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Café: Em 2000 Cresceu A Oferta E Os Preços Diminuíram(1)
O ano de 2000 vai ser lembrado
pelos cafeicultores brasileiros como aquele em que a oferta mundial cresceu mais
rapidamente que a demanda, mesmo com as elevadas taxas de crescimento do consumo
dos cafés especiais no mercado internacional. Como conseqüência do excesso de
oferta, principalmente de café robusta, verificou-se, por um lado, o aumento dos
estoques dos países consumidores. Por exemplo, no ano de 1998 os estoques de
café verde nos EUA foram, mensalmente, inferiores a 10% do consumo anual,
enquanto que em 1999 já cresceram para o patamar de 16% e em 2000 para 33%. Esse
fenômeno gerou maior poder de barganha para os principais países importadores.
Por outro lado, a necessidade de vários países em exportar o máximo possível
antes de iniciar as suas retenções, de acordo com o programa da Associação dos
Países Produtores de Café (APPC), terminou por criar um excedente de produto no
mercado, que acelerou a queda de preços, principalmente no segundo semestre de
2000 (Figura 1 e 2).
Figura 1 – Cotação da 2ª Posição, Contrato C, Café Arábica, Bolsa de Nova Iorque, 1999 e 2000.
Fonte: Elaborada a partir de dados básicos da Gazeta Mercantil, 1999 e 2000.
Figura 2 – Cotação da 2ª Posição, Café Robusta, Londres, 1999 e 2000
Fonte: Elaborada a partir de dados básicos da Gazeta Mercantil, 1999 e 2000.
Assim, para um preço médio do
café arábica no mercado de Nova Iorque em 1999 de US$139,92 a saca de 60kg,
houve queda em 2000 de 12,36%, para US$122,62/sc. No caso do café robusta, no
mercado de Londres, a queda foi mais intensa (38,48%), de uma média de
US$85,39/sc. de 60kg em 1999 para R$52,53/sc. em 2000. Chamou a atenção no
mercado desses dois tipos de café a queda contínua de preços ao longo do ano. De
janeiro a dezembro de 2000, observaram-se quedas de 46,35% e de 51,02% para
arábica e robusta respectivamente.
A perspectiva
para 2001 é de continuação do aumento de excedente no mercado internacional
(veja as análises de oferta e demanda de café), o que deverá refletir em preços
médios inferiores aos observados no ano anterior. Os esforços de regularização
da oferta, dificilmente terão condições de concretizar-se através do controle no
fluxo de produto ao mercado, pela política de retenção da APPC. A crise deverá
se aprofundar até que, (a) pela saída de cafeicultores do setor, devido ao
acúmulo de prejuízos decorrentes dos baixos preços; (b) pela redução do
tratamento das culturas, com redução de produtividade; ou ainda (c) pela
ocorrência de distúrbios climáticos como secas, geadas (caso do Brasil) e
excesso de chuvas (caso dos asiáticos), se promova uma forte redução de oferta
sinalizando aos mercados a tendência futura de uma demanda maior que a oferta.
Assim, percebe-se que neste novo ano as perspectivas não são nada animadoras
para o setor, principalmente para os produtores agrícolas. Os mesmos fatores
baixistas de 2000 persistirão em 2001, o que deve pressionar as cotações
internacionais do produto.
Mercado Interno
O mercado interno refletiu as condições vigentes do mercado internacional. Medidas como a do programa de retenção, que vem sendo executado pelo Brasil, não surtiram nenhum efeito até o momento. Mesmo a reação esperada para o último trimestre do ano, quando o País é praticamente o único ofertante no mercado internacional, não aconteceu e os preços permaneceram em queda contínua (Figura 3)
Figura 3 - Preço Recebido pelos Cafeicultores no Estado de São Paulo, 1999 e 2000
Fonte: Elaborada a partir de dados básicos do Instituto de Economia Agrícola, 1999 e 2000.
Verifica-se que em 2000 a
queda nos preços recebidos pelos cafeicultores de arábica no Estado de São
Paulo, em dólares por saca de 60kg, foi contínua desde janeiro, atingindo uma
redução de 44,89% nos doze meses do ano. Apesar disso, comparando-se o preço
médio de 1999, de US$97,94/sc. de 60kg, com o de 2000, que atingiu US$90,13/sc.
de 60kg, observa-se que a redução foi de apenas 7,97%, inferior à redução
verificada no mercado de Nova Iorque. Mas o que chama atenção é a constância de
queda nos preços - com tendência a continuar no ano de 2001 - que no segundo
semestre de 2000 atingiram apenas US$74,69/sc. de 60kg.
No mês de
dezembro de 2000, o preço médio recebido pelos cafeicultores paulistas para o
café arábica foi de US$64,72/sc. de 60kg, o que correspondia a apenas metade no
mesmo mês de 1999.
Assim, é
necessário considerar que o plano internacional de retenção de café, iniciado em
junho pelo Brasil, além de não conseguir alcançar seu objetivo, que era de
elevar os preços, trouxe efeito desastroso ao País. Enquanto os brasileiros
retiveram o produto, os concorrentes, como Vietnã, Indonésia, México e Países
Centro Americanos, aproveitaram para esvaziar seus estoques e transferi-los aos
importadores. Essa situação vai exigir um ajuste na oferta mundial nos próximos
anos, uma vez que o consumo não tem crescido a uma taxa anual que consiga
absorver os excedentes existentes.
No caso dos
cafeicultores brasileiros, os que estão produzindo a custos superiores a
US$60,00/sc. de 60kg vão continuar a enfrentar uma situação difícil no ano 2001.
Provavelmente, muitos deverão reduzir áreas com baixas produtividades e outros
deverão sair do setor, abandonando suas lavouras. Já aqueles que tiverem
capacitação e capital vão ter que adotar uma estratégia de mercado e de produção
para um período de crise (que pode permanecer por mais dois a três anos),
envolvendo mudanças de manejo, condução da cultura e formas de preparo, visando
criar competitividade para seu produto.
Estimativas da Safra 2000/01 (USDA e EMBRAPA)
A primeira previsão para a
safra mundial de café do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos da
América (USDA) indicava que o volume colhido chegaria a 108 milhões de sacas
(arábica mais robusta). Consideramos relativamente modesta tal previsão, na
época de sua divulgação, sendo mais realista algo em torno de 112 milhões de
sacas. Em sua segunda previsão, recentemente divulgada, confirmaram-se nossas
expectativas iniciais, pois, segundo a instituição norte-americana, a produção
mundial alcançou 115 milhões de sacas no ano safra 2000/01 (tabela 1).
O último
levantamento do USDA indica, portanto, que uma análise de oferta mundial de café
deva ser feita com base em novos parâmetros, o que não significa todavia que
essas novas estimativas devam ser aceitas sem quaisquer críticas. Essa
instituição tende a superestimar os números da safra mundial de café, gerando
dúvidas quanto à confiabilidade de seus resultados. No caso particular desse
relatório divulgado, as dúvidas se referem principalmente ao Brasil e ao Vietnã,
cujas produções foram estimadas respectivamente em 32,6 milhões e 11,2 milhões
de sacas respectivamente. Esses novos números são mais realistas que os
anteriores (de 28,1 e 8,0 milhões de sacas), mas, no caso do Brasil, o
levantamento realizado pela EMBRAPA apontou produção de 31,1 milhões de sacas em
2000. No caso do Vietnã, por outro lado, o ritmo de desenvolvimento de sua
cafeicultura deve gerar oferta em torno de 10 milhões de sacas em 2001, número
que aparentemente faz mais sentido, já que o número de 11,17 milhões de sacas
representaria, em relação ao levantamento anterior (de 8,0 milhões se sacas),
aumento de quase 40%, diferencial considerado elevado levando-se em conta que o
levantamento foi realizado pela mesma instituição.
Só com as
ressalvas desses dois países (excluindo a Colômbia, cuja produção é ainda uma
incógnita: 12 milhões de sacas de acordo com o USDA ou menos de 11 milhões
segundo a Federação dos Cafeicultores), a produção mundial se reduz de 115
milhões para 112 milhões de sacas, mesmo assim bem maior do que o consumo
estimado por diferentes fontes que tem variado de 104 a 106 milhões de sacas.
Tabela 1 - Produção de Café nos Dez Principais Países Produtores e Total Mundial (em mil sacas de café beneficiado)
Países | 1997/98 | 1998/99 | 1999/00 | 2000/01 |
Brasil | 23.500 | 35.600 | 30.800 | 32.600 |
Colômbia | 12.043 | 10.860 | 9.512 | 12000 |
Vietnã | 7.000 | 7.500 | 11.010 | 11.167 |
Indonésia | 7.000 | 6950 | 7170 | 7300 |
México | 4.950 | 5.010 | 6.000 | 5.800 |
Índia | 3.805 | 4.415 | 4.870 | 4.900 |
Guatemala | 4.200 | 4.300 | 4.364 | 4.494 |
Costa do Marfim | 4.080 | 2.217 | 5.700 | 4.333 |
Etiópia | 3.833 | 3.867 | 3.833 | 3.767 |
Uganda | 3.032 | 3.640 | 3.200 | 3.200 |
Total Geral | 97.485 | 108.740 | 114.004 | 115.053 |
Fonte: Departamento de Agricultura dos Estados Unidos-USDA.
Finalmente, o governo divulgou
suas estimativas de safra de café. Segundo a EMBRAPA, responsável pelo
levantamento, a produção brasileira de café, no ano 2000, foi de 31,1 milhões de
sacas, volume 7,6% superior ao do primeiro levantamento (28,9 milhões de sacas)
e 15% superior à produção de 1999 (27 milhões de sacas) (tabela 2)
Na realidade,
essa é a terceira estimativa realizada pelo governo para a presente safra. O
segundo levantamento não teria sido divulgado por decisão política, justificada
não oficialmente (comentários em círculos restritos) pelo fato de que o
resultado encontrado acima das 30 milhões de sacas 'contrariaria as expectativas
de mercado' que estaria esperando por um volume bem menor do que os 28,9 milhões
de sacas do primeiro levantamento. Na ocasião da divulgação daquele primeiro
levantamento, o Instituto de Economia Agrícola (IEA) estimava para o Estado de
São Paulo um volume de 3,4 milhões de sacas, o que foi veementemente contestado
por algumas lideranças do setor que asseguravam que a produção máxima do Estado
deveria ser de 2,5 milhões de sacas. Entretanto, o último levantamento do IEA
não só não confirmou as expectativas daquelas lideranças como ainda alterou para
3,6 milhões a produção de São Paulo em 2000.
Tabela 2 - Primeira Previsão de Safra Cafeeira
2000/2001
(em mil sacas
beneficiadas)
Estado | Arábica | Robusta | Total | % |
Minas Gerais | 12.760 | 40 | 12.800 | 47,90 |
Espírito Santo | 1.900 | 5.000 | 6.900 | 25,80 |
São Paulo | 2.800 | 2.800 | 10,50 | |
Paraná | 400 | 400 | 1,50 | |
Rondônia | 1.600 | 1.600 | 6,00 | |
Bahia | 1.350 | 350 | 1.700 | 6,40 |
Outros | 200 | 300 | 500 | 1,90 |
Total | 19.410 | 7.290 | 26.700 | 100,00 |
Fonte: Elaborada a partir de dados básicos da EMBRAPA, dez. 2000.
Números da Retenção
A política de retenção implementada pela APPC resultou em expressivo volume de café retido no Brasil, totalizando, ao final de dezembro de 2000, 1,867 milhão de sacas retidas. O carregamento de estoques foi maior em Minas Gerais, que responde por mais de 63% do total de café retido no País (tabela 3).
Tabela 3 - Volume de Café Retido, por Estado, Brasil, 29/12/2000
Estado | Sacas de café
beneficiadas | % |
Bahia | 51.360 | 2,75 |
Espírito Santo | 297.409 | 15,93 |
Minas Gerais | 1.177.676 | 63,08 |
Paraná | 152.885 | 8,19 |
São Paulo | 187.679 | 10,05 |
Total | 1.867.008 | 100,00 |
Fonte: Departamento Nacional do Café, Ministério da Agricultura, 2000.
Para os observadores da política de retenção, pôde-se verificar que a adoção dessa estratégia logrou apenas diminuir a participação do café brasileiro nos mercados consumidores, repercutindo em queda de 23% das exportações quando comparadas com as observadas em 1999.
1 Convêniio USP/ESALQ/DESR-IEA/SAA/SP
Data de Publicação: 11/01/2001
Autor(es):
Luiz Moricochi (moricochi@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor