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Lei Florestal e as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADINs): efeitos globais na agropecuária paulista
1 - INTRODUÇÃO O Instituto de Economia Agrícola (IEA) desde 2006 vem
produzindo artigos sobre a legislação florestal e seus impactos sobre a
agropecuária paulista2. Este artigo tem como finalidade realizar um sumário
dos textos que foram publicados nesses dez anos, quando foram discutidas
questões relativas ao Código Florestal, e assim fornecer o panorama que vem se
cristalizando nesse período, no qual questões relevantes que foram colocadas,
pouco ou nada foram levadas em consideração pelos atores diretamente envolvidos.
Sob o prisma conceitual da
sustentabilidade e dos serviços ecossistêmicos, os autores, bem como seus
respectivos artigos, têm sugerido adequar a legislação a parâmetros técnicos e
científicos, propondo a incorporação do que existe de mais contemporâneo nesse
campo3 (Figura 1). A votação da Lei Florestal de 2012 (Lei n. 12.651)4,
também chamado de Novo Código Florestal, frustrou a maioria dessas expectativas
ao agasalhar antigas concepções já presentes na legislação anterior (Lei n. 4.771/1965). Muitas das adaptações trazidas à baila pela nova
legislação ambiental vieram ao encontro dos anseios do setor produtivo, que
buscava garantir a continuidade da produção nacional aliada à preservação e ao
cumprimento da legislação em vigor. Entretanto, algumas Ações Diretas de
Inconstitucionalidade (ADINs)5 foram interpostas perante o Supremo
Tribunal Federal (STF), alegando, resumidamente, ser o conteúdo parcial da lei
florestal sancionada, contrário a preceitos e princípios da Constituição
Federal. As possíveis modificações advindas da eventual procedência de ADINs em
tramitação no STF poderão impactar desfavoravelmente a agropecuária paulista6. Assim, é extremamente difícil ser contra ou a favor
de algo tão pouco qualificado tecnicamente. Ser favorável é não resolver as
questões ambientais; ser contrário é prejudicar ainda mais a agropecuária,
setor mais dinâmico da combalida economia brasileira. Outra questão
apontada é de que a lei foi preconcebida/concebida considerando o território
brasileiro como um todo uniforme no tocante ao processo histórico de sua
ocupação, relativamente aos aspectos econômicos, sociais e ambientais, não
levando em conta as especificidades regionais, postulados intrínsecos do
desenvolvimento sustentável7. 2 - OS EFEITOS DA LEGISLAÇÃO Ao considerar os serviços ecossistêmicos,
verifica-se que a Lei n. 12.6518 trata de duas situações econômicas
radicalmente diferentes, localizadas na mesma unidade produtiva e sob gestão do
mesmo agente econômico (Figura 2). Uma produz para o mercado, pelo qual é ressarcida de
seus custos e gera um superavit
comercial. Numa segunda função é obrigada a produzir bens públicos, pelos quais
arca com os custos, mas não recebe nenhuma remuneração. Essa situação configura
um imposto oculto para o agente produtor. Como já enfatizado, a Lei n. 12.6519
trata, portanto, de situações diferentes de um modo igual. As condições
regionais, não apenas físicas, mas também históricas e culturais, foram
deixadas de lado, o que leva a considerar regiões de desenvolvimento
consolidado como se fossem áreas de expansão de fronteira agropecuária. O Estado de São Paulo, por exemplo, tem o seu espaço
territorial ocupado há mais de 150 anos, e suas fronteiras de expansão físicas
esgotadas há 50 anos. No estado, o uso e ocupação do solo estão consolidados em
agricultura, pecuária, floresta e infraestrutura de propriedades privadas e
públicas. Qualquer rearranjo nesse panorama se faz à custa de substituições de
uma atividade por outra10 (Figuras 3 e 4).
Assim, o estado tem, atualmente, um uso e ocupação
do solo que na média pode ser representado pela tabela A lei florestal, desrespeitando parâmetros técnicos,
inventou uma condição inexistente na ciência: a criação de áreas de conservação
baseadas em porcentagem das áreas das propriedades. Apenas verificando as estruturas
agrárias regionais do país, verifica-se o despropósito dessa técnica.
Atualmente existem alguns estudos, ainda incipientes, tentando relacionar as
funções ecológicas com um percentual de vegetação na paisagem, que seria de
30%. Mas esse percentual incide sobre qual área? Qual é definição de paisagem
considerada? As próprias teorias e conceitos utilizados pelos
órgãos ambientais oficiais, para a criação de áreas de conservação, enfatizam
dois parâmetros que deveriam nortear essa escolha: tamanho e forma (Figura 5).
Tamanho
para
abranger os processos inerentes às cadeias tróficas contemplando toda sua
complexidade e da maneira mais completa possível. Forma
para preservar esses processos evitando ao máximo influências externas. Assim sendo, quanto menores forem as propriedades,
menores serão as áreas de conservação e menos eficientes elas serão do ponto de
vista ambiental. Funcionarão como fragmentos de vegetação, mas não cumprirão as
funções definidas pela lei. Em Estados como São Paulo, com alto grau de
urbanização, agirá inclusive como criadouros de espécies indesejadas pelos
humanos, já que pela quebra das cadeias e pela endogamia, acabam proliferando
espécies mais adaptadas a condições adversas (as generalistas), ou de poucos
predadores, como aracnídeos, roedores e répteis11. Para cumprir, portanto, o que a lei determina, essas
áreas deveriam ter tamanhos compatíveis com a sua destinação. Um dos poucos
trabalhos12 que mediram qual seria essa área chegou a 60% na
Amazônia. Transpondo, com todas as ressalvas técnicas e científicas, para São
Paulo, onde se requer 20% da área da propriedade como local para conservação,
as propriedades deveriam ter algo como 10 mil hectares cada, qual sejam, cerca
de 50 no território paulista. Isso inviabiliza a reserva “por propriedade”. Segundo
o último LUPA feito no estado, o tamanho médio da propriedade rural em São Paulo
era de 63 hectares, o que significa áreas de conservação de 12 hectares,
absolutamente insuficientes para promover adequação ambiental. Com a versão da nova Lei (n. 12.651/2012) e dadas as
condições de ocupação do solo paulista, a recuperação das Reservas Legais
ocupará uma área da agropecuária de quase 1 milhão de hectares, respeitadas as
isenções definidas legalmente. Se algumas das ADINs forem acatadas, essa área
passará a mais de 4 milhões de hectares, o que deverá impactar a produção
agropecuária paulista conforme a tabela 2. Como
se pode constatar, o aumento das áreas de Reserva Legal preconizadas pelas ADINs
terá como único efeito reduzir a
produção agropecuária, aumentado seus custos e reduzindo emprego e renda, sem
produzir efeitos ambientais Além do mais, já foram cadastradas no sistema da
Secretaria do Meio Ambiente mais de 250 mil propriedades, que, ao fazerem o
Cadastro Ambiental Rural (CAR), optaram pela lei como vigendo e que seriam
atropeladas em seus direitos. 3
-CONCLUSÕES E PROPOSTAS
O
mapa da figura 6 sintetiza as condições e os problemas hídricos do estado e
pode balizar políticas para implantação de reservas legais como política
pública. Pode-se
notar que as áreas prioritárias para intervenção estão perfeitamente
caracterizadas, seja como águas superficiais, seja como aquíferos subterrâneos. Assim,
em resumo, a preservação das áreas de
recarga dos aquíferos, dos cursos d’água críticos e bacias declaradas críticas,
por meio de reservas legais estadualizadas, mostra-se como exemplo de ações norteadoras de políticas agropecuárias e
ambientais,
baseadas
em pesquisas científicas realizadas pelas Secretarias da Agricultura e
Abastecimento e do Meio Ambiente, além de outros órgãos do governo do Estado de
São Paulo. Como a lógica embutida
nas ADINs vai na contramão do processo de desenvolvimento, as regiões paulistas
de agricultura mais desenvolvida serão as maiores penalizadas com redução de
área com lavouras de interesse econômico e quase nada se beneficiarão de
melhorias ambientais. O que este artigo também permite concluir é que,
malgrado as intenções da legislação e das políticas públicas terem um discurso
de desenvolvimento sustentável, os seus efeitos vão em direção contrária. Essa
situação é agravada pela própria lei que ignora a importância igualitária que
devem ter os serviços ecossistêmicos, conferindo um peso exagerado àqueles
classificados de “ambientais”, em detrimento dum equilíbrio com os componentes
sociais e econômicos. Com as ADINs consideradas para o cenário construído,
atinge-se o paroxismo de provocar desemprego e retração econômica, sem resolver
a questão de como implantar com eficácia uma política de reservas destinadas à
conservação, imaginando, de maneira simplista, que mais de 300 mil
proprietários paulistas teriam condições técnicas, científicas e econômicas de
fazer essa implantação. Ao mesmo tempo, imagina-se fazer política pública
ambiental passando a responsabilidade para apenas uma parcela da população, sem
se atentar inclusive para a complexidade da tarefa. __________________________________________________________ 1Artigos pioneiros no IEA sobre o tema foram publicados pelo
saudoso Pesquisador Cientifico José Sidnei Gonçalves e, desta forma, este
artigo representa um tributo ao mesmo. 2GONÇALVES, J. S.; CASTANHO FILHO, E. P. Reserva
legal: obrigatoriedade e impactos na agropecuária paulista. Análises e
Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 1, n. 6, jun. 2006. Disponível
em: <http://www.iea.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=6371>. Acesso em:
jul. 2016; ______.; ______. Defesa da reserva legal não justifica preconceito
contra pecuária. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 1,
n. 7, jul. 2006. Disponível em:
<http://www.iea.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=6416>. Acesso em:
jul. 2016; ______.; ______. Defesa da reserva legal e complexidade da agropecuária
paulista. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 1, n. 7,
jul. 2006. Disponível em:
<http://www.iea.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=6415>. Acesso em:
jul. 2016. 3 CASTANHO FILHO, E. P.; OLIVETTE, M. P. A. Código florestal: cavalo selado
não passa duas vezes. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo,
v. 6, n. 11, nov. 2011. Disponível em: <http://www.iea.sp.gov.br 4BRASIL. Lei n. 12.651, de 25 de
maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis
nos 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e
11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nos 4.771, de 15 de
setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória
no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Diário
Oficial da União, 28 maio 2012. 5Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADIN) é aquela interposta ao Supremo Tribunal Federal
(STF), objetivando declarar determinada lei ou ato normativo inconstitucional,
por contrariar preceitos da Constituição Federal. É regulada pela Lei n. 9.868,
de 10 de novembro de 1999. Informações Econômicas, SP, v. 43, n. 4, jul./ago.
2013. 6______. et al. A evolução da agropecuária paulista e a implantação da
Legislação Ambiental: impactos socio 7______.; CAMPOS, A. D. C. Código
Florestal: sancionar e propor um melhor. Análises e Indicadores do
Agronegócio, São Paulo, v. 7, n. 5, maio 2012. Disponível em:
<http://www.iea.sp.gov.br/out/LerTexto.php?cod 8Op. cit. nota 4. 9Op. cit. nota 4. 10Op. cit. nota 6. 11BRUNINI,
O. et al. Zoneamento agroambiental.
São Paulo: SAA/ SMA/ FUNDAG/FLORESTAR, 2012. (Mimeografado). 12METZGER, J. P. O
código florestal tem base científica? Natureza e
Conservação, Rio de Janeiro, v. 8, n.
1, 2010. Disponível em:
<http://www.abecol.org.br/volume8/natcon.00801017.pdf>. Acesso em: 26
maio 2011. Palavras-chave: lei florestal,
agropecuária, Estado de São Paulo.
/out/LerTexto.php?codTexto=12244>. Acesso em: jul. 2016.
econômicos e ambientais. Informações Econômicas, São Paulo, v. 43, n. 4,
jul./ago. 2013.
Texto=12368>. Acesso em: jul. 2016.
Data de Publicação: 22/07/2016
Autor(es):
Eduardo Pires Castanho Filho (castanho@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Adriana Damiani Correia Campos (adccampos@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Mario Pires De Almeida Olivette (olivette@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor