Artigos
Café: fortes instabilidades no mercado
Em
março, manteve-se nos diferentes mercados internacionais a tendência de queda no
preço do café, que vem se manifestando desde novembro de 2002. No mercado de
Nova Iorque, o preço do arábica (Contrato C, segunda posição) recuou 8,97% na
posição de maio. No mercado de café robusta da Bolsa de Londres, a queda de
preço chegou a 10,94% e, para o café arábica na BM&F, a redução atingiu
11,06%, enquanto, para o preço composto diário da OIC, a redução foi de 8,29%
(gráfico 1). Gráfico 1 - Cotações médias mensais do café em diferentes
mercados de futuros, 2001 a 2003
Fonte: Gazeta Mercantil
Esse
comportamento das cotações continua contradizendo todos os fundamentos de
mercado, que indicam um cenário de produção de cerca de 6 milhões de sacas
inferior à demanda para o ano-safra de 2003/04, o primeiro nos últimos cinco
anos, e a manutenção dos estoques dos países consumidores, os quais deverão
reduzir-se no futuro próximo. Um dos fatores que têm influenciado o mercado do
café, bem como o de outras commodities, é a ocorrência da guerra no Iraque, que
induz os fundos para vendas de suas posições no mercado de café na Bolsa de Nova
Iorque. Esta situação apresentou ligeira mudança na primeira semana de abril,
recuperando em parte as cotações do produto nos diferentes mercados.
Os cafeicultores brasileiros também estão enfrentando uma valorização do real em
relação ao dólar de 6,27% no mês de março, além da queda no preço de seu produto
no mercado internacional (da ordem de 10%). Esses dois fenômenos juntos afetam
os negócios, pois os produtores estão recebendo menos reais por saca exportada,
dificultando as transações com os exportadores.
No mercado interno, os preços médios recebidos pelos produtores em março
apresentaram queda de 8,76%, em função da menor taxa de reais por dólar e da
diminuição das cotações no mercado internacional (gráfico 2).
Todavia, mesmo reconhecendo a queda momentânea das cotações de café em mercados
de futuros nos últimos 12 meses, verifica-se alta acumulada menos expressiva
para o arábica, de apenas 3,35% e 2,87% respectivamente na BM&F e na bolsa
de Nova Iorque, e para o robusta, de 35,70% na bolsa de Londres.
Gráfico 2- Preços médios mensais recebidos pelos produtores de café no Estado de São Paulo, período de 2000 a 2003
Fonte: Instituto de Economia Agrícola.
De
igual maneira, ao avaliar a trajetória dos preços de café recebidos pelos
produtores nos últimos 12 meses, verifica-se crescimento de 48%. Nessas
condições, os produtores, tanto na venda de seus estoques quanto na
comercialização da safra futura, deverão acompanhar as flutuações dos preços
futuros, observando os mercados internacionais, de maneira a melhorar suas
estratégias de comercialização.
No Brasil, a valorização do real e a menor oferta do produto (final da
entressafra) encareceram o café. Por outro lado, caso ocorram os leilões de
opção para entrega em setembro a R$ 220,00 a saca do café arábica, as cotações
do produto brasileiro poderão apresentar expressiva elevação. Nessas condições e
ao continuar a valorização do real, o produto brasileiro poderia perder
competitividade no mercado internacional (frente ao de nossos principais
concorrentes), recuperando-a somente se ocorresse uma valorização das cotações
internacionais da ordem de 20%. Caso não se verifiquem tais condições, pode-se
esperar um menor volume de exportações nos próximos meses.
Mudanças na política de crédito
Em reunião no dia 27 de fevereiro último, o Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovou a elevação da taxa de juros cobrada nos financiamentos para a colheita com recursos do FUNCAFÉ. Em síntese, as alterações foram as seguintes:
a) Foram elevados os juros para 13% ao ano (anteriormente praticava-se 9,75% a.a.), sob o argumento de que a elevação na taxa Selic implicava em maior desembolso por parte do Tesouro de recursos para equalização dos financiamentos; assim, os juros da política setorial deveriam também acompanhar esse aumento;
b) foram liberados R$ 250 milhões para financiamento, com possibilidade de alcançar R$ 300 milhões;
c) foi estipulado limite de financiamento de R$ 100 mil por cafeicultor, tendo por base de cálculo 90% do valor da saca de café ofertada em garantia (média de preços do Cepea);
d) foi fixado prazo até o dia 10 do mês subseqüente ao do vencimento do contrato para a quitação dos empréstimos.
Do
ponto de vista macroeconômico, as decisões relativas à majoração dos juros dos
empréstimos do FUNCAFE revelam-se pouco consistentes. Declarações das
autoridades monetárias do atual governo têm procurado enfatizar que as recentes
elevações na taxa Selic são provisórias diante do contexto de incerteza global
(andamento da guerra; débil recuperação nos ativos financeiros e patrimoniais;
malversação de peças contáveis de relevantes conglomerados empresariais globais;
e ligeiro arrefecimento da desconfiança internacional quanto às orientações
políticas do governo brasileiro).
Se o aumento da Selic responde a uma lógica econômica de curto prazo, qual
seria, então, a racionalidade da elevação para 13% ao ano nas taxas cobradas
pelo financiamento? Melhor colocando, onde estaria a racionalidade da elevação
dos juros fixos dos contratos, sem que se adicionem cláusulas a essa medida que
permitam a revisão dessas taxas assim que o momento econômico autorize os
gestores da política monetária a reavaliarem para baixo a Selic? Embora exista a
promessa de revisão da taxa, tal questão deveria ser previamente discutida e
ajustada diante da justificada mudança, garantindo-se tal benefício desde antes
da contratação dos empréstimos.
Se é certo que o governo pretendia com essas mudanças reduzir as despesas com
equalização financeira dos créditos concedidos, deveria considerar na mesma
balança a participação do café na geração de saldo cambial (próximo dos US$ 1,8
bilhão). Ademais, a cafeicultura é, entre as atividades da agropecuária, uma das
que mais geram postos de trabalho no meio rural, sobretudo na época da colheita
(maio a agosto). Daí merecer, por conta dessa característica, o apoio das
políticas públicas governamentais.
Data de Publicação: 11/04/2003
Autor(es):
Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor