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O Mercado De Café E A Appc
Tudo começou em 1985, com a seca que também assolou as regiões cafeeiras do
Brasil, fazendo com que os preços de café disparassem no final daquele ano e
começo de 1986, tendo alguns produtores vendido café a mais de 400 dólares a
saca. Como conseqüência desses preços, a produção de café no Brasil atingiu o
volume recorde em 1987, ou seja, mais de 42 milhões de sacas. Entretanto, não
foi só aqui que houve aumento de produção, mas em quase todos países produtores
e foi essa avalanche de produção que na prática fez com as cláusulas econômicas
do Acordo Internacional do Café fossem suspensas em 1989 e que os preços do
produto desabassem para níveis de 40 dólares a saca em 1992. Contribuíram também
para essa situação crítica a abrupta extinção do IBC (deixando o setor
completamente à deriva) e a própria condição em que se encontravam os produtores
na época, ou seja, bastante descapitalizados.
Nesse contexto, o mercado de café fica muito complicado, pois a sua
característica de demanda inelástica associada ao fato de que grande parte dos
países produtores dependem desse produto como principal fonte de receitas
cambiais, faz com que seja criado um círculo perverso: só se consegue vender
mais café, reduzindo seus preços em proporção maior que o aumento na oferta
(demanda inelástica) e com essa queda de preços os países produtores são
obrigados a vender mais ainda, já que contam com uma quantidade determinada de
recursos que deverá ser internalizada principalmente através das exportações de
café.
Tudo isso aconteceu em 1992 e 1993, resultando em estoques elevados nos países
consumidores (mais de 20 milhões de sacas) e preços mais baixos ainda nos países
produtores. Quem acompanha de perto as políticas e o mercado de café sabe que,
além dessas questões de natureza técnico-econômica, contribuiu fortemente também
para aumentar aqueles estoques uma jogada estratégica dos demais países
concorrentes contra o Brasil (uma história longa que não cabe neste artigo), mas
que não deu certo.
Nesses anos de dificuldades, muitos países da América Central e da África não
dispunham sequer de recursos para fazer a colheita de café. É claro que tal
situação não poderia se perpetuar e aí entram os fundamentos de mercado. Foram
reduzidos drasticamente os tratos culturais e muitas lavouras abandonadas e
erradicadas (mais de 1 bilhão de pés só no Brasil), situação que passou a se
refletir nos preços. Com efeito, as cotações médias dos arábicos brasileiros,
segundo dados da Organização Internacional do Café (OIC), passaram de 56 cents
em 1992, para 66 cents em 1993 e 143 cents em 1994, mostrando a nítida
tendência de alta, já a partir de setembro de 1992; após ter chegado à cotação
mais baixa do período, ou seja, 46 cents em agosto daquele ano, os preços
passaram a ser ascendentes nos meses seguintes, terminando o ano com o produto
cotado em 74 cents em dezembro. Em 1993, houve de início certa resistência no
mercado a essa tendência de alta, que, no entanto, acabou se confirmando,
configurando, assim, o começo do ciclo de preços elevados que atingiu o ápice em
maio de 1997 (209cents).
Por que os preços começaram a reagir a partir de 1992/1993? Simplesmente porque,
a partir dessa época até 1997, sistematicamente, a produção mundial de café foi
inferior à demanda, cuja diferença de volume em favor do consumo atingiu em
média cerca de 6 milhões de sacas anuais. É, portanto, completamente equivocado
o argumento segundo o qual os preços subiram devido à criação da APPC. Não foi
também por causa das geadas de 1994, como muitos afirmam, embora, é claro, esse
fenômeno tenha acentuado aquela tendência de alta, pois o mesmo tipo de café que
era vendido a 40 dólares em 1992 fora negociado um mês antes da geada a 140
dólares. Essa mudança nos preços ocorreu porque tinha de ser assim mesmo, devido
à interação de fatores endógenos ligados à própria dinâmica do mercado desse
produto, ou seja, foi o mercado que funcionou...
Na atual conjuntura mundial, estamos convivendo num contexto de produção maior
do que o consumo, situação que deverá perdurar seguramente por mais uns 2 ou 3
anos, a menos que intervenham quaisquer componentes de natureza climática
(secas, geadas, etc.), afetando diretamente o setor produtivo.
Data de Publicação: 01/06/2000
Autor(es):
Luiz Moricochi (moricochi@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Antonio Roger Mazzei (mazzei@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Roberto de Assumpçao (rassumpçao@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor