Café Torrado E Moído: Dá Para Competir?

            O café foi por muitos anos o principal produto de exportação brasileiro, chegando a representar mais de 80% da pauta de divisas do País. Hoje a proporção é muito pequena por conta da grande diversificação de itens exportados.
            Contudo, o café, desde que se firmou no mercado externo, há mais de um século e meio quase sempre foi vendido como commodity (café verde ou em grão). Só em 1965 foram iniciadas as exportações de café solúvel.
            Recentemente, alguns cafés de qualidade comprovada têm sido negociados como produtos diferenciados e obtido elevadas cotações lá fora. Cabe frisar que, na maioria das vezes, são vendidos com a marca do importador. A exportação (direta) de café torrado e moído ainda é incipiente, mas já se faz presente na pauta de divisas.
            Um aspecto interessante a ressaltar é o de que o café brasileiro de melhor qualidade sempre teve o mercado externo como destino, de acordo com a política governamental vigente até 1990 quando ainda existia o Instituto Brasileiro do Café (IBC).
            O mercado interno era normalmente abastecido com tipos de pior qualidade, e não havia diferenciação de preços. Muito pelo contrário, o produto tinha seu preço controlado por força da elevada inflação vigente. Hoje, graças à abertura comercial tem havido o ingresso de empresas internacionais, algumas de grande porte, atuando no mercado interno, exclusivamente.
            Neste ponto, destaca-se a importância deste mercado, o segundo do mundo, superado apenas pelos Estados Unidos.
            O que tem ocorrido atualmente é uma guerra de preços, decorrente das sucessivas safras superavitárias, diante de um consumo que cresce a taxas insignificantes.
            O cenário que se apresenta, portanto, não é dos mais animadores. O que fazer então?
            Na condição de produtor líder mundial de café, o Brasil possui um amplo parque industrial para torrefação e moagem de café, caracterizado por grande número de pequenas empresas e elevada concentração da produção em poucas indústrias de maior porte.
            Com a extinção do IBC, muitas empresas foram desativadas pois naquela época cada indústria tinha sua quota estabelecida pela autarquia federal. Muitas vezes a indústria (pequena) transferia sua parte para uma maior, deixando de produzir, embora aparentemente o estivesse fazendo.
            Mesmo assim, até por uma questão cultural, o número de indústrias ainda é grande – ao redor de 1500, contra 300 por exemplo na Itália, pois cada município, em regiões cafeeiras, tinha sua torrefadora. Em 1966, havia mais de 2.800 empresas, segundo o IBC.
            Hoje, o mercado interno ainda é abastecido preponderantemente por café de baixa qualidade (o selo de pureza da ABIC não assegura qualidade), embora já existam cafés especiais de toda a sorte dirigidos às classes mais favorecidas – gourmet, orgânico, de origem controlada, etc.
            O parque moageiro (aqui entende-se torrefação, moagem e empacotamento) tem à sua retaguarda uma indústria de bens de capital bastante evoluída, podendo ser comparada às melhores do mundo. Neste sentido, isto pode ser confirmado com a recente associação de uma das melhores empresas do mundo com uma congênere brasileira, aqui tida como de tecnologia de ponta.
            No segmento de torrefação e moagem, da cadeia produtiva do café propriamente dita, as unidades caracterizam-se como empresas familiares, sem grande preocupação com o planejamento, com os avanços tecnológicos e gerenciais e mesmo impossibilitadas de concorrer em um mercado altamente competitivo. Sua atuação é apenas local e quando muito regionalmente restrita.
            Por tradição, essas empresas apenas vendem o café sem grande preocupação com a qualidade, com a conquista de nossos mercados e com a diferenciação de produtos. Por outro lado, as empresas de médio e grande porte buscam qualidade, nichos de mercado para produtos diferenciados e possíveis avanços na participação de mercado (market-share).
            O que não tem permitido maior competitividade, têm sido os preços baixos vigentes nos últimos anos; o elevado custo para aquisição de equipamentos de alta tecnologia; e a dificuldade de 'ganhar' mercados setoriais por força de barreiras das mais diversas ordens.
            As empresas de capital externo teriam maiores condições, mas a 'reserva' de mercado de outras filiais localizadas em pontos geográficos estratégicos obsta quaisquer iniciativas.
            Neste sentido, o mercado doméstico apresenta-se ainda como solução para a colocação de produtos de qualidade comprovada, o que já vem ocorrendo em ritmo relativamente acelerado.
            A factibilidade de embarques externos de expressão de café torrado e moído necessita de uma estratégia, envolvendo marketing, oportunidade, amplo apoio governamental e a participação de todos os segmentos da cadeia produtiva.
            A pesquisa 'Processamento de Café Torrado e Moído', conduzida no âmbito do Instituto de Economia Agrícola (IEA) por designação do Consórcio Café/EMBRAPA, com o apoio de ABIC, FUNDEPAG e Câmara Setorial do Café, assim como do Sindicato da Indústria de Café do Estado de São Paulo, poderá brevemente fornecer elementos adicionais, sobretudo aspectos relativos à tecnologia para responder ao desafio: café torrado e moído, dá para competir?
            Em mercados novos onde a atuação de grandes corporações é inexpressiva, há possibilidade de maiores avanços. São os casos do Oriente Médio, da Europa Oriental e de alguns países da Ásia, a China em especial que hoje está inserida no rol da Organização Mundial do Comércio (OMC).

 

Data de Publicação: 04/12/2001

Autor(es): Sebastião Nogueira Junior (senior@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Luiz Moricochi (moricochi@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor