Situação da Febre Aftosa no Brasil

A febre aftosa é uma doença infectocontagiosa de grande importância na pecuária de corte, por ser de disseminação rápida e impor a necessidade de eliminação dos animais contaminados com perda total da produção.

Os principais prejuízos são econômicos e atingem tanto os pequenos quanto os grandes pecuaristas. Além de poder levar os animais à morte, há a interdição das propriedades com animais doentes.

Afeta diretamente as exportações de carne e derivados, pois as barreiras sanitárias e fitossanitárias, principalmente por parte dos países europeus e Estados Unidos, levam a embargos do produto, tendo em conta a segurança e a qualidade dos produtos agroalimentares, fazendo com que outros países sigam o mesmo comportamento.

Essas barreiras são criadas como imposição do comércio exterior sujeito a determinação e imposição de normas técnicas e sanitárias, tendo em vista a preocupação com a segurança alimentar dos consumidores e saúde animal.

Países como Japão, Coreia do Sul, Cingapura, México, EUA e Canadá restringem suas importações de carne resfriada ou congelada de países que ainda usam a vacinação. Embora o sistema de defesa sanitária animal brasileiro tenha evidenciado a ausência de atividade viral nos monitoramentos realizados nos últimos dez anos, estes países têm dúvidas sobre a ocorrência da aftosa no gado vacinado. Este mercado é avaliado em cerca de US$12 bilhões1.

O Brasil é o maior exportador mundial de carne bovina e o controle da febre aftosa do rebanho bovino é um dos fatores fundamentais que viabilizaram essa conquista.

A doença foi detectada pela primeira vez na Itália, em 1514. No Brasil, o primeiro registro ocorreu em 1895, no Triângulo Mineiro2.

Em 1934, o Ministério da Agricultura investiu na prevenção com ações contra a aftosa, publicando o Regulamento do Serviço de Defesa Sanitária Animal3. Entretanto, as instruções específicas para o controle da doença, que incluíam a vacinação, foram definidas em 1950, e as campanhas organizadas tiveram início em 19654.

A melhora só foi possível devido a um trabalho conjunto entre governo federal, governos estaduais e o setor privado, representado por elos da cadeia produtiva (produtores e industriais) e pela sociedade em geral.

No Estado de São Paulo, foi o Decreto Lei n. 49, de 25/04/1969, que instituiu a “Campanha de Combate à Febre Aftosa”. Essa é a data em que se inicia oficialmente o combate à doença5.

Quem coordena o combate à febre aftosa no Brasil é o Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), por meio do Programa Nacional de Erradicação e Prevenção da Febre Aftosa (PNEFA), que tem responsabilidades compartilhadas entre o governo federal (Departamento de Saúde Animal/Secretaria de Defesa Animal do MAPA - DSA/SDA/MAPA - e Superintendências Federais de Agricultura - SFAs), o serviço veterinário estadual e o setor privado, sendo que a execução do programa está a cargo das secretarias estaduais de agricultura e instituições vinculadas6.

Os últimos focos ocorreram em 2005 nos Estados de Mato Grosso do Sul e Paraná, o que levou à suspensão da condição de zona livre nestes dois estados e em outros dez, inclusive São Paulo7. Desde 2006 não ocorreram mais focos; no entanto, a região Norte (Amazonas, Roraima e Amapá) ainda não conquistou a classificação de livre com vacinação pela Organização Mundial da Saúde Animal (OIE), que é responsável por garantir a segurança sanitária do comércio mundial, elaborar normas sanitárias para o controle das epizootias (enfermidades contagiosas de animais), garantir maior segurança dos alimentos de origem animal e o bem-estar animal8.

O resultado da segunda campanha nacional de vacinação contra a aftosa, em 2015, atingiu 98,17% do rebanho brasileiro de 212.498.608 cabeças, segundo informações do Secretaria de Defesa Sanitária do MAPA. Os Estados que tiveram menor índice de vacinação foram Rio de Janeiro (84,90%), Paraíba (87,51%), Amapá (87,58%), Rio Grande do Norte (90,47%), Amazonas (91,96%) e Distrito Federal (91,07%)9.

Os demais estados da região Nordeste e o nordeste do Pará são considerados como médio risco para a doença. Roraima, que era considerado de alto risco, passou em 2015 a risco médio, enquanto o noroeste do Pará continua como alto risco. No Amazonas e Amapá, o risco era desconhecido. Entretanto, segundo o MAPA, esses dois estados conseguiram atingir melhores índices no segundo semestre de 2015, e poderão ser reclassificados como risco médio.

A classificação de níveis de risco por febre aftosa, de acordo com a Portaria n. 50, de 19/05/1997, leva em consideração não só a presença do vírus ou ocorrência de casos clínicos da doença, mas também a qualidade do serviço veterinário, a situação de áreas vizinhas, a cobertura vacinal, entre outros critérios10.

De acordo com a IN n. 44, de 2/10/2007, para um estado ou parte dele ser reconhecido como zona livre de febre aftosa ou como zona tampão, deverá apresentar, no mínimo, classificação BR-3 (risco médio) para febre aftosa ou outra classificação de risco semelhante a que venha a ser adotada pelo MAPA11.

Tornar o Brasil livre da febre aftosa com vacinação até o fim de 2015 era a meta do MAPA; no entanto, isso não ocorreu e no início de 2016 o ministério destinou, para a defesa agropecuária, a quantia de R$24 milhões prevista para ser gasta até 2017, que deverá garantir o status sanitário necessário ao país e reconhecimento internacional pela OIE. Esse recurso monetário deverá ser utilizado para o fortalecimento de 15 agências estaduais de defesa agropecuária, por meio de convênios estabelecidos via Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (SUASA). Os Estados contemplados com os recursos são: Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Norte, Paraíba, Mato Grosso, São Paulo, Pernambuco, Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso do Sul, Piauí, Roraima, Rio Grande do Sul e Tocantins12.

Em 2016, todos os estados e o Distrito Federal participam das campanhas de vacinação, exceto Santa Catarina, reconhecido pela OIE como livre de febre aftosa sem vacinação desde 200713.

Na primeira fase do calendário nacional de vacinação no Brasil, o único Estado em que não havia previsão de vacinação era o Amapá, mas esta ocorrerá em todo rebanho entre setembro e novembro de 2016. Outros Estados que também terão a totalidade de seus rebanhos vacinados são Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará e Tocantins14.

Segundo o MAPA, até 2020 a expectativa é que a produção nacional de carnes consiga suprir 44,5% do mercado mundial. Se estas estimativas forem corretas, o Brasil deverá se manter na posição de primeiro exportador de carne bovina do mundo15.

O último foco de febre aftosa no Estado de São Paulo ocorreu em março de 1996. O estado é reconhecido pela OIE como livre de febre aftosa com vacinação desde 2000. No entanto, entre 2005 e 2007 teve reconhecimento suspenso devido a introdução do vírus da febre aftosa nos Estados vizinhos de Mato Grosso do Sul e Paraná16

Apesar do grande avanço, o Estado, segundo a Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA), deve ser o último a ser considerado área de livre, devido ao fato de São Paulo ser uma área de trânsito de bovinos, o que faz necessário ter um processo gradual de retirada da vacinação com monitoramento dos outros estados17.

Essa situação sanitária do estado é resultado do trabalho de todo o setor pecuário paulista, incluindo o Serviço Veterinário Oficial (Coordenadoria de Defesa Agropecuária-CDA-SAA e MAPA), os produtores rurais, os frigoríficos, as indústrias produtoras de vacinas contra a febre aftosa e revendedores18.

Em 2015, o Estado de São Paulo conseguiu atingir 99,03% do total do rebanho durante a segunda etapa da campanha anual. O objetivo é conseguir o reconhecimento do status de livre da doença sem vacinação até 2020 pelo MAPA. Acredita-se que, com a implantação da Guia de Trânsito Animal (GTA) eletrônica, que foi disponibilizada pela CDA recentemente, será viável obter séries históricas da situação da vacinação contra a aftosa e com isso possibilitar o reconhecimento das áreas de risco da doença19.

O principal efeito da ocorrência da doença é comercial, pois afeta enormemente o comércio interno e, principalmente, as exportações, já que a ocorrência de foco de aftosa interfere de imediato nas vendas externas do produto. O maior impacto, por consequência, é financeiro, já que atinge a balança comercial do país e, com isso, reduz os ganhos dos frigoríficos e dos produtores. Quando a doença atinge os animais, é necessário sacrificá-los já a partir da detecção de apenas um animal infectado na propriedade.

Não tem impacto comprovado sobre a saúde humana. Segundo Pituco20, a importância da febre aftosa é ínfima para saúde pública, e o impacto ocorre apenas se for considerado o ponto de vista social e econômico, já que afeta produtores, empresários e famílias rurais, devido aos efeitos negativos sobre a produção, produtividade e rentabilidade pecuária. Assim, assume relevância frente ao impacto sobre a economia nacional de países onde o comércio exterior e a estabilidade dependem da confiabilidade dos alimentos de origem animal, mostrando a relação entre saúde pública, ambiente e bem-estar socioeconômico.

Além de prejudicar vários elos da cadeia produtiva, também afeta os consumidores e a economia regional, com prejuízos econômicos e sociais que se estendem pelo país.  Ressalte-se que a ocorrência da doença é uma ameaça à segurança alimentar de pequenos produtores, que dependem exclusivamente da pecuária.

Entre outros motivos, o Brasil conseguiu se tornar um player importantíssimo no mercado internacional de carne bovina, com o trabalho relevante que executou com vistas a garantir a ausência de febre aftosa no país. Este é apenas um ponto dos muitos que têm sido focados para garantia de manutenção de um rebanho saudável. A superação da aftosa no país pode garantir manutenção da importantíssima posição do Brasil como maior exportador no mercado mundial.

 

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1AFTOSA trava acesso aos maiores mercados. Piracicaba: Beefpoint. Disponível em: <http://www.beefpoint.com.br/cadeia-produtiva/giro-do-boi/aftosa-trava-acesso-aos-maiores-mercados/>. Acesso em: 16 maio 2016.

2MINISTÉRIO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO - MAPA.  Banco de dados. Brasília: MAPA. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/arq_editor/file/Aniamal/programa%20nacional%20sanidade%20aftosa/Perguntas%20frequentes%20-%20Febre%20aftosa.pdf>. Acesso em: 15 maio 2016.

3BRASIL. Decreto n. 24.548, de 3 de julho de 1934. Aprova o Regulamento do Serviço de Defesa Sanitária Animal. Planalto, Rio de Janeiro, 3 jul. 1934. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/D24548.htm>. Acesso em: 1 maio. 2016.

 

4Op. cit. nota 2.

 

5COORDENADORIA DE DEFESA AGROPECUÁRIA - CDA. Programa Estadual de Erradicação da Febre Aftosa. São Paulo: CDA. Disponível em: <http://www.defesa.agricultura.sp.gov.br/www/programas/index.php?action=view&cod=4&ar=1&nm=Sanidade%20Animal>. Acesso em: 15 maio 2016.

 6MINISTÉRIO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO - MAPA. Programa nacional de erradicação e prevenção da febre aftosa - PNEFA. Brasília: MAPA. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/animal/sanidade-animal/programas/febreaftosa>. Acesso em: 11 abr. 2016.

 

7CANAL RURAL. Febre aftosa: conheça o histórico da doença. São Paulo: Canal Rural. Disponível em: <http://www.canalrural.com.br/noticias/febre-aftosa/febre-aftosa-conheca-historico-doenca-7193>. Acesso em: maio 2016.

 

8ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SANIDADE ANIMAL - OIE. Banco de dados. Paris: OIE. Disponível em: <http://www.oie.int/es/quienes-somos/nuestras-misiones/>. Acesso em: 31 maio 2016.

 

9MINISTÉRIO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO - MAPA. Banco de dados. Brasília: MAPA. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/arq_editor/file/Fechamento_Vac_2%C2%AA%20etapa_2015_imprensa(18).pdf.> Acesso em: 15 maio 2016.

 

10MINISTÉRIO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO - MAPA. Portaria n. 50, de 19 maio de 1997. Brasília: MAPA. Disponível em: <http://www.adapar.pr.gov.br/arquivos/File/GSA/febre_aftosa/255_Legislacao/1997_Portaria_50_Classifica_risco.pdf>. Acesso em: 15 maio 2016.

11______. Instrução Normativa n. 44, de 2 de outubro de 2007. Brasília: MAPA. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/arq_editor/file/IN_2007_44_legislacao_atual_PNEFA.pdf>. Acesso em: 10 maio 2016.

12MAPA repassará R$ 24 milhões a 15 estados para fortalecer defesa agropecuária. Piraicaba: Beefpoint, jan. 2016. Disponível em: <http://www.beefpoint.com.br/cadeia-produtiva/giro-do-boi/mapa-repassara-r-24-milhoes-a-15-estados-para-fortalecer-defesa-agropecuaria/>. Acesso em: 15 maio 2016. 

13Op. cit. nota 12. 

14MINISTÉRIO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO - MAPA. Banco de dados. Brasília: MAPA. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/arq_editor/file/Calend%C3%A1rio%20de%20Vacina%C3%A7%C3%A3
o_mar_2016.pdf>. Acesso em: 15 maio 2016.

 

15______. Banco de dados. Brasília: MAPA. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/animal/exportacao>. Acesso em: 15 maio 2016.

 

16COORDENADORIA DE DESENVOLVIMENTO DOS AGRONEGÓCIOS - CODEAGRO. Banco de dados. São Paulo: CODEAGRO. Disponível em: <http://www.codeagro.agricultura.sp.gov.br/arquivos/camaras/atas/ata_12_11_
1999_carne_bovina585e33a9b0862f686144794a244b9c84.pdf>. Acesso em: 15 maio 2016.
 

17SP deve ser o último Estado a ser área livre de aftosa sem vacinação, diz Secretaria. Piracicaba: Beefpoint, maio 2016. Disponível em: <http://www.beefpoint.com.br/cadeia-produtiva/giro-do-boi/sp-deve-ser-ultimo-estado-a-ser-area-livre-de-aftosa-sem-vacinacaodiz-secretaria/>. Acesso em: 1 jun. 2016. 

18Op. cit. nota 17. 

19MINKE, P.; PARANHOS, T. Estado de São Paulo lança primeira etapa da vacinação contra febre aftosa 2016 na Agrishow. São Paulo: CDA, abr. 2016. Disponível em: <http://www.defesa.agricultura.sp.gov.br/www/noticias/index.php?action=integra&cod=997&title=estado-de-sao-paulo-lanca-primeira-etapa-da-vacinacao-contra-febre-aftosa-2016-na-agrishow>. Acesso em: 15 maio 2016. 

20PITUCO, E. M. A importância da febre aftosa em saúde pública. São Paulo: Instituto Biológico, out. 2005. Disponível em: < http://www.biologico.sp.gov.br/artigos_ok.php?id_artigo=17>. Acesso em: 25 maio 2016.


 

 Palavras-chave: bovinos, febre aftosa, status sanitário

Data de Publicação: 08/06/2016

Autor(es): Rosana de Oliveira Pithan e Silva (rosana.pithan@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor