Importações de Lúpulo Fomentam a Produção Agrícola Nacional e o Mercado Cervejeiro


O Brasil está entre os principais países produtores de cerveja do mundo, movimentado as pautas de exportações de cerveja e de importações de ingredientes para a sua produção, como o lúpulo. Dessa forma, tratar e explorar informações sobre parte dessa realidade constitui o objetivo deste artigo.

Em 2023, a produção brasileira declarada foi superior a 15 bilhões de litros de cerveja, impulsionada pelo aumento de 7% no número de estabelecimentos registrados no Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), totalizando 1.847 cervejarias, das quais 118 são novos registros2. Neste universo, o estado de São Paulo concentra pouco mais de 22% das cervejarias nacionais, seguindo do Rio Grande do Sul com 18%, de Minas Gerais com 13%, e de Santa Catarina com 12%, posicionando, assim, as regiões Sul e Sudeste com 86% das cervejarias no Brasil. Por outro lado, quando considerado o volume produzido em 2023, a região Sudeste representou 53%, a região Nordeste, que detém a maior média de produção por estabelecimento, ocupou a segunda posição com participação de 21%, e a região Sul teve 15% do total produzido3.

Parte da produção brasileira é exportada, principalmente, as cervejas de malte, sendo o Paraguai o principal destino, acompanhado da Bolívia, Uruguai, Chile e Argentina. Dentre os mais de 50 países importadores da cerveja brasileira, também são destinos frequentes países como Estados Unidos, México e Holanda. Em 2023, o Paraguai respondeu por quase 60% do total exportado, a Bolívia, com 17%, Uruguai com 10% e Chile com 9%4.

Quando observada a evolução das exportações nos últimos dez anos, o ano de 2020, em comparação ao ano anterior, marca um acréscimo em torno de 35% nos volumes exportados de cervejas de malte brasileiras. Esse salto posiciona a média anual, no período de 2020 a 2023, em torno de 209 milhões de litros, ultrapassando a média anual de 136 milhões de litros registrada no período de 2014 a 2019. Para os valores exportados, o período entre 2014 e 2020 atingiu média anual em torno de US$88 milhões. O ano de 2021 somou US$132 milhões e 2023 encerra com pouco mais de US$151 milhões, refletindo, assim, a alta nos volumes exportados e estabilidade nas cotações praticadas (Figura 1).


 

As exportações brasileiras de cervejas de malte têm o município de Cândido Mota, em São Paulo, como a principal origem. Em 2023, esse município foi responsável pela exportação de 57%, seguido de Itu, também no estado de São Paulo, com 12%, Viamão, no Rio Grande do Sul, com 5%, e Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, com 4% do volume total exportado.

Do outro lado da balança estão as importações de cervejas de malte que, nos últimos anos, apresentam retração, configurando um cenário de superávit que se amplia ano a ano. Em 2020 as importações somaram pouco mais de US$15 milhões; em 2022, US$13 milhões; em 2023, US$8 milhões (o que corresponde a pouco mais de sete milhões de litros nesse período). Alemanha, Bélgica, Uruguai e Estados Unidos estão entre os principais países que participam das importações brasileiras5. Cabe destacar que as cervejas importadas possuem cotação 45% superior às cotações praticadas para as exportações brasileiras, refletindo o interesse brasileiro pelo produto importado de maior valor agregado6.

Para a produção brasileira de cerveja as importações são importantes, especialmente aquelas vinculadas ao lúpulo, ingrediente responsável pelo aroma, sabor e estabilidade da espuma das cervejas7. Em 2023, as informações consolidadas a partir da Declaração Anual de Produção e Estoques realizada pelos estabelecimentos de cerveja no MAPA, apontam que em torno de 15 bilhões de litros da cerveja brasileira foram produzidos com lúpulo internacional, e pouco mais de 41 milhões de litros produzidos a partir do lúpulo nacional8.

A importação desse insumo envolve os cones de lúpulo frescos e secos, a lupulina, os cones de lúpulo triturados, moídos ou em pellets, e os sucos e extratos de lúpulo. Os cones frescos, desde 2020, apresentam redução nos volumes importados, encerando 2023 com apenas 480 kg, em contraponto às mais de sete toneladas importadas em 2019. Essa mercadoria tem os Estados Unidos e a Alemanha como os principais fornecedores para o Brasil. A lupulina também teve seu espaço reduzido na pauta de importações do segmento, tendo seu último registro no ano de 2021 com 21 toneladas, e os Estados Unidos como o único fornecedor no período de 2015 a 20219.

Por outro lado, no período de 2014 a 2023, a importação de cones de lúpulo triturados ou em pellets manteve média anual em torno de 2,3 mil toneladas, exceto no ano de 2021, com registro de volumes superiores a três mil toneladas. Para os valores, observa-  -se que no período mais recente de 2019 a 2023, houve alta nos preços praticados, com variações de US$12,31/kg e US$14,64/kg10 (Figura 2).

 

Os principais fornecedores de cones de lúpulo triturados ou em pellets são os Estados Unidos e a Alemanha que, juntos, em 2023, responderam por 94% das importações brasileiras. Porém, República Tcheca, Hong Kong e Austrália também participam dessa pauta de importação. Como destinos estão os principais municípios brasileiros importadores, dentre eles Cariacica no Espírito Santo, Bento Gonçalves e Porto Alegre no Rio Grande Sul, Joinville e Itajaí em Santa Catariana, e Barueri e Itu no estado de São Paulo11.

As importações de sucos e extratos de lúpulo também são fundamentais para a produção da cerveja brasileira. Essa mercadoria de maior valor agregado que os cones de lúpulo triturados ou em pellets registrou alta nos volumes importados, especialmente a partir de 2018, quando atingiu 948 toneladas e valores próximos a US$24 milhões. Em 2022, cotações mais favoráveis impulsionaram a importação de 1,52 mil toneladas por US$36 milhões. Já o ano 2023 pontuou alta nas cotações e retração de 28% nos volumes importados e de 8% nos valores (Figura 3).

 

Os Estados Unidos figuram como a principal origem das importações brasileiras de sucos e extratos de lúpulo, respondendo por 87% das importações realizadas em 2023, sendo também destaque países como Alemanha, Reino Unido e China12.

A crescente movimentação da produção de cervejas e as importações de cones e sucos de lúpulo têm fomentado a produção agrícola desse ingrediente importante, mas também utilizado em outros segmentos da indústria de alimentos, assim como nas indústrias farmacêutica e de cosméticos. O lúpulo é nativo das regiões de clima temperado do hemisfério norte, perene e herbáceo. No Brasil, teve seus plantios iniciais na segunda metade do século XIX13.

A produção brasileira ganha importância não só em razão de aspectos econômicos, mas também pela qualidade, ao preservar os óleos aromáticos do lúpulo. A busca pelo ingrediente recém-colhido e desidratado com menor armazenamento evita a perda de qualidade que ocorre no processo de pelletização com a oxidação e a degradação dos compostos químicos14, 15. Dessa forma, cultivares vêm sendo trabalhados e adaptados às condições de clima e solo do Brasil. Atualmente, há 50 cultivares de Humulus lupulus L. cadastrados no Registro Nacional de Cultivares (RNC) do MAPA16, e pelo menos 17 viveiros de mudas cadastrados no Registro Nacional de Mudas e Sementes (RENASEM)17.

Além do material genético, os sistemas de produção também estão sendo trabalhados, assim como as etapas de colheita, secagem, processamento e armazenamento do lúpulo. Os desafios para a produção de lúpulo, ainda recente no Brasil, estão presentes em diferentes etapas da cadeia de produção, mobilizando ações em pesquisa e inovação, e extensão rural, contando com iniciativas públicas e privadas de fomento em diferentes estados brasileiros e em âmbito nacional.

Dentre elas está a fundação em 2018 da Associação Brasileira de Produtores de Lúpulo (APROLUPULO), a instalação em 2019 da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva da Cerveja, junto ao MAPA, assim como a execução de projetos de incentivo à produção em estados produtores, com destaque para Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Minas Gerais18. Destacam-se também os eventos e encontros técnicos e científicos sobre a cultura em diferentes frentes de discussão a exemplo, das edições do Encontro Brasileiro de Pesquisadores e Produtores de Lúpulo (ENBRALÚPULO).

No momento, apesar da ausência de estatísticas oficiais sobre área e produção de lúpulo no Brasil, há estimativas do segmento de produção em torno de 20 hectares para área plantada e 24 toneladas anuais de produção19. Da mesma forma, outras considerações indicam que as experiências brasileiras na produção de lúpulo estão distribuídas em diferentes regiões e somam 50 hectares20. As ações e estratégias em andamento apontam os desafios e as perspectivas promissoras para incrementar e aprimorar a produção de lúpulo no Brasil.

 

1Trabalho com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), Projeto CNPq-Universal, processo: 401753/2023-9 e, apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de nível Superior (CAPES) – Código de financiamento 001.

 

2BRASIL. Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA). Anuário da Cerveja 2024, ano de referência 2023. Brasília: MAPA, 2024, 51 p. Disponível em:  https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/com-1-847-cervejarias-registradas-no-brasil-setor-cresce-6-8-em-2023/anuario-da-cerveja/view. Acesso em: 11 jun. 2024.

3Op. cit. nota 2.

 

4COMEXSTAT. Sistema oficial para extração das estatísticas do comércio exterior brasileiro de bens. Brasília: Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, 2023. Disponível em: https://comexstat.mdic.gov.br/pt/home. Acesso em: 5 jun. 2024.

 

5Op. cit. nota 4.

 

6Op. cit. nota 2.

 

7DURELLOA, R. S.; SILVA, L. M.; BOGUSZ JUNIOR, S. Química do lúpulo. Revista Química Nova, v. 42, n. 8, p. 900-919, 2019. Disponível em https://quimicanova.sbq.org.br/pdf/RV20190148. Acesso em: 9 jun. 2024.

 

8Op. cit. nota 2.

 

9Op. cit. nota 4.

 

10Op. cit. nota 4.

 

11Op. cit. nota 4.

 

12Op. cit. nota 4.

 

13BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Secretaria de Agricultura Familiar e Cooperativismo. CREUZ, A.; KRETZER, S. G. (org.). Lúpulo no Brasil: perspectivas e realidades. Brasília: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Secretaria de Agricultura Familiar e Cooperativismo, 2022. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/arquivos/livro_lupulo-no-brasil-perspectivas-e-realidade_baixa_semmarcacao.pdf. Acesso em: 10 jun. 2024.

 

14Op. cit. nota 13.

 

15JASTROMBEK, J. M. et al. Hop: an emerging crop in subtropical areas in Brazil. Horticulturae, v. 8, n. 5, p. 393, 2022. Disponível em: https://www.mdpi.com/2311-7524/8/5/393. Acesso em: 14 jun. 2024.

 

16BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Registro Nacional de Cultivares. Brasília: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Cultivar Web, 2024. Disponível em: https://sistemas.agricultura.gov.br/snpc/cultivarweb/cultivares_registradas.php. Acesso em: 10 jun. 2024.

 

17Op. cit. nota 15.

 

18GUIMARÃES, B. P.; EVARISTO, R. B. W.; GHESTI, G. F. Prospecção tecnológica do lúpulo (Humulus lupulus L.) e suas aplicações com ênfase no mercado cervejeiro brasileiro. Cadernos de Prospecção, Salvador, v. 14, n. 3, p. 858-872, set. 2021. Disponível em: https://periodicos.ufba.br/index.php/nit/article/view/33059/24819. Acesso em: 12 jun. 2024.

 

19SPÓSITO, M. B. et al. A cultura do lúpulo. Série Produtor Rural, Piracicaba, n. 68, 2019. 85 p. Disponível em: https://www.esalq.usp.br/biblioteca/sites/default/files/publicacoes-a-venda/pdf/SPR68.pdf. Acesso em: 12 jun. 2024.

 

20Op. cit. nota 15.


Palavras-chave: Cerveja, exportações, Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), políticas públicas.


  

 

COMO CITAR ESTE ARTIGO

SAMPAIO, R. M. et al. Importações de lúpulo fomentam a produção agrícola nacional e o mercado cervejeiro. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 19, n. 6, p. 1-7, jun. 2024. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.



Data de Publicação: 27/06/2024

Autor(es): Renata Martins (rmsampaio@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Marcelo Eiras (marcelo.eiras@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Ana Suele Neres (ana.nere.engenharia@gmail.com) Consulte outros textos deste autor
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