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Safra De Grãos: Decidindo O Que Plantar
Quando se aproxima a época de plantio das chamadas culturas das águas ou de
verão, começam as especulações (no bom sentido) sobre aumento ou diminuição de
área e consequentemente qual cultura poderá ser substituída.
No Brasil, hoje, a maior disputa ocorre entre milho e soja, principais
componentes das rações animais, responsáveis por 83% do total de ingredientes. O
algodão já teve maior importância no passado, quando competia com o milho, até
meados da década de 70. Atualmente, está em fase de recuperação, embora em área
mais restrita e localizada.
A seguir, apresentam-se os principais entraves e oportunidades para cada cultura
(milho e soja). No caso do algodão, os aspectos do mercado serão considerados
isoladamente, pelas características da atividade.
O milho, atividade das mais tradicionais da agricultura brasileira, apresenta
grande heterogeneidade na condução das lavouras, desde aquelas típicas de
subsistência até as que incorporam todo o acervo tecnológico disponível. Assim,
os níveis de produtividade mostram significativa variação entre sistemas e
regiões. Como agravante, o produto é onerado pelo custo de transporte, em razão
do seu baixo valor específico, e a capacidade de armazenagem na propriedade é
pequena (não mais que do 5% do total do espaço para estocagem), o que força a
sua rápida comercialização, em período de preços baixos por efeito da época de
safra.
Embora o material genético (semente híbrida) seja o mesmo, a produtividade média do milho brasileiro está ao redor de 3.300 quilos por hectare, enquanto nos Estados Unidos supera 8,5 toneladas/ha. Isto ocorre sobretudo pelo inadequado manejo da cultura, a começar pelo 'stand' (número de plantas por hectare) seguido das práticas culturais rotineiras que deixam a desejar. No Brasil, há casos de produtividade entre 5.000kg/ha e 6.000kg/ha por parte de produtores altamente tecnificados. Como vantagem, o cereal hoje novamente consta da pauta de exportação (previsão de 4 milhões de toneladas) e tem grande procura no mercado interno em razão da avicultura e da suinocultura, que são responsáveis por 85% do consumo nacional de rações. Além disso, outros segmentos consumidores de ração estão crescendo, como os de eqüinos e pet food.
O milho, isoladamente, é o principal macroelemento utilizado (65%) na formulação
de rações. Estimulado pela grande demanda por proteína animal, também tem sido
consumido em escala crescente diante da evolução das vendas de aves e suínos no
mercado externo, o que aparentemente deveria pelo menos manter a continuidade da
procura pelo cereal. Contudo, o que vem ocorrendo não satisfaz a clássica lei da
oferta e da procura. Na realidade, o cereal tem se mostrado pouco atrativo em
termos de remuneração, a ponto de os segmentos componentes da cadeia produtiva
terem decidido 'estabelecer' o preço de R$ 10,00 o saco de 60 kg para não
desestimular aqueles que se dedicam à lavoura.
A soja, cultura que já nasceu 'moderna', apresenta, por sua vez, níveis de
produtividade mais uniformes (e elevados), sistemas de produção bem definidos e
homogêneos em termos de região de plantio e elevada procura, derivada da demanda
por proteína animal. Um fato marcante é que nos últimos anos a área vem
crescendo bastante, sobretudo na região Centro-Oeste, notadamente em Mato
Grosso. Lá, os rendimentos obtidos são superiores aos dos Estados Unidos,
sabidamente principal produtor mundial da oleaginosa. A soja tem se apresentado
como um produto de elevada liquidez e lucratividade por estar atrelada ao dólar.
Participa na forma de farelo com 18% da composição das rações para animais.
A partir de agosto, quando ocorreram as primeiras manifestações de lideranças
rurais, técnicos e demais agentes do agronegócio, havia quase unanimidade em
severas modificações no cenário agrícola: reduções drásticas nas áreas de
algodão (até 50%) e de milho (ao redor de 20%) e aumento correspondente na de
soja. Atualmente, com a diminuição da carga emocional e com a maior
racionalidade dos agentes, aponta-se redução de 10% na área de milho com
benefício idêntico para a soja.
O algodão tem uma história diferenciada, em virtude das acentuadas reduções no
cultivo, sobretudo na primeira metade da década de 90. A partir de meados dos
anos 90s, teve início uma nova fase da atividade, com o predomínio de extensas
áreas cultivadas e elevado nível tecnológico, especialmente no Centro-Oeste do
país. Buscava-se, além da auto-suficiência para o então crescente consumo
interno, o retorno do produto à pauta de exportações. Assim, na safra 2000/01,
obteve-se produção recorde de 916,0 mil toneladas de algodão, 30,8% maior do que
a anterior. Nesse ínterim, o mercado brasileiro – principal destino da produção
- entra em ritmo de desaceleração, com a redução no uso industrial da fibra, e
agravam-se as condições desfavoráveis no âmbito mundial. Os preços internos, que
já se encontravam em queda, foram ainda mais pressionados com a entrada da maior
parte da safra brasileira, a partir de maio de 2001, e as cotações externas
marcam níveis históricos de baixa.
Uma análise histórica da relação de preços milho/soja, e correspondentes
variações na área e produção subsequente – preço anterior influenciando a safra
seguinte –, pode contribuir para a definição de alternativas de investimento. A
relação significa quantos sacos de milho são necessários para comprar um saco de
soja.
A vantagem da utilização de relativos de preços reside na facilidade de cálculo
ao comparar a rentabilidade das atividades por uma simples razão de dois
números, sem a necessidade, pelo menos aparente, de se considerar os custos de
produção.
No Brasil o ponto de equilíbrio entre preços de milho e soja fica entre 1,8 e
2,0. Abaixo de 1,8, o cenário pode favorecer o milho e acima de 2,0 ocorre o
inverso: é pró-soja. Se ficar em 1,9, não haverá preferência. A Figura
1 mostra a
influência de relação de preços no comportamento da área cultivada na safra
seguinte.
Foi considerada a média de preços recebidos pelos produtores, no Estado de São Paulo, levantados pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA), nos meses (maio a julho) que antecedem à decisão do plantio no período de 1992 a 2001. Constatou-se que não há correspondência perfeita a ponto de o índice encontrado orientar a tendência de aumento/diminuição da área a ser incentivada, demonstrando que outros fatores que não apenas o preço podem influenciar na decisão do empresário rural. Contudo, há exemplos marcantes e coerentes: em 1997, por força do índice verificado 2,34:1, a soja na safra seguinte apresentou aumento de área de 15,3%, em detrimento daquela do milho que recuou 26,7%. Em 1998, a razão 1,51:1 provocou em 1999 aumento para o milho e ligeira redução para soja.
Em 2001, a relação de preços milho/soja, de 2,28, indica que poderá haver forte
expansão da soja em 2001/02. No entanto, deve-se levar em conta os seguintes
fatores: a) atualmente, o Brasil tem presença marcante no mercado externo de
grãos e de carnes por força da competitividade, em razão do câmbio e dos custos
de produção; b) o milho, como foi dito anteriormente, é a principal
matéria-prima na composição de rações; c) esse cereal voltou a compor a pauta de
exportações e, a par do estoque elevado desta temporada, vem mantendo tendência
crescente de consumo interno; d) a soja mostra acentuada evolução nas
exportações, principalmente do grão, item favorecido pela Lei Kandir (isenção de
ICMS nos embarques) e pela preferência do mercado externo; e e) há expectativa
de safras recordes de soja tanto no Brasil quanto no mundo.
Neste sentido, o mercado interno, para os produtos aqui analisados, deve merecer
atenção, pois recente relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostra
tendência de baixa generalizada para as principais commodities a partir de 1998,
devido às sucessivas boas colheitas no mundo.
No caso do algodão, espera-se redução no cultivo no Brasil diante do cenário
atual. A retração deve ser mais forte na Região Meridional (Paraná e São Paulo)
e menos acentuada na Centro-Oeste (Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul)
devido aos elevados investimentos feitos pelos cotonicultores, sobretudo em
máquinas.
Considerando que os produtores de grãos podem optar por milho ou soja, uma saída
razoável para garantir o abastecimento, diminuir os riscos e auferir lucros
seria plantar conjuntamente milho e soja, aproveitando inclusive os recursos de
financiamento para as duas lavouras, hoje da ordem de R$ 200 mil/ha para cada
um. Por que não?
Data de Publicação: 30/10/2001
Autor(es):
Sebastião Nogueira Junior (senior@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Marisa Zeferino (marisa.zeferino@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Benedito Barbosa de Freitas (bfreitas@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor