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Afinal, Quando O Café Do Brasil Vai Ser Reconhecido Lá Fora?(1)
Artigo
do historiador/brasilianista Matthew Shirts (OESP, 24 de junho de 2002) faz
referência à nova moda dos jovens nos Estados Unidos- tomar café gelado!
A gigante Starbucks tem hoje 5.500 lojas em mais de 20 países e comercializa
bebidas geladas à base de café que se constituem no carro-chefe do negócio, café
expresso e café torrado/moído. O consumo per capta de café nos Estados Unidos
tem caído acentuadamente frente a outras bebidas: enquanto o de refrigerante
aumentou 133% , o de café diminuiu 53% no período 1970-2000.
Em Orlando, por exemplo, existem pelo menos 3 lojas - bonitas, cleans e agradáveis, mas sem ostentação e que po uco lembram os 'cafés italianos' como os de Buenos Aires, famosos pelo ambiente nostálgico e romântico. Considerada a McDonald’s do café, seu sucesso pode ser medido pelos preços de seus produtos: o cafezinho expresso custa US$ 1,45 e o doppio expresso US$ 1,75. Isto significa, para efeito de comparação com o Brasil, valores entre R$ 4,35 e R$ 5,25 ao câmbio atual. O café expresso verde-amarelo custa de R$ 0,80 a R$ 1,00 e, quando muito, R$ 2,00 em restaurantes famosos que servem o café tipo gourmet considerado de alta qualidade.
Lá nos States as bebidas à base de café são, principalmente servidas geladas em lojas especializadas e comportam misturas das mais diversas, com destaque para o frappuccino (frapé de cappuccino) de diversos sabores: baunilha, côco, amêndoa entre outros, vendidos à base de U$ 2,80 a U$ 3,00. Além disso, as lojas dispõem de sorvetes, tortas e pudins – todos à base de café – bem como xícaras, livros, máquinas e outras utilidades domésticas relacionadas ao grão. Quanto aos cafés torrado e moído, os preços de venda nas cafeterias são elevados para os nossos padrões, variando entre US$9,20 à US$12,60/libra peso, ou seja, por 453 gramas. Ao câmbio atual e feitas as conversões, correspondem aos valores de R$ 60,92 a R$ 83,44 por quilo! No Brasil os cafés populares são vendidos em supermercados e padarias por menos de R$ 4,00 o quilo. Tipos melhores podem variar entre R$ 8,00 e R$ 10,00/kg, enquanto os tipos gourmet (finos) ficam entre R$ 20,00 e R$
30,00/kg.
As margens de comercialização nos Estados Unidos são altas, mesmo considerando o
preço (baixo) da matéria-prima no exterior, o transporte, o preparo e a
distribuição. Isto é uma tendência histórica que decorre, aparentemente do poder
de impor preços, fruto da elevada concentração da industrialização, aliás
situação que ocorre com freqüência nos ramos alimentícios daquele país. Depois
de anos de estagnação e declínio , o consumo do produto vem desde 1994 mostrando
sinais de recuperação, atingindo o pico em 2001. Isto deve-se ao aumento de
tomadores e do número de xícaras consumidas. Contudo o crescimento tem sido
verificado no segmento de cafés especiais, graças às campanhas publicitárias com
apelos de satisfação e bem-estar .(Fonte: International Coffee Report de
10/07/02). Na mesma matéria, há referências de aumento de compras de café verde
pelos americanos principalmente de arábicas do Brasil graças aos preços mais
baratos (cheapers). Cabe lembrar que em 2001 o Brasil foi o segundo fornecedor
daquele país, superado apenas pelo Vietnam , maior produtor de café robusta do
Mundo.
Um fato a ser destacado é que nas lojas Starbucks há referências da origem,
qualidade e outras características sobre os tipos oferecidos, sejam do Panamá,
da Indonésia (Sumatra), da Colômbia, da Etiópia, da Costa Ric
a. O café brasileiro faz parte dos arábicas mas sem citação da origem. Sabe-se
da existência de poucos fornecedores nacionais entre os que abastecem a rede
americana. Este é o ponto que não pode ser desprezado. Na condição de maior
produtor mundial e com tipos de excelente qualidade, não estaria na hora do
Brasil acordar e se posicionar ?
Há informações de que o Governo brasileiro tem intenção de criar redes de cafés
nos moldes da Starbucks para conquistar o mercado chinês. A idéia é louvável mas
parece interessante que os produtores de café conquistem também o mercado
americano, com produto de valor agregado (tipos finos) a exemplo do vem sendo
feito pela Associação Brasileira de Cafés Especiais em alguns lugares do mundo.
Só o esforço governamental não parece ser suficiente: toda a cadeia produtiva tem que agir agressivamente mostrando a nossa competência em termos de preço-qualidade, sem o que o Brasil vai continuar como exportador de commodities como nos tempos coloniais. O ideal seria
vender café torrado e/ou moído, mas aí a situação é mais complicada. Como se
sabe o país tem produtos de excelente qualidade - dentre os quais está o café -
mas que são embarcados sem agregar valor, por conta do ainda tradicional modelo
primário-exportador.
Difícil é responder à pergunta: por que a Starbucks (ainda) não veio para o
Brasil?
Com base nos números apresentados parece que a questão está nos preços, pois não
há como impor níveis elevados em um país onde a matéria-prima é barata e
abundante, o produto tem amplo consumo popular e a renda per capta é muito
baixa. Sobram, portanto, nichos significativos para consumo de produtos de
elevada elasticidade-renda, lembrando que acima de tudo a multinacional
americana vende serviços, 'mercadoria' muito valiosa nos tempos atuais.
Aguardemos...
1 Artigo publicado no Suplemento Agrícola de O
Estado de S. Paulo, 25/09/2002
Data de Publicação: 01/09/2002
Autor(es): Sebastião Nogueira Junior (senior@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor