Artigos
A Reforma Agrária e o Banco Da Terra
A
Constituição Federal garante a todos os brasileiros ou estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à propriedade, subordinada ao atendimento
de sua função social, e prevê a desapropriação por interesse social para fins de
reforma agrária, assim como a expropriação de terras com culturas ilegais
(psicotrópicos), destinando-as à reforma agrária. Fundo da Terra (abrangência ou inovações) e limitações
Denominado Fundo de Terras e da Reforma Agrária, o Banco da Terra foi criado com
a finalidade expressa de financiar programas de reordenação fundiária e de
assentamento rural. A origem dos recursos que formam o Fundo tem várias fontes e
inclui TDAs (específicas para o Programa de Reordenação Fundiária) e retorno dos
financiamentos concedidos com recursos do próprio Fundo e do INCRA.
Apresentam-se aqui duas questões: uma relacionada com os critérios para a
divisão de recursos de uma mesma fonte, entre dois instrumentos de política
fundiária, a fim de se definir qual valor corresponde às indenizações de
desapropriação para reforma agrária e o que se destina ao Programa de
Reordenação Fundiária; e a outra relacionada com o novo destino do retorno dos
financiamentos concedidos pelo INCRA. Uma questão que deve ter duas respostas O país
passa a dispor de dois instrumentos de política fundiária. Assim, é necessário
ressaltar as características do Banco da Terra que podem contribuir para o
avanço na minoração de problemas sociais e econômicos que afetam uma parcela da
população. Porém, não substitui nem diminui a necessidade e a importância do
processo de reforma agrária, que, no atual quadro de exclusão social e de
pobreza presentes em todo o país, torna mais clara ainda essa nossa herança
agrária negativa.
O Estatuto da Terra prevê, entre as medidas de acesso à propriedade rural, a
compra e venda, a desapropriação por interesse social, a doação, a arrecadação
dos bens vagos, a reversão de posse do Poder Público de terras de sua
propriedade, indevidamente ocupadas e exploradas, a qualquer título, por
terceiros, e a herança ou legado.
Um ponto importante a ser citado, quando da análise das políticas a serem
implementadas no âmbito desta questão, é que a Constituição prevê que o
orçamento fixará anualmente o volume de Títulos da Dívida Agrária (TDAs), bem
como o montante de recursos para atender ao programa de reforma agrária.
Partindo das premissas constitucionais e da legislação pertinente, pode-se
analisar a criação do Banco da Terra, a qual se baseia no direito do trabalhador
rural a um empréstimo para a aquisição de terra a ser destinada ao seu trabalho
com a sua família, o que também está previsto na Constituição Federal.
A implementação do Banco da Terra, com a criação do Fundo de Terra e da Reforma Agrária, ocorreu em 1998 mediante a Lei Complementar no 93, de 04/02/98, que
foi regulamentada em maio de 2000.
Deve-se considerar, nesta questão, que o uso da desapropriação tem sido fonte de
conflitos e de debate, relativamente a aspectos administrativos, jurídicos e
políticos e não raras vezes com recorte estritamente ideológico, assim como
sobre insuficiências técnicas nos laudos de vistoria dos imóveis; morosidade nos
trâmites administrativos e jurídicos; falta de estrutura da administração
pública para levar a cabo as ações previstas em Lei; e os altos valores das
indenizações.
A busca de alternativas, por parte dos agentes governamentais, levou à
implantação do Banco da terra, deslocando a intervenção pública direta sobre a
estrutura fundiária (desapropriação) para uma função indireta (fornecimento de
crédito), de forma que o mercado passe a ser também um local privilegiado de
solução dos conflitos fundiários.
Uma opção de política que estimule o acesso à terra, mediante a concessão de
crédito criado para este fim, vem, de fato, estimular as práticas já correntes
no mercado de terras, podendo ampliar o número de negócios realizados em menor
período. O resultado é a dinamização de uma prática usual, acrescida de um
incentivo para que as unidades que já não conseguem se manter devido à
exiguidade de área permaneçam na atividade rural. Este incentivo é importante
como complemento a uma política de reforma agrária que conviva com o incremento
constante de demanda por terra, pois crescem novos contingentes de trabalhadores
rurais ou agricultores familiares expropriados que estarão parcialmente sendo
atendidos .
É neste contexto que esta análise da questão fundiária considera o Banco da
Terra como uma instituição que permite a gestão de uma política pública
importante, mas necessariamente complementar frente às necessidades da estrutura
social e fundiária brasileira, que resultaram no surgimento de vários movimentos
sociais mais ou menos organizados por todo o país..
O uso desses recursos é feito a partir da apresentação do Programa de
Reordenação Fundiária, para a compra de imóveis rurais e a implantação de
infra-estrutura básica prevista, além das despesas resultantes da implantação do
Programa. São liberados para o financiamento individual ou coletivo de
trabalhadores rurais não proprietários e para aqueles cuja propriedade não
atinja o módulo familiar, cuja renda gerada seja insuficiente para o próprio
sustento e de suas famílias, ou suas cooperativas e associações.
Este mecanismo de crédito fundiário compreende medidas de acesso à propriedade
rural, por meio de transações de compra e venda. Aqui, o Poder Público age
disponibilizando recursos para que a transação se efetive mediante contrato
entre as partes (comprador ou compradores e vendedor). Esta lei facilita
transações para aqueles que dispõem de recursos mínimos suficientes para honrar
os compromissos contratados e que não se encontram entre aqueles potencialmente
beneficiados das ações de reforma agrária estrito senso.
Há grande diversidade na população que busca o acesso à terra, o que requer
realmente políticas distintas. Os diferentes graus de exclusão social, bem como
a existência ou não de organização familiar dos diversos grupos de sem-terra ou
'quase sem-terra', são capazes de indicar a capacidade do indivíduo ou do grupo
em pagar o financiamento, que engloba desde os investimentos básicos à
elaboração do projeto nos moldes estabelecidos. Podemos comparar, por exemplo,
um trabalhador rural integrante de grupo familiar, que possua infraestrutura e
relacionamento já estabelecido com o mercado consumidor, com outro cuja origem e
experiência anterior não permitem realizar os resultados de produção e inserção
no mercado nos três anos de carência. Ainda será necessário aos beneficiários
desta política discutir seu futuro desempenho diante das condições de
financiamento.
A garantia do financiamento no caso do Banco da Terra é o imóvel que está sendo
comprado ou, caso a compra esteja sendo realizada por meio de associações ou
cooperativas, a cobrança da garantia pessoal dos beneficiários. Além das
providências previstas, relativas à liberação e reembolso dos recursos, às taxas
de juros, aos redutores previstos e aos percentuais de rebate que correspondam a
diferenciações regionais favorecendo áreas mais pobres, há maleabilidade para
acrescentar despesas não previstas e o estímulo à formação de consórcios de
municípios para contribuir com o Programa Banco da Terra. Esses pontos segundo o
Programa buscam contribuir para a viabilização econômica e social deste novo
tipo de assentado.
O Banco da Terra traz a possibilidade de permitir o acesso à propriedade rural a
um contingente da população que percorre os caminhos da expropriação. Porém, o
público alvo desta política, que tem sido amplamente divulgada, difere do que
deve ser atendido com a política de reforma agrária.
É importante vislumbrar que, em prazos distintos, cada política especifica nesta
área deverá mostrar os ganhos sociais e econômicos correspondentes e que, em uma
realidade diversa, os caminhos também podem ser diversos na busca de resultados
realmente significativos e que possam atender às demandas sociais, tanto as
visíveis e organizadas politicamente quanto as apresentadas por meio de
mecanismos de mercado.
Data de Publicação: 23/07/2001
Autor(es):
Ana Victoria Vieira Martins Monteiro (ana.monteiro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Jorge Eduardo Julio Consulte outros textos deste autor