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Vitimados pelo êxito
O agronegócio Cafés do
Brasil destaca-se frente às demais cadeias produtivas nacionais e
frente aos seus principais concorrentes internacionais no esforço de suprimento
mundial. Os volumes produzidos, associados à magnitude de seu mercado interno e
a liderança nas exportações mundiais, o fazem sobressair como componente da
matriz econômica brasileira. A liderança tecnológica que o país exerce ao longo
das distintas etapas que compõem sua cadeia produtiva confere tenacidade
competitiva de custos e qualidade sem rival no horizonte. Tal desempenho técnico/produtivo e econômico do
agronegócio Cafés do Brasil pode ser confrontado com recentes projeções de
consumo (Figura 1), que estimam cenários bastante favoráveis aos cafeicultores
brasileiros (pois em todas as situações a demanda cresce) e, por consequência,
para os demais agentes: torrefadores, solubilizadores, exportadores/traders, varejo e governo (via
impostos). O provável cenário estima crescimento da demanda
mundial em 2,0% a.a., o que elevaria o suprimento global para o patamar das
164,8 milhões de sacas, ou seja, pouco mais de 27 milhões de sacas frente ao
consumo contabilizado pela Organização Internacional do Café (OIC) em 2012. A média das duas últimas safras de café do Brasil
(arábica e conilon), estimadas pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB)1,
alcançou a produção de 50 milhões de sacas2. Considerando que o país
tem participado com aproximadamente um terço da oferta global do produto, essa
quantidade não se encontra muito distante da necessária contribuição brasileira
para a concretização dos cenários pessimista e provável, isso no transcurso da
safra 2013/14 distante, portanto, cinco safras ainda do ponto futuro em
evidência (2020) (Tabela 1).
O status quo
atual da oferta brasileira (arábica e robusta – mercados interno e externo) não
atenderia o suprimento global estimado somente para as condições de ampliação,
ainda que marginalmente, de sua parcela de mercado (salto para 35% de demanda)
ou no cenário mais otimista (crescimento de 2,5% a.a.) em que a oferta teria
que alcançar 55,10 milhões de sacas.
Todavia, antever um cenário em que a oferta
brasileira se amplie bastante parece bastante plausível. Considerando a trajetória
da produção de arábica desde a safra 2003/04 até a última estimativa de
2013/14, constata-se que há ajuste ascendente para a quantidade colhida,
reflexo do incremento da produtividade, uma vez que não se tem observado
expansão da área cultivada (Figura 2). A evolução da produção de conilon, no mesmo
período considerado, também exibe ajuste positivo para a linha de tendência,
com inclinação ainda mais acentuada do que a observada no caso do arábica
(Figura 3). O incremento da produção, liderado pela produtividade
física das lavouras, constitui-se no principal resultado do processo de mudança
da base tecnológica em curso na cafeicultura brasileira. Possuindo naturezas
diversas (novas variedades, clones, podas, adensamento, irrigação, mecanização,
etc.), tais inovações convergem no sentido de auferir maior rendimento por
unidade de área3.
As inovações agronômicas aplicadas à cultura têm
permitido expressivos ganhos de produtividade, e ocorreram sob situação de
mercado pouco favorável aos cafeicultores, excetuando-se, a safra 2011/12, em
que as cotações para os arábicas finos ultrapassaram os R$500,00/sc. Em todo o
restante do período analisado, os preços recebidos estiveram colados aos custos
de produção para aqueles com produtividades acima das médias de cada tipo
(arábica e conilon).
Assim, há evidência estatística atestando elevação
da oferta com relativa independência das cotações de mercado4.
Portanto, não há por que crer que possamos ter quedas acentuadas na oferta, mas
ao contrário, manutenção dessa linha de crescimento Aparentemente, os cenários traçados pela OIC para a demanda pelo produto
associado à histórica participação brasileira no suprimento global (cerca de
1/3 do total demandado), já se encontram atingidos na corrente safra e
possivelmente mais ainda nas vindouras.
A superação brasileira das metas produtivas,
conquista ímpar na cena cafeeira internacional, ocorreu tanto na quantidade
produzida quanto na qualidade final da bebida (lavados, descascados e
excelentes naturais)5 e traz consigo relativo clima de ausência de
expectativas para os investidores (industriais, traders, especuladores - nacionais e internacionais).
Provavelmente, um clima morno para as expectativas é o pior dos mundos para a
formação de preços das commodities,
pois reduz a liquidez disponível nesse mercado, aprofundando, eventualmente,
ainda mais as persistentes baixas das cotações.
A luz do que se expôs, não há exagero em se
concluir que a formação futura dos preços para os Cafés do Brasil não deverá
ser favorável aos cafeicultores. Sem que entre nossos principais competidores
(Vietnã, Indonésia, Colômbia e centro americanos), ou até mesmo dentro dos
principais cinturões do país, ocorram substanciais perdas (decorrentes de
distúrbios climáticos, incidência de pragas e doenças, abandono das lavouras em
razão da baixa remuneração pelo produto), e prevalecerá o cenário de que no mercado
de café não há espaço para a acumulação de riquezas. Como resultado final dessa
dinâmica, ter-se-á a vitimização pelo próprio êxito6.
___________________________________________________ 1COMPANHIA
NACIONAL DE ABASTECIMENTO - CONAB. Acompanhamento
da Safra Brasileira - Café. São Paulo: CONAB, maio 2013. 20 p. (Segunda
Estimativa). 2A média das
estimativas das duas últimas safras brasileiras de café projetadas pelo USDA
alcançam as 52,3 milhões de sacas, conforme relatório. GLOBAL AGRICULTURAL
INFORMATION NETWORK – GAIN Report. Coffe
Anual. Disponível em:
<http://gain.fas.usda.gov/Recent%20GAIN%20Publications/Coffee%20Annual_
Sao%20Paulo%20ATO_Brazil_5-13-2013.pdf>.
Acesso em: jun. 2013. 3Do ponto de
vista econômico, seria uma aberração teórica defender a tese de que produção
não reage aos preços. O que se discute aqui é que sob as baixas cotações ocorra
diminuição no ritmo de crescimento da produção, comparativamente, às situações
em que as cotações estejam favoráveis aos cafeicultores. 4A manutenção
e/ou ligeira redução da área cultivada contribui para o incremento da
produtividade, na medida em que exclui das médias os talhões de menor
rendimento. 5As baixas
cotações afetam primeiramente o interesse na produção de qualidade, pois com
custos mais elevados e prêmios em baixa, o desestímulo para manutenção dessa
estratégia é ainda maior. 6Essa discussão
continua no artigo que será lançado a seguir, que tem por título: “Exortação à
qualidade”.
Palavras-chave:
mercado
de café, produtividade na cafeicultura, cotações.
Data de Publicação: 24/06/2013
Autor(es):
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Eduardo Heron Santos Consulte outros textos deste autor