Artigos
Governo Federal Retorna À Política De Compra De Café
Política cafeeira – comentários sobre as mudanças na
política setorial Após
reunião, no início de julho de 2002, das lideranças do Conselho Nacional do Café
(CNC) com o presidente da República, acompanhadas do ministro da Agricultura e
de deputados federais vinculados à cafeicultura, foi aprovado um conjunto de
decisões, que muda a política setorial até então em execução. Na verdade, em
maio de 2000, pressionado por algumas lideranças, o governo lançou o frustrado
programa de retenção das exportações, gerando prejuízos estimados em mais de US$
400 milhões para o agronegócio brasileiro. Resultado brasileiro do comércio internacional de café
As
exportações brasileiras de café caíram 23,66% em 2002, em função dos preços
baixos para os produtos exportados, acompanhando assim a tendência de queda nas
exportações do agronegócio brasileiro (-13,3%). Na comparação entre os primeiros
semestres de 2001 e 2002, observa-se crescimento de 13,04% no volume embarcado
de café, enquanto as receitas diminuíram 23,66% no mesmo período. Contrariando
esse panorama geral, têm-se os casos do conillon e do café torrado. No primeiro
caso, observa-se forte crescimento na receita cambial (418,82%) e no volume
embarcado (668,41%). A surpresa fica para os embarques de café torrado (e/ou
moído), com incremento de mais de 2.000% nas receitas cambiais e de 3.381,63% no
volume (mais de 36.760 sacas) no primeiro semestre de 2002 (tabela1). TABELA 1 – Receita cambial e volume das exportações de café
(conillon, arábica, torrado e solúvel), Brasil, primeiro semestre de 2001 e
2002. % % A
diminuição dos embarques de países concorrentes no mercado de robusta (Vietnã e
Indonésia principalmente) permitiu que o Brasil ampliasse suas entregas nesse
mercado. Sem dúvida, também contribuíram o grande volume de nossa safra dessa
espécie e a depreciação cambial ocorrida ao longo do primeiro semestre de 2002.
Superado o equívoco da retenção, sucede-se uma forte expansão da oferta do
produto resultante dos enormes investimentos em plantio e modernização do setor,
ocorridos no período de 1994 a 1999, associada ao crescimento dos estoques do
café em mãos dos países importadores. Inicia-se, assim, forte pressão do setor
visando contornar a crise enfrentada via renegociação das dívidas e novos
créditos para colheita e estocagem, amparadas em novas intervenções
governamentais no mercado do produto.
Inicialmente, o governo propôs recursos para a pré-comercialização, que poderiam
ser transformados em crédito de estocagem e novos créditos para estocagem por
até 180 dias, com o objetivo de retirar no curto prazo do mercado cerca de 6
milhões de sacas. Essas propostas enfrentaram várias dificuldades para ser
implementadas, referentes à garantia do financiamento e da armazenagem em
depósitos de terceiros, que avalizassem o crédito do agente financeiro.
No final de julho de 2002, o governo federal decidiu pelo alongamento da dívida
por 12 anos dos financiamentos efetuados a partir de 23 de junho de 2001. Do
total de R$ 70 milhões de financiamento tomados pelos produtores, R$ 30 milhões
foram liberados antes dessa data, beneficiados pelo alongamento da dívida
negociada em outubro de 2001. Assim, os R$ 40 milhões tomados após 23/06/2001
não tinham sido beneficiados com o alongamento das dívidas, o que passa a
ocorrer agora, dando isonomia no tratamento dos créditos desses produtores.
Todavia, nos momentos de crise, os produtores não se esquecem da antiga política
promovida pelo extinto Instituto Brasileiro do Café (IBC), que regulamentava
todo o setor, comprava o produto, administrava cotas de exportação e emitia
diferentes tipos de certificados comerciais e financeiros. Assim, no pico da
colheita da safra atual e sem perspectiva de recuperação nas cotações
internacionais a curto prazo, mesmo que beneficiado por uma desvalorização do
real da ordem de 48% acumulada até o final de julho, o setor voltou a exercer
forte pressão para que o governo implementasse alguma forma de intervenção no
mercado do físico de café, com o objetivo de aliviar a oferta crescente para os
exportadores, o que manteria a tendência de preços baixos. Associado a isto
vieram se somar as reivindicações dos exportadores afetados pela crise
internacional de credibilidade e pela redução dos financiamentos às exportações.
Neste cenário, as autoridades brasileiras acabaram decidindo por implementar o
mercado de opções para o café, com a finalidade de estimular a recuperação dos
preços nos próximos sete meses. Assim, decidiu-se pelo lançamento de contratos
de opção de venda de café, safra 2001/02, por intermédio da Companhia Nacional
de Abastecimento (CONAB). Anunciou-se que os recursos destinados a essa operação
atingiriam o montante de R$765 milhões, suficiente para a aquisição de
aproximadamente 6 milhões de sacas. E fixaram-se os preços mínimos para arábica
e robusta, respectivamente de R$ 130,00 e R$ 77,00 para vencimento em dezembro,
e de R$ 135,00 e 80,00 para março. Caso tais patamares de preços não sejam
alcançados, o produto seria entregue à CONAB, em concordância com o preço de
opção a vencer nos meses de dezembro de 2002 e março de 2003.
O mercado de opções é um mecanismo financeiro moderno e eficiente de
comercialização de produtos agropecuários, permitindo razoável segurança ao
produtor sobre a rentabilidade que poderá obter, pois trata-se de uma garantia
de preço. Tal mecanismo deve de fato ser incentivado e melhor difundido junto
aos produtores. Todavia, concomitantemente ao incentivo de maior uso desse
contrato financeiro para o café, o governo deveria estabelecer também as regras
para a desova desse estoque formado (consultando sempre os interesses maiores da
sociedade em geral), caso seja obrigado a receber o produto na situação em que o
mercado sinalize preços inferiores aos estabelecidos como mínimos para o
fechamento dos contratos de opção.
A política de leilões de contratos de opção de venda torna-se contraditória e
competidora com a política de estocagem voluntária. Algum cafeicultor vai
estocar voluntariamente, correndo risco de não assistir a uma prevista subida
dos preços quando o governo já oferece R$ 130,00 e R$ 77,00 para dezembro de
2002?
A segunda política divulgada estabelece que os exportadores terão linha de
crédito de R$ 320 milhões (R$ 150 milhões já disponibilizados pelo FUNCAFÉ) para
a formalização de Adiantamento de Contratos de Crédito (ACCs). De fato, com a
crise internacional (escândalos contábeis nos EUA, vultosas perdas dos bancos na
Argentina e desconfiança internacional quanto à solidez da economia brasileira),
fecharam-se as linhas de crédito facilitadoras das exportações. A aguda falta de
liquidez poderá constranger as exportações de café, derrubando os preços no
mercado interno e agravando a crise por que passam os cafeicultores.
Sem dúvida, é medida necessária e inteligente. Porém, trata-se de empréstimos
subsidiados, uma vez que, com taxa de 9,5% ao ano para esse crédito (as linhas
existentes no mercado estão entre 25% e 26%), embute-se um subsídio enorme para
os nada empobrecidos exportadores de café.
Para viabilizar o mercado de opções aos produtores de café, o governo federal
incluiu esse produto na Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM). Isto
ocorreu através do decreto n.º 4.325, de 08/08/2002. Com isso, o produtor terá
acesso a operações de AGF para a colheita e EGF para a comercialização, com base
nos seguintes preços mínimos: R$ 113,00 por saca de 60 kg para o café arábica,
tipo 6, e R$ 64,00 para o café conillon, tipo 6.
Em prosseguimento às decisões governamentais, a CONAB fará, em 21/08/2002, o
primeiro leilão de venda de contrato de opções de café. O volume ofertado será
de 1,280 milhão de sacas, das quais 280 mil sacas (do tipo robusta) separadas em
2,8 mil contratos e o restante (1 milhão de sacas do tipo arábica) em 10 mil
contratos (cada contrato possui 100 sacas). Na prática, os produtores vão
comprar o direito de vender para o governo os cafés arábica e robusta,
respectivamente a R$ 130,00 e a R$ 77,00 por saca, com datas de vencimento que
estão marcadas para dezembro, e a R$ 135,00 e R$ 80,00 por saca, com vencimento
em março de 2003. Os produtores que participarem do leilão terão de pagar um
prêmio mínimo de 0,50% sobre o preço de exercício, sendo que o leilão está
limitado a 10 contratos por produtor. Já estão agendados os próximos leilões
para 28 de agosto e 04, 11, 18 e 27 de setembro.
Vale destacar que o incentivo à maior utilização dos contratos de opção com a
finalidade de modernizar a comercialização de produtos agropecuários é algo
imprescindível e, portanto, bem vindo. Porém, nesse caso específico, aparece o
outro lado da intervenção que é a eliminação do risco da atividade,
transferindo-o para o governo, pois os preços estão garantidos (ainda que possam
ser bastante menores aos anunciados em decorrência da prática do leilão sobre os
prêmios). Outra dificuldade adicional consiste na abertura do pleito de política
similar para outras atividades perenes e semiperenes (como a laranja e a
seringueira e até mesmo o boi gordo). Diferentemente das culturas anuais, em que
os ajustes entre oferta e demanda ocorrem em períodos curtos (em geral de uma
única safra), nas perenes isso pode levar de quatro a cinco anos, tornando
extremamente complexa a implementação de uma política de incentivo à utilização
dos contratos de opção.
Portanto, estamos iniciando a maior mudança na política brasileira do café desde
1989, cujos resultados e conseqüências deverão ser avaliados nos próximos 12
meses, para se ter clareza sobre os benefícios privados e públicos, bem como os
custos sociais de tal política.
Fonte: Conselho dos Exportadores de Café Verde do Brasil,
2002. Tipo Conillon Arábica Torrado Subtotal Solúvel Total
No mercado de café solúvel, as exportações praticamente mantiveram-se estáveis
em volume, mas a redução nas receitas foi de 25,01%, indicando que as cotações
do café solúvel caíram mais que o dobro das do café em grão.
Estatísticas preliminares de julho de 2002 indicam um volume exportado de 2,2
milhões de sacas, desde que adicionado a esse resultado, os embarques de café
solúvel (média de 200 mil sacas/mês). Mantida a tendência de exportações dos
últimos meses, o Brasil poderá atingir o volume total de exportação de café de
27 milhões de sacas, conquistando uma participação de 32% do mercado
internacional do café, contra uma participação média de 20% nos anos noventa.
Data de Publicação: 14/08/2002
Autor(es):
Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor
Luiz Moricochi (moricochi@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor