Trigo: situação atual e perspectivas para 2002

            A cultura do trigo no Brasil é de alto risco, sendo sujeita a perdas decorrentes de adversidades climáticas próprias do inverno, como estiagens e geadas. O risco de mercado aos produtores também é considerável em função da elevada dependência externa, uma vez que o abastecimento nacional é feito predominantemente por importações. No ano comercial 2001/02, deverão ser importadas 7,5 milhões de toneladas, representando 74% do consumo total, estimado em 10,1 milhões de toneladas, conforme os dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Mesmo assim, verifica-se no último quinquênio uma tendência de crescimento da área cultivada (figura 1).

Figura1 – Evolução e linha de tendência de área, produção e produtividade
da cultura do trigo, Estado de São Paulo, de 1997 a 2001

                      Fonte: IEA

            De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a área plantada no Brasil em 2001 foi 13% superior à do ano anterior, resultando num volume produzido de 3,2 milhões de toneladas, 96% maior que o de 2000, ou seja, um crescimento devido basicamente à maior produtividade. Em 2000, houve quebra de safra em função de ocorrência de geadas nas regiões produtoras. Em São Paulo, a situação foi análoga, com crescimento de 30% na área cultivada e de 125% na produção, conforme os dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA) (tabela 1)

Tabela 1 – Área, produção e rendimento de trigo, São Paulo-Brasil – 1997-2001

Ano
Área (ha)
Produção(t)
Rendimento kg/ha
 
São Paulo
Brasil
São Paulo
Brasil
São Paulo
Brasil
1997
12.379
1.544.489
21.537
2.489.070
1.740
1.636
1998
16.878
1.423.789
34.221
2.269.847
2.027
1.611
1999
20.100
1.254.275
41.025
2.461.856
2.041
1.970
2000
17.522
1.528.920
22.627
1.661.526
1.291
1.559
2001
22.840
1.727.714
51.000
3.257.372
2.233
1.885

               Fonte: IBGE, IEA

            As perspectivas para a triticultura nacional melhoraram depois da desvalorização do Real em janeiro de 1999 e das subsequentes alterações cambiais que culminaram com a taxa recorde de R$2,7402 por dólar, em outubro de 2001. Essa conjuntura vem estimulando os agricultores a ampliar as áreas de cultivo. Particularmente para a próxima safra de 2002, cujo plantio deverá iniciar-se a partir de 15 de março, há um estímulo adicional que é a situação da Argentina. Em março do ano passado, houve problemas provocados por restrição do governo brasileiro ao trigo argentino oriundo de regiões onde ocorreram focos de febre aftosa e, no ultimo trimestre do ano, diante da crise cambial, os produtores argentinos chegaram a suspender as vendas. Isso gerou grande expectativa no segmento brasileiro de moagem, face à possibilidade de a recomposição dos estoques ter que ser feita com produto de outras origens, o que implicaria em elevação de custos, devido principalmente ao frete maior e à tarifa de importação, tributo que não incide sobre o produto argentino. Percebe-se essa diferença pelos dados comparativos de custo de importação publicados por Safras e Mercados (27/02/2002), os quais são de US$ 177,67 por tonelada, dos Estados Unidos - CIF-Sudeste, e de US$ 149,81, da Argentina - CIF-Sudeste .
                O imposto de exportação anunciado pelo governo argentino em 04/03/02, cuja alíquota imposta para os produtos básicos é de 10%, caso do trigo, num primeiro momento não deverá trazer grandes alterações nos preços do produto. Os triticultores argentinos terão que arcar com esse custo, uma vez que as cotações são definidas no mercado internacional. Mais para frente, a partir de abril, como geralmente acontece, pode ser que os produtores argentinos elevem os preços, uma vez que as exportações para países de outras regiões do mundo diminuem e praticamente o restante é exportado para o Brasil. E aí o limite das elevações dos preços é dado pelas vantagens do comércio do Mercosul, onde os outros países exportadores são menos competitivos.
            No segundo semestre de 2001, em plena safra, os preços recebidos pelos produtores paulistas apresentaram os níveis mais elevados do último quinquênio (tabela 2). Além dos preços, a adoção do sistema de plantio direto também é um fator de estímulo, na medida em que a cultura do trigo forma uma boa palhada e se constitui em boa opção para o plantio de inverno no sistema de rotação de culturas, recomendado no plantio direto na palha.

Tabela 2 – Preços recebidos pelos produtores de trigo – São Paulo –1997-2002(R$/60kg).

mês/ano
1997
1998
1999
2000
2001
2002
Janeiro
8,87
9,08
9,21
14,17
13,61
17,81
Fevereiro
8,98
9,22
11,80
13,42
13,88
Março
9,48
9,08
12,00
13,50
14,25
Abril
10,43
9,28
12,00
13,35
14,04
Maio
11,29
8,89
12,02
13,50
14,76
Junho
11,28
9,00
12,50
13,82
15,69
julho
10,74
9,38
12,50
13,79
16,27
agosto
10,47
9,35
12,93
15,39
17,34
setembro
10,14
8,77
13,46
15,17
16,52
outubro
10,03
8,87
13,51
14,05
16,74
novembro
10,01
9,00
13,62
13,37
16,81
dezembro
9,72
9,19
13,37
13,82
17,21

               Fonte: Instituto de Economia Agrícola
 

            De acordo com informações de técnicos da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI), a procura por semente de trigo é superior à do ano passado e maior que a oferta. O Departamento de Sementes Mudas e Matrizes da CATI tem disponível para o próximo plantio 2,543 mil toneladas de sementes de trigo, o que representa um aumento de 45% sobre a disponibilidade de 2001, mas ainda muito aquém da demanda. Essa quantidade é suficiente para o plantio de cerca de 20 mil hectares e, se considerarmos o mesmo percentual de sementes próprias e também as importadas de outros Estados, podemos estimar que a área poderá crescer para cerca de 34 mil hectares, o que representaria uma expansão de 49% sobre a área cultivada em 2001 no Estado de São Paulo.
            Os dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, sigla em inglês), de fevereiro, mostram pequena redução da produção mundial de trigo em 2001/02 (de 0,72%) e leve aumento no consumo e no comércio global. A produção é 12 milhões de toneladas, menor que o consumo projetado. Deverá haver uma pequena queda nos estoques finais. Os menores estoques nos Estados Unidos, União Européia, Canadá e Austrália serão parcialmente compensados por aumentos nos estoques finais de países da ex-União Soviética, notadamente da Ucrânia e do Cazaquistão. Essa conjuntura reduz o risco de pressões baixistas nas cotações internacionais por ocasião da comercialização da safra nacional.
 

Data de Publicação: 01/03/2002

Autor(es): José Roberto Da Silva (josersilva@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor