Potencialidade Da Produção Familiar No Sudoeste Do Estado De São Paulo: Alternativas Para Ganhar Mercado

            De maneira geral, o campo tem produzido resultados econômicos promissores ao país, decorrentes principalmente de uso intensivo de capital e da aplicação de altos níveis tecnológicos, garantindo competitividade às grandes cadeias produtivas.
            A agricultura familiar tem sobrevivido aos modelos agrícolas modernos graças à sua lógica de produção e há consenso de que essa categoria é carente de políticas públicas específicas para desempenhar seu papel no desenvolvimento da economia agrícola. No Brasil, a despeito de esforços governamentais em anos recentes, ela ainda não recebeu a devida importância. Embora os produtores familiares sejam fornecedores de alimentos e de mão-de-obra, trabalhem integrados com agroindústrias e contribuam para a economia local, muitos deles, antes inseridos no mercado, vêm perdendo espaço, determinando seu êxodo para as cidades, o que contribui para engrossar a fila de desempregados e dos movimentos sociais como o dos 'sem-terra'.
            No artigo 'Potencialidades e alternativas de produção para o desenvolvimento da agricultura familiar do sudoeste paulista', disponibilizado no site em 04/10/20021, os autores ressaltaram a importância da diversificação da produção agrícola, principalmente para pequenas áreas, como alternativa de conquistar e/ou se manter no mercado.
            Particularmente na região sudoeste paulista, cuja base econômica é a agropecuária e onde predomina a agricultura familiar, o cultivo de produtos básicos é tradicional e responsável pela geração de renda de parcela significativa da população.
            A saída para a absorção da mão-de-obra regional e para a obtenção de renda pelas famílias produtoras, que ainda permanecem no campo, seria estabelecer estratégias visando a sua readaptação às transformações estruturais da economia a partir da organização do processo produtivo, da adoção de tecnologias e da diversificação da produção direcionada a nichos de mercado e/ou para novos produtos que agreguem valor.
            Como já mencionado no estudo anterior, uma das alternativas para a região é a exploração frutícola, uma vez que o sudoeste apresenta condições edafoclimáticas favoráveis e tem localização privilegiada em relação aos grandes centros consumidores do país – em especial de São Paulo e Paraná – e até de países do Mercosul. A fruticultura tem também a vantagem de poder ser conduzida em pequenas áreas; poder utilizar intensivamente mão-de-obra ao longo do ano todo; por ser de cultivo perene permite maior controle da erosão e, ainda, pode gerar renda por um período prolongado de tempo.
            Conquanto seja uma atividade de alto investimento inicial, de longo prazo de maturação e que demanda cuidados especiais em sua condução, especialmente ao compará-la às lavouras de grãos, se bem orientada e contemplada com políticas específicas crédito, políticas públicas direcionadas à agricultura familiar e à região, pode se transformar em multiplicador de emprego e de renda.
            Existe uma gama de frutas sendo adaptada pela pesquisa aos moldes regionais e que poderiam ser exploradas comercialmente. Para ilustrar como a agricultura familiar poderia melhor se inserir no mercado e crescer, escolheu-se analisar a lavoura de feijão vis a vis uma fruteira que venha a se constituir em nicho de mercado.
            Dentre as frutíferas que poderiam ser preconizadas para essa região, a atemóia – híbrido resultante da cherimóia (Annona cherimoia Mill.) com a fruta-do-conde (Annona squamosa l.) da família das anonáceas – mostra-se como uma alternativa interessante, lembrando que já existe produção regional, embora de forma incipiente. É uma fruta exótica, com mercado interno em expansão, que pode ser comercializada inclusive na entressafra da pinha (que tem boa demanda interna) e sua exploração é indicada às pequenas unidades agrícolas – por exigir dedicação constante do fruticultor e de trabalhadores em todas as etapas da cultura, adequando-se aos moldes familiares de produção.
            A pequena produção do sudoeste paulista explora tradicionalmente grãos, com destaque para o feijão. Porém carece de informações econômicas dessas culturas e, principalmente, de novas opções de plantio para auxiliar na tomada de decisão quanto à substituição ou diversificação de produtos para o mercado.
            Utilizando informações das regiões noroeste e serrana do Estado de São Paulo, produtoras de atemóia, simulou-se a quantidade do uso da mão-de-obra na condução dos pomares a serem implantados no sudoeste e se comparou com a do cultivo tradicional de feijão dessa região. Adicionalmente, estimou-se a receita por unidade de área auferida pela atemóia versus a do feijão.
            Para um pomar em produção, na região oeste, utilizam-se 13 dias/homem por hectare para os tratos culturais da atemóia – podas, aplicação de adubos e defensivos - segundo estimativa do técnico da CATI; na polinização – necessária à planta no período considerado de entressafra – o coeficiente é de 15 dias/homem; e para a etapa que compreende colheita, classificação e embalagem foram estimados 50 dias/homem por hectare, correspondendo a 8 colheitas por safra. Portanto, para a condução do pomar de atemóia em produção tem-se um total de 78 dias/homem por hectare.
            Estudos realizados pelo IEA sobre coeficientes técnicos de utilização de fatores e custo de produção de feijão, na região sudoeste do Estado de São Paulo, indicam diferentes níveis tecnológicos para a cultura. Porém, no sistema mais tradicional, geralmente adotado pela pequena produção local, o uso de mão-de-obra no cultivo da leguminosa é de aproximadamente 17 dias/homem por hectare. Considerando duas safras ao ano, a quantidade desse fator se elevaria para 34 dias/homem por unidade de área, sendo as operações de capina, pulverização e colheita as maiores absorvedoras de trabalho neste sistema, o que mostra o menor uso do fator para o feijão em relação à atemóia, além de utilizá-lo apenas por cerca de 6 meses no ano.
            O maior problema, entretanto, é que os resultados econômicos do cultivo de feijão com esse padrão tecnológico, intensivo em mão-de-obra e com menor adoção de insumos, não têm permitido competitividade aos produtores que o praticam, uma vez que a produtividade é bem menor que aquela obtida com padrão tecnológico capital-intensivo, sistema praticado por médios e grandes produtores da região com condições de capitalização.
            Para a produtividade de 15 sacos de 60 kg/ha (por safra) obtida pelo produtor tradicional de feijão e ao preço de R$ 60,00, recebido por unidade (média dos últimos cinco anos), obtém-se uma receita total por hectare de R$ 1.800,00 para as duas safras/ano. Sendo o custo operacional estimado pelo IEA em torno de R$ 1.000,00 a cada safra (R$2.000,00 no total), conclui-se que, com a adoção desse sistema de produção, haverá descapitalização do agricultor, uma vez que a receita por ele auferida não cobre os custos. Na realidade, muitos desses produtores continuam na atividade, pois não remuneram de acordo com o mercado os membros da família, que constituem, grosso modo, a mão-de-obra empregada na propriedade familiar.
            A produção da atemóia – período de safra e entressafra –, estimada em 12 toneladas/ha na região noroeste paulista (e cerca de 18 t na serrana), serviu de parâmetro para os cálculos econômicos da atividade. Para o ano agrícola 2001/2002, consideram-se, na safra normal, 8 toneladas vendidas a R$2,00 a caixa de 3,7 kg e, na entressafra, 4 toneladas a R$10,00/caixa paga ao produtor. Portanto, obtém-se uma receita aproximada de R$15.000,00 por hectare. Ao custo operacional médio estimado em R$8.000,00/ha, o produtor de atemóia obtém uma receita líquida de R$7.000,00 por hectare. Convém ressaltar que, neste caso, os custos fixos de produção relativos à formação do pomar não foram computados nas estimativas de custo operacional, o que deve diminuir essa remuneração. Os resultados não devem deixar dúvidas sobre a superioridade de geração de emprego e de renda dessa fruta em relação ao feijão. Ressalte-se, porém, que a indicação de novas alternativas para o sudoeste não exclui, necessariamente, lavouras tradicionais da região.
            A atemóia já vem sendo adaptada para o clima e solo do Estado de São Paulo com alta produtividade e qualidade, podendo proporcionar renda complementar aos agricultores familiares. Essa fruteira tem se mostrado adequada também a locais de clima frio (região serrana) onde são dispensados os serviços de polinização, existem mudas selecionadas que permitem maior longevidade da planta e algumas práticas de cultivo já testadas com bons resultados, mas está a exigir outras pesquisas para sua implantação definitiva em novas regiões.
            A permanência dos pequenos agricultores no campo e, mais que isso, a melhoria da qualidade de vida de suas famílias vai depender de ações conjuntas dos representantes do setor, que viabilizem a distribuição dos 'frutos' do progresso agropecuário nacional. A pesquisa, a extensão e as instituições públicas locais, estaduais e federais, responsáveis pela adoção de políticas econômicas e agrícolas, devem estar atentas para o fortalecimento dessa categoria, levando em conta sua diversidade regional, tradições, cultura e perspectivas, permitindo-lhe ganhar mercado, emprego e renda.
 
 

1 MELLO e NOGUEIRA,2002. O artigo encontra-se no endereço:  http://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=311

 

Data de Publicação: 17/10/2002

Autor(es): Elizabeth Alves e Nogueira (enogueira@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Nilda Tereza Cardoso De Mello (nilmello@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Maria Lucia Maia (mlmaia@iac.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor