Quando Reformar Um Canavial?

            Em administração rural, o uso de instrumentos de análise econômica é sempre recomendável, pois pode representar a diferença entre extrair lucro ou ter prejuízo na atividade agrícola, pelo menos no que diz respeito àquelas variáveis em que o produtor tem maior possibilidade de gerenciar.
            A disseminação do uso de contabilidade agrícola e de estimativas de custos tem como finalidade proporcionar instrumentos racionais de decisão, através de indicadores gerenciais construídos a partir dessa base de dados. Um desses pode ser utilizado para responder uma questão crucial do produtor de cana-de-açúcar, qual seja a de quando se deve reformar seu canavial, posto tratar-se de um investimento de alto valor, o qual, de um lado, não pode deixar de ser remunerado adequadamente e, de outro lado, não pode gerar prejuízos. Tanto um resultado como o outro são passíveis de ser obtidos dependendo da evolução dos custos e da rentabilidade decorrentes do ciclo da cultura, supondo uma condução sempre correta no seu manejo e condições externas favoráveis.

Método do valor anual equivalente

            Esse método é para ser utilizado na comparação entre fluxos de caixa com tempo de vida diferentes. Neste caso como o valor anual equivalente (VAE) é função do número de cortes da cana-de-açúcar, calcula-se o VAE de cada corte, levando-se em conta o mesmo valor de investimento, descontando-se os VAEs a uma determinada taxa representativa dos custos de oportunidade do investimento.
            Os valores dos VAEs deverão ser crescentes ao longo do tempo até atingir um máximo, tornando-se depois decrescentes. O valor máximo estará representando o número ótimo de cortes. Para se calcular o VAE, utiliza-se o conceito de margem de contribuição (MC), definida como sendo a diferença entre a renda líquida gerada pela cana-de-açúcar e os custos variáveis de produção, procedimento usual do CTC/COPERSUCAR, o qual leva em conta, corretamente, o sistema agroindustrial como um todo, ou seja, estima a MC dos produtos da agroindústria para determinar o número ótimo de cortes1 (Bullio, 1988). A fórmula genérica utilizada é:

            Em nosso caso, por ser um exemplo hipotético, com o objetivo de ajudar a difundir o método de cálculo, adota-se a MC como sendo a diferença entre os custos variáveis de produção da cana-de-açúcar (despesas diretas com tratos culturais, insumos e colheita) e seu valor da produção (preço da matéria-prima x quantidade produzida), conforme tabela abaixo.

Tabela 1. Margem de Contribuição para Custos Simulados de Cana,
Produtividade Total de 512 t/ha em 5 cortes, em US$

.
formação 
1o. Corte
2o. Corte
3o. Corte
4o. Corte
5o. Corte
6o. Corte
7o. Corte
produtividade
 
138
107
100
88
79
60
45
formação da lavoura
565
             
tratos culturais
 
56
56
56
56
56
59
59
insumos
 
99
99
99
99
99
196
196
colheita semi-mecanizada
 
374
291
274
241
217
167
85
total 
565
529
446
429
396
372
422
340
margem de contribuição - MC
 
623
404
329
248
190
62
32
VAE da MC
 
-58
462
791
1.039
1.229
1.291
1.323
crescimento percentual
   
-
71%
31%
18%
5%
2.,5%

Fonte: elaborado pelo autor com base em Agrianual (2002) e outras fontes informais

            Usou-se como base de cálculo os valores em dólares e alguns coeficientes estimados pela publicação Agrianual (2002) para estimar os custos variáveis, compostos por tratos culturais, insumos e colheita, além dos custos diretos de formação da lavoura. Adotou-se a suposição de que após o quinto corte haveria necessidade de se aumentar o uso de alguns insumos para manter o nível estabelecido de produtividade, além do aumento com tratos culturais. A MC foi estimada pela diferença entre a renda e os custos, ao preço de US$ 9,19 para a tonelada da matéria-prima, sendo em seguida descontada a uma taxa de 12% a.a. para se chegar ao fluxo do VAE da MC, considerando que o 1°corte ocorre somente após 18 meses (1,5 ano) do plantio e os demais cortes a cada 12 meses.
            Observando-se a linha da tabela com os valores do VAE da MC, vê-se que no primeiro corte a renda líquida não é suficiente para cobrir os gastos com o investimento. No 2° corte, por sua vez, a renda líquida já se torna superior ao investimento, situação que se conserva para os demais cortes, notando-se que seus valores são sempre crescentes. Todavia, esse crescimento do VAE o é a taxas decrescentes, sendo muito pequeno no 6° corte e menor ainda no 7° corte.
            Nesse sentido, deve-se explorar o ciclo de cana até o 5° corte (ou mesmo até o 6°, dependendo de condições que favoreçam o adiamento), pois a reforma estará significando a criação de um novo fluxo de renda líquida, maior que a anterior. Ressalte-se que o resultado sanciona a elevação de custos proposta principalmente por se tratar de um exercício montado.
            Na prática, todavia, esse mesmo resultado pode ocorrer e ficar mascarado pelo fluxo positivo da renda líquida, induzindo o produtor a adiar o início do novo ciclo, dado que não só os valores de investimento são altos como também se tem que enfrentar os custos financeiros do empreendimento.
            Assim, a decisão da reforma passa a ser feita a partir de critério econômico e não pela produtividade física da atividade, seja ela decrescente ou em ritmo de decréscimo não muito acentuado, pois o que interessa é analisar o comportamento do fluxo de renda líquida em termos de nível e de evolução.
 

1 Bullio, Marcos T.  Nota técnica sobre o valor econômico de variedades, in Anais do IV Seminário de Tecnologias Agronômicas, Centro de Tecnologia da Copersucar - CTC, novembro de 1988.

Data de Publicação: 11/03/2002

Autor(es): Alceu De Arruda Veiga Filho Consulte outros textos deste autor