções no país, como é o caso da utilização das fibras sintéticas em função de seu menor preço em relação ao de algodão6

Além disso contribui para tal cenário o crescimento das importações de manufaturados têxteis, bem como de confecções, o que resulta em forte presença e, portanto, maior concorrência por parte desses produtos no mercado nacional. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e Confecção (ABIT)7 o saldo da balança comercial (sem fibra de algodão) da cadeia têxtil e de confecção foi deficitário em US$5,6 bilhões em 2023, patamar que se seguiu ao déficit de US$4,8 bilhões em 2022.

No que se refere ao panorama reinante no mercado global da fibra de algodão em 2024/25, a oferta (estoque inicial acrescido da produção) deve ser de 44.300,6 mil de toneladas, com modesta variação de 1,6% comparativamente à verificada na safra anterior. Esse comportamento se deve, principalmente, ao estoque inicial em nível inferior em relação aos das últimas temporadas. A produção, por sua vez, deve atingir 25.687,6 mil toneladas, com aumento de 6,5% em comparação a obtida na temporada passada (Tabela 1). Nesse contexto, a produção brasileira deve bater novo recorde ao alcançar 3.701,3 mil toneladas, com acréscimo de 15,7% em comparação a quantidade obtida anteriormente, fato que reforça a relevância do Brasil na oferta da fibra.

 

 

Do lado da demanda, o consumo de algodão pelo mundo segue a tendência crescente na temporada 2024/25, quando deve alcançar 25.526,8 mil toneladas, com variação de 2,2% em relação a quantidade verificada no ano passado. Por seu turno, as transações internacionais com a fibra traduzidas pelas exportações de 9.857,5 mil toneladas devem permanecer praticamente no mesmo patamar, ainda que com tendência de queda em comparação ao volume de negócios registrados na temporada anterior (Tabela 1).  Por sua vez, as exportações por parte do Brasil devem continuar a crescer e alcançar 2.802,3 mil toneladas (Figura 1).

Ao se tratar de mercado de algodão em todas as esferas é imperativo considerar aspecto da maior relevância para a cadeia de produção de têxteis e de confecções que se refere à qualidade da fibra de algodão. A justificativa reside no fato do algodão não ser produto homogêneo, mas dotado de características intrínsecas associadas ao potencial genético do algodoeiro, assim como ao manejo na condução de sistemas da produção agrícola.  Desse modo, o conjunto dessas ações resultam em fibras com graus diferenciados de tipos e de padrões de qualidade, os quais são determinantes para a finalidade a que se destina seu emprego no segmento industrial8, 9

Nesse sentido os agentes que compõem a cadeia de produção de algodão no Brasil têm envidado esforços para o aprimoramento técnico dos sistemas produtivos com a finalidade de aumentar a produtividade na produção agrícola, de melhorar ainda mais o rendimento pluma10 simultaneamente ao aperfeiçoamento da qualidade da fibra. No Brasil, o rendimento pluma tem apresentado crescimento, alcançando 41,5% na safra 2024/25, conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB)11

Somam-se a essas ações as iniciativas voltadas à promoção comercial do algodão brasileiro com vistas à demanda doméstica e, em especial a ampliação de parcelas de mercado no âmbito internacional.

Nesse sentido destacam-se as parcerias com a Associação Brasileira de Produtores de Algodão (ABRAPA) entre as quais deve ser mencionada o Cotton Brazil12 que consiste na promoção do algodão brasileiro no mercado internacional com o apoio dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e o das Relações Exteriores, além da Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (ANEA). 

Por sua vez, o Movimento “Sou de Algodão”13 tem por objetivo promover o uso da fibra pela indústria têxtil brasileira na produção de manufaturados com o mínimo de 70% de algodão em sua composição.

Destacam-se também os programas de rastreabilidade da fibra de algodão produzida no Brasil através do Sistema ABRAPA de Identificação e mais recentemente com a implementação do “SouABR”14, que consiste no rastreamento da roupa desde o plantio do algodão certificado até a venda final. 

Assim, o algodão do Brasil tem sua presença consolidada no mercado internacional graças ao aumento da produção agrícola em bases tecnológicas que possibilitaram o crescimento quantitativo da produtividade dos algodoais, bem como por meio do aprimoramento em termos qualitativos das características intrínsecas da fibra com a finalidade de melhor atender a demanda industrial. Por fim, vale ressaltar a importante contribuição das ações voltadas à integração entre os segmentos que compõem a cadeia de produção de têxteis e de confecções de algodão no país.

  

  

1Adoção tecnológica e produtividade na cotonicultura brasileira foram analisadas por: NOGUEIRA JUNIOR, S.; BARBOSA, M. Z.; FERREIRA, C. R. R. P. Tecnologia e produtividade da cotonicultura brasileira. Agricultura em São Paulo, São Paulo, v. 49, n. 2, p. 17-29, 2002; NOGUEIRA JUNIOR, S.; BARBOSA, M. Z. O papel da pesquisa e a importância do cerrado para a reorganização da cotonicultura brasileira. Agricultura em São Paulo, São Paulo, v. 52, n. 2, p. 87-98, 2005.

 

2As safras ou temporadas no mercado internacional de algodão em pluma se estendem de agosto a julho.

 

3INTERNATIONAL COTTON ADVISORY COMMITTEE. Statistics data portal: 2015/16-2024/25. Washington, D.C.: ICAC, 2025. Disponível em: http://www.icac.org. Acesso em: 21 fev. 2025.

 

4INTERNATIONAL COTTON ADVISORY COMMITTEE. Regional and country level supply and demand - Brazil. Washington, D.C.: ICAC, 2025. Disponível em: https://icac.shinyapps.io/ICAC_Open_Data_Dashboaard/. Acesso em: 20 fev. 2025.

 

5INTERNATIONAL COTTON ADVISORY COMMITTEE. World cotton trade: import & export – Brazil. Washington, D.C.: ICAC, 2025. Disponível em: https://icac.shinyapps.io/ICAC_Open_Data_Dashboaard/. Acesso em: 20 fev. 2025.

 

6ROMERO, L. L. et al. Fibras artificiais e sintéticas. Relato Setorial. Rio de Janeiro: BNDES, jun. 1995. p. 55-66 apud BARBOSA, M. Z. Perspectivas para a demanda de algodão e de fibras sintéticas. São Paulo: Instituto de Economia Agrícola, 2002. Disponível em:  https://iea.agricultura.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=20. Acesso em: 20 fev. 2025.

 

7ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA TÊXTIL E DE CONFECÇÃO. Perfil do setor. São Paulo: ABIT, 2025. Disponível em: https://www.abit.org.br/cont/perfil-do-setor. Acesso em: 27 fev. 2025.

 

8NOGUEIRA JUNIOR, S. Relação preço-qualidade e procura de algodão em pluma. São Paulo: Instituto de Economia Agrícola, 1980. (Relatório de pesquisa, 11/80).

 

9BARBOSA, M. Z.; NOGUEIRA JUNIOR, S. Aspectos quali-quantitativos do consumo recente de algodão no Brasil. Informações Econômicas, São Paulo, v. 31, n. 4, p. 37-39, 2001.

 

10Rendimento pluma consiste, basicamente, no teor de algodão em pluma extraído do algodão em caroço no processo de beneficiamento. É resultante das características genéticas da variedade da semente e da condução do sistema de produção agrícola.

 

11COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO. Séries históricas das safras. Brasília, DF: CONAB, 2025. Disponível em: https://www.conab.gov.br/info-agro/safras/serie-historica-das-safras/itemlist/category/898-algodao. Acesso em: 21 fev. 2025.

 

12COTTON BRAZIL. Cotton Brazil. Brasília, DF: ABRAPA, 2025. Disponível em: https://abrapa.com.br/cotton-brazil/. Acesso em: 28 fev. 2025.

 

13MOVIMENTO SOU DE ALGODÃO. Sou de Algodão. Brasília, DF: ABRAPA, 2025. Disponível em: https://abrapa.com.br/sou-de-algodao/. Acesso em: 28 fev. 2025.

 

14SOUABR. Os programas de rastreabilidade da ABRAPA. Brasília, DF: ABRAPA, 2025. Disponível em: https://abrapa.com.br/rastreabilidade/. Acesso em: 28 fev. 2025.


Palavras-chave: algodão, mercado internacional, cadeia de produção.

 

 

 

COMO CITAR ESTE ARTIGO

ZEFERINO, M. Algodão do Brasil no Contexto Internacional, 2015/16 a 2023/24. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 20, n. 3, p. 1-6, mar. 2025. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 18/03/2025

Autor(es): Marisa Zeferino (marisa.zeferino@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor