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Relações de troca na agricultura e o novo ano agrícola
No início do ano agrícola 2005/06, quando os agricultores decidem sobre o
plantio da safra de grãos e fibra de verão, influenciam suas decisões questões
como disponibilidade e taxas de juros do crédito rural, renegociação das dívidas
pendentes da safra anterior, tendências do mercado interno e externo dos grãos e
fibras, taxas de juros para crédito com recursos livres e CPR.
A solução de muitas dessas questões depende da atual política monetária do
Governo Federal - que envolve a taxa básica de juros, hoje de 19,75% ao ano,
gerando a maior taxa de juros reais do planeta, da ordem de 14% ao ano - e das
políticas de controle de gastos públicos, que acaba por não disponibilizar os
recursos necessários para finalizar a comercialização da safra anterior, e não
viabilizar a renegociação dos débitos de custeio que se encontram pendentes e a
equalização de taxas de juros para cumprir o volume de crédito a taxas fixas,
programado inicialmente. Porém, os produtores estão no limite da tomada de
decisão, uma vez que a época de plantio está chegando e não pode mais esperar.
Assim, com finalidade de contribuir para as decisões de cada produtor sobre o
que, quanto e com que tecnologia produzir, apresenta-se o comportamento das
relações de troca entre o preço de fertilizante específico para cada um dos
grãos e fibras e os preços dos produtos, nos meses de julho dos últimos quatro
anos, estimados com informações disponíveis no banco de dados do Instituto de
Economia Agrícola ( http://www.iea.sp.gov.br/out/ibcoiea.php).
A relação de troca do algodão com fertilizante cresceu de forma expressiva em
julho de 2004 e menos intensamente em julho de 2005. Assim, serão necessárias
cerca de 54,6 arrobas de algodão em caroço para adquirir uma tonelada de
fertilizante utilizado na cultura, cerca de 50% a mais do que o observado em
julho de 2003. Isto ocorre em função da elevação dos preços dos fertilizantes e
dos baixos preços recebidos pelos produtores em julho de 2005, o que sugere uma
menor área de plantio para a próxima safra.
A evolução deste indicador para o algodão pode ser observada no gráfico abaixo.
Fonte: revista Informações Econômicas, SP, v. 32, n. 8, ago 2002; vol.33, n.8, ago 2003; vol.34, n.8, ago 2004; vol.35, n.8, ago 2005
Para o
milho, a relação de troca apresenta um comportamento de crescimento desfavorável
de 2002 para 2004, quando atinge 50,7 sacas por tonelada de fertilizante. Em
julho de 2005, essa relação se reduz para 43,1 sacas, tornando-se mais
favorável, o que é consistente com as indicações de expansão da área de plantio
da cultura para a próxima safra.
A evolução deste indicador para o milho pode ser observada no gráfico abaixo.
Fonte: revista Informações Econômicas, SP, v. 32, n. 8, ago 2002; vol.33, n.8, ago 2003; vol.34, n.8, ago 2004; vol.35, n.8, ago 2005
Para o
arroz, a relação de troca com fertilizantes cresce de 19,5 sacas de 60 kg por
tonelada de fertilizante, em julho de 2003, para 26,7 sacas em julho de 2005.
Indica, assim, condições de produção totalmente desfavoráveis para o produto,
refletindo a ocorrência de um mercado com oferta excedente e baixos preços
observados no mês de julho de 2005, com desestímulo à expansão da área da
cultura.
A evolução deste indicador para o arroz pode ser observada no gráfico abaixo.
Fonte: revista Informações Econômicas, SP, v. 32, n. 8, ago 2002; vol.33, n.8, ago 2003; vol.34, n.8, ago 2004; vol.35, n.8, ago 2005
A
relação de troca da soja vem crescendo desde 2002, indicando condições
desfavoráveis para a cultura, principalmente em julho de 2004 e julho de 2005
quando foram necessárias 31,3 sacas de soja por tonelada de fertilizante. Esse
cenário menos favorável para a cultura poderá induzir a menor área de produção
e/ou a menor utilização do insumo por parte dos produtores na próxima safra.
A evolução deste indicador para a soja pode ser observada no gráfico abaixo.
Fonte: revista Informações Econômicas, SP, v. 32, n. 8, ago 2002; vol.33, n.8, ago 2003; vol.34, n.8, ago 2004; vol.35, n.8, ago 2005
Para o
trigo da safra de 2004/05, cuja colheita está em fase inicial, a relação de
troca, em termos de toneladas do cereal por uma tonelada de fertilizante, é
crescente desde 2002. Isto indica condições desfavoráveis de produção para a
cultura, refletindo os baixos preços recebidos pelos produtores e os níveis
altos dos preços dos fertilizantes adquiridos. As estimativas disponíveis de
menor safra na atual colheita refletem a redução tanto de área quanto de
produtividade, devido à menor utilização de insumos.
A evolução deste indicador para o trigo pode ser observada no gráfico abaixo.
Fonte: revista Informações Econômicas, SP, v. 32, n. 8, ago 2002; vol.33, n.8, ago 2003; vol.34, n.8, ago 2004; vol.35, n.8, ago 2005
Para o
feijão carioca, a relação de troca cresceu 97% no período de 2002 a 2004, quando
caiu para 7,6 sacas por tonelada de fertilizante em julho de 2005, em função de
expressiva redução na oferta e recuperação nos preços recebidos. A queda de 45%,
em relação a julho de 2004, indica uma situação mais favorável à expansão da
área plantada com a cultura na safra futura.
A evolução deste indicador para o feijão pode ser observada no gráfico abaixo.
Fonte: revista Informações Econômicas, SP, v. 32, n. 8, ago 2002; vol.33, n.8, ago 2003; vol.34, n.8, ago 2004; vol.35, n.8, ago 2005
Já os
principais índices de preços estimados para a agricultura paulista pelo IEA,
para os meses de julho de 2002 a 2005, apresentam crescimento do Índice de
Preços Recebidos (IPR) e dos Índices de Preços Pagos (IPP), de Preços Pagos
pelos Fertilizantes (IPP-fertilizantes) e de Preços Pagos pelos Preços dos
Defensivos (IPP- defensivos), no período de 2002 a 2004. Verifica-se então queda
expressiva do índice dos preços de fertilizantes em julho de 2005 e lento
crescimento dos índices de preços recebidos e pagosno mesmo mês.
Assim, os preços dos fertilizantes indicam menores níveis para a safra futura,
enquanto os preços dos demais insumos se mostram flutuantes próximo do índice de
preços pagos pelos agricultores (ver gráfico abaixo).
Fonte: http://www.iea.sp.gov.br/out/ibcoiea.php
Para
verificar a situação de todo o setor agropecuário, considerem o índice
deparidade que é a relação entre o índice de preços recebidos e o índice de
preços pagos pelos agricultores. Esse indicador dá um parâmetro sobre os ganhos
ou as perdas do setor em determinado ponto ou período.
O gráfico abaixo permite visualizar o índice de paridade da agropecuária
paulista no mês de julho, dos anos de 2002 a 2005, quando os produtores tomaram
decisões sobre as safras dos anos agrícolas seguintes. Assim, em julho de 2002,
os agricultores estavam recebendo 17,20% a mais do que pagavam pelos insumos
agropecuários, enquanto em julho de 2005 recebiam apenas 3,15%, com tendência de
se ter um indicador negativo para os meses seguintes.
Em outros termos, os preços dos insumos sobem lentamente, enquanto os preços
recebidos crescem a taxas menores e com tendência a se trocar de sinal e
apresentar queda a partir de agosto de 2005. Isto quer dizer que as condições de
mercado estão se tornando rapidamente desfavoráveis aos agricultores, o que
deverá influir nas decisões sobre a área a ser plantada e sobre a tecnologia
(produtividade) esperada para a safra futura, com reflexo direto na produção de
grãos e fibras do País.
Fonte: http://www.iea.sp.gov.br/out/ibcoiea.php
Por
fim, é possível dimensionar o tamanho das dificuldades a serem enfrentadas no
curto prazo para a definição sobre a área a ser plantada e as expectativas
quanto ao volume da safra brasileira de grãos para o ano agrícola 2005/06.
Basta considerar a enorme escassez de crédito à taxa fixa de 8,75% ao ano para
custeio. Isto pode ser comprovado pela recente resolução do Banco do Brasil -
responsável por mais de 70% do crédito de custeio para a safra de grãos do país
- de somente liberar até R$ 50.000,00 de crédito a essa taxa aos antigos
clientes e que, a partir da demanda, esse volume será crescente até o limite de
R$ 100.000,00 à taxa fixa, ficando as demandas adicionais para serem atendidas a
taxas livres que vão de 16% a 19% ao ano, o que encarece em mais de 100% a taxa
média de juros para os maiores produtores.
Além disso, mais de um terço dos produtores ainda não renegociaram seus débitos de custeio com bancos e fornecedores e, até o final de julho, as aquisições de insumos, sementes e pesticidas atingiram pouco mais de 50% da demanda prevista, a um mês de plena época de plantio em todo o Centro-Sul.1
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1Artigo registrado no CCTC-IEA sob número HP-77/2005
Data de Publicação: 31/08/2005
Autor(es): Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor