Safra De Café Brasileira: Uma Polêmica Sepultada

            Nos últimos anos, o mercado de café tem convivido com previsões de safra díspares, elaboradas por diversos agentes desde técnicos do governo estadunidense e grandes exportadores domésticos até organizações dos cafeicultores. A lógica de construção desses números pautava-se, nos dois primeiros casos, pela divulgação de expectativas de colheita nitidamente superestimadas e, no último, pela tendência acentuada de baixa. O ambiente conturbado que se estabelecia no mercado contentava seus operadores, pois permitia intensificação dos processos especulativos e, conseqüentemente, das possibilidades de ganho para os detentores das informações sobre o cenário mais provável para o abastecimento doméstico e internacional.
            O esforço para resgatar a autonomia na previsão de safra de café vem sendo progressivamente alcançado pelo País. Coordenado pela EMBRAPA e envolvendo centenas de técnicos no levantamento de campo nas diversas regiões produtoras, essa previsão ganha a cada ano que passa maior credibilidade e consistência frente a possíveis controvérsias e discordâncias. Após a divulgação da primeira previsão da safra brasileira de café 2000/01 (ocorrida em dezembro de 1999), com colheita estimada em 28,9 milhões de sacas, membros de instituições internacionais ligadas ao café, querendo forçosamente desacreditar essa estimativa, elegeram os dados da previsão de produção de café em São Paulo como aqueles mais viesados, entendendo que a colheita não poderia superar os 2,5 milhões de sacas. O referido levantamento previa safra de 3,48 milhões de sacas, valor muito próximo da previsão elaborada pela CATI/IEA, que apontava para a safra de 3,64 milhões de sacas.
            A divergência apoiava-se no pretenso consenso de que a longa estiagem ocorrida sobre as lavouras teria efeitos fortemente redutores sobre a colheita. Embarcando nessa orientação, e também como forma de legitimar suas posições alarmistas sobre os danos da estiagem, algumas lideranças do agronegócio do café, em São Paulo, opinavam que o número oficial não refletia a realidade do campo, pois, no momento do levantamento, a queda e a má formação de chumbinhos ainda não eram evidentes, fenômenos esses que somente se revelariam meses depois do mencionado distúrbio climático. No entender dessas lideranças, a previsão de colheita de São Paulo sequer alcançaria as 2,5 milhões de sacas.
            A colheita de 3,48 milhões de sacas, apesar de ser estatisticamente obtida e parcialmente confirmado pela segunda fonte, foi alvo de contundentes críticas de algumas lideranças dos produtores, que chegaram a convocar reunião da Câmara Setorial do Café para discuti-la (de fato mostrar sua indignação) com os técnicos responsáveis pelo trabalho, responsabilizando-os inclusive pela não reversão das expectativas de baixa para as cotações no mercado internacional. Houve até quem propusesse a contratação de auditoria independente para fiscalizar a metodologia e o trabalho dos técnicos, demonstrando total falta de diplomacia para com a dedicação e seriedade dos profissionais envolvidos nessa tarefa.
            Diante da impossibilidade de se alterar os números oficiais, essas mesmas lideranças procuraram criar um ambiente para que a nova pesquisa refletisse suas expectativas de colheita menor. Os técnicos, valendo-se de verdadeiro espírito público e total isenção, voltaram a campo em abril de 2000 para efetuar novo levantamento, com amostra diferente e independente daquela utilizada em novembro de 1999, que surpreendentemente resultou em colheita com igual volume ao já anteriormente mensurado (3,47 milhões de sacas). Em reforço a esse dado, a previsão subjetiva da CATI/IEA, no terceiro levantamento em fevereiro de 2000, confirmou sua previsão anterior.
            Em dezembro de 2000, a EMBRAPA divulgou o primeiro levantamento da safra 2001/02, com previsão de colheita de 26,7 milhões de sacas. Contudo, esse fato, que passou quase desapercebido pela comunidade cafeeira, foi a confirmação do volume colhido na safra 1999/2000, que, pelos números da EMBRAPA, teria alcançado 31,1 milhões de sacas. O Estado de São Paulo contribuiu com pouco mais de 11% desse total, colhendo 3,6 milhões de sacas, sendo esses os números finais.
            Assim, as múltiplas confirmações sobre o tamanho da safra de café paulista evidenciam que o trabalho de pesquisa no campo atingiu sua maturidade. A partir dessa experiência, as celeumas que infelizmente sempre existirão perdem poder de questionamento diante da tenacidade do número oficial, evidenciando apenas impertinência e picardia daqueles que se organizam para formulá-las, além de outros motivos menos declarados, mas sabidamente motivadores de tais atitudes, como as posições equivocadas/perdedoras na Bolsa, baseadas em impressões apaixonadas e pouco profissionais.
 

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Data de Publicação: 08/02/2001

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor