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Saldos crescentes nos agronegócios e melhor distribuição regional de renda
As notícias sobre a retomada do crescimento da economia brasileira têm pontificado a importância das exportações, o papel estratégico dos agronegócios e a relevância do Estado de São Paulo nesse processo. Esse incremento do produto nacional se dá no bojo de relevante aumento da produtividade industrial, que cresceu 7,2% em todo Brasil, na comparação do primeiro semestre de 2004 com igual período do ano anterior, e 10,5% em São Paulo, maior índice entre as unidades da federação brasileira, segundo o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI)1. 1 IEDI: www.iedi.org.br
Esses indicadores, que mostram incrementos da competitividade tanto nacional
quanto estadual, são coerentes com os resultados obtidos no mercado
internacional. Os últimos números do comércio exterior paulista não deixam
margem para dúvidas, pois, de janeiro a agosto, as exportações tiveram
crescimento de 39,3% e as importações, de 33,9%. Com isso, a participação de São
Paulo nas exportações brasileiras (31,1%), que já era alta, passou para 32,2%,
enquanto as importações evoluíram de 42,9% para 44,3%. Esse desempenho
representa a continuidade de um processo que se aprofunda há vários anos, dentro
da lógica da economia brasileira de fugir aos constrangimentos externos ao seu
desenvolvimento, segundo a qual 'exportar é o que importa'.
As exportações paulistas cresceram de US$ 17,5 bilhões para US$ 23,0 bilhões,
incremento expressivo de 31,6% no qüinqüênio 1999-2003. Num corte setorial, as
vendas dos demais setores avançaram de US$ 11,2 bilhões para US$ 15,4 bilhões,
enquanto as dos agronegócios, após queda de US$ 6,3 bilhões para US$ 5,5 bilhões
no biênio 1999-2000, mostram-se crescentes no quadriênio seguinte, atingindo US$
7,7 bilhões em 2003. Com isso, a participação setorial dos agronegócios nas
exportações estaduais passam de 27,9% em 2000 para 33,2% em 2003.
Já as importações paulistas apresentam-se decrescentes, com queda de 20,5% no
quadriênio 2000-2003, para US$ 20,3 bilhões em 2003, após o incremento de US$
23,3 bilhões para US$ 25,6 bilhões no biênio 1999-2000. Esse desempenho está
associado às aquisições dos demais setores, tendo em vista que as compras
externas dos agronegócios paulistas foram reduzidas em 15,0%, passando de US$
3,7 bilhões para US$ 3,2 bilhões no quinquênio 1999-2003. As importações dos
agronegócios paulistas, pouco mais de 15% das compras totais no exterior,
concentram-se em insumos para as agroindústrias de bens de capital da
agricultura que atendem à demanda de todo Brasil, ao mesmo tempo que são
indicador de modernidade setorial.
A evolução dos saldos comerciais revela a relevância dos agronegócios paulistas,
revertendo os sucessivos déficits da balança comercial estadual, que passou de
uma realidade de déficit de US$ 5,8 bilhões em 1999 para o superávit de US$ 2,8
bilhões em 2003. Nos demais setores da economia, as trocas externas ainda são
desfavoráveis, apesar da redução dos déficits anuais, de US$ 8,3 bilhões para
US$ 1,7 bilhão no período 1999-2003.
O superávit decorre dos agronegócios, que acumulam saldos comerciais positivos e
crescentes, uma vez que, após redução de US$ 2,6 bilhões em 1999 para US$ 1,8
bilhão em 2000, as vendas externas superaram as compras no exterior em valores a
cada ano maiores, alcançando a expressiva cifra de US$ 4,5 bilhões em 2003. Esse
crescimento de 151,4%, bem como a entrada adicional líquida de divisas de US$
2,7 bilhões, corresponde exatamente ao tamanho do superávit total acumulado pela
economia estadual em 2003.
Nas exportações das cadeias de produção de bovídeos, a carne bovina saltou de US$ 763 milhões para US$ 1,6 bilhão no quinquênio 1999-2003, assumindo a posição de maior segmento exportador dos agronegócios paulistas. Nas cadeias de produção das sacarídeas, com base no açúcar, há estagnação das exportações em torno de US$ 1,5 bilhão. Também as cadeias de produção de frutas, inclusive sucos cítricos, mostram-se
estagnadas em torno de US$ 1,3 bilhão no período 1999-2003.
Aumentos expressivos tiveram as cadeias de produção de têxteis (US$ 197,9
milhões para US$ 328,9 milhões), agronegócios especiais (US$ 257,1 milhões para
US$ 458,8 milhões), bens de capital - apesar da inconsistência (US$ 441,0
milhões para US$ 487,4 milhões), cereais e oleaginosas (US$ 391,2 milhões para
US$ 466,3 milhões) e suínos e aves (US$ 20,8 milhões para US$ 94,7 milhões). O
destaque negativo é o café cujas vendas externas diminuíram de US$ 461,2 milhões
para US$ 262,6 milhões.
Num processo marcado pelo aprofundamento da agro-industrialização, é importante
destacar o nível de agregação de valor dos produtos embarcados. Nas exportações
dos agronegócios paulistas, as vendas de produtos básicos mostram oscilação no
período, com queda de US$ 2,1 bilhões para US$ 1,1 bilhão no triênio 1999-2001 e
crescimento para US$ 1,6 bilhão no triênio 2001-2003.
Nos produtos semimanufaturados, há redução de US$ 2,4 bilhões para US$ 1,4
bilhão no quinquênio 1999-2003. É inequívoco o crescimento substantivo das
vendas externas de produtos manufaturados pelos agronegócios paulistas, que
aumentaram de US$ 1,8 bilhão para US$ 4,7 bilhões. Isto representa não apenas o
incremento de renda e emprego pelo efeito multiplicador da agregação de valor,
como também significa o rompimento definitivo com o rótulo de
primário-exportador com que era caracterizada a agricultura paulista, formatando
uma estrutura produtiva agroindustrial exportadora competitiva no contexto
internacional.
Esse crescimento dos saldos comerciais dos agronegócios no período 1999-2003 tem
impacto direto na renda agropecuária paulista. O valor da produção da
agropecuária paulista cresceu de forma persistente no período 1999-2003. Evoluiu
7% entre 1999 e 2000 (de R$ 18,4 bilhões para R$ 19,7 bilhões), mais 10,73%
entre 2000 e 2001 (de R$ 19,7 bilhões para R$ 21,7 bilhões), mais 10,95% entre
2001 e 2002 (de R$ 21,7 bilhões para R$ 24,1 bilhões) e mais 2,51% entre 2002 e
2003 (de R$ 24,1 bilhões para R$ 24,7 bilhões). A variação acumulada de 34,83%
em todo quinquênio 1999-2003 representa uma evolução significativa, com a
riqueza dessa economia monetária da produção rural crescendo de R$ 18,4 bilhões
para R$ 24,7 bilhões, sem contar os efeitos multiplicadores desse processo nos
demais elos das cadeias de produção setoriais.
Tomando como parâmetro o crescimento estadual de 34,63% no período 1999-2003,
tiveram taxas maiores: a laranja para indústria (77,96%), os grãos e fibras
(68,96%), as raízes tropicais (49,40%), as aves e suínos (39,91%) e a cana
(37,76%). Apresentaram aumentos expressivos, embora abaixo da média estadual: a
carne bovina (30,59%), as frutas frescas (26,94%) e o leite (26,55%). Os
agronegócios especiais (7,11%) e as olerícolas (4,87%) mostraram aumentos
reduzidos no período, enquanto o café se constituiu no único produto com queda
de renda (expressivos 50,96% em 2003, comparados com 1999), fruto da redução
vertiginosa dos preços internacionais.
Mas ainda, esse crescimento da renda ocorre dentro de um consistente processo de redistribuição regional, contribuindo para a desconcentração da riqueza do eixo Anhanguera-Bandeirantes, onde se localizam os municípios do grupo 1 do Índice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS), medido pela Fundação SEADE2 e divulgado pela Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo3. Nos dois lados desse eixo,
encontram-se municípios com indicadores que revelam maior carência social e
econômica, incluídos nos grupos 2 a 5.
Ao considerar as 15 áreas de abrangência de atuação dos pólos regionais da
Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA) no período 1999-2003,
verifica-se que em 7 delas, localizadas fora do eixo de maior desenvolvimento, o
crescimento da renda agropecuária no período foi maior do que a média estadual
de 34,64%. Noutras palavras, a renda agropecuária teve crescimento positivo e
expressivo em todas as regiões paulistas no quinquênio 1999-2003, mas, na
distribuição geográfica desse crescimento, observa-se consistente processo de
desconcentração regional da renda agropecuária. Tiveram crescimento superior à
média estadual (34,64%) a Alta Paulista (57,84%), a Alta Mogiana (51,84%), o
Sudoeste Paulista (50,07%), a Alta Sorocabana (48,66%), o Extremo Oeste
(40,96%), o Vale do Paraíba (39,84%) e o Centro Oeste (38,72%), todas elas fora
do epicentro Anhanguera-Bandeirantes. As demais 8 regiões de abrangência
apresentaram crescimento menor do que a média estadual, mas superior aos 13,13 %
verificados para a região denominada Sedes. Ou seja, Médio Paranapanema
(34,51%), Centro Sul (30,98%), Centro Leste (30,32%), Centro Norte (29,86%),
Nordeste Paulista (29,55%), Leste Paulista (29,06%), Nordeste Paulista (19,13%)
e Vale do Ribeira (18,12%).
A conexão entre o desempenho da balança comercial dos agronegócios paulistas e o
processo de incremento da renda setorial, bem como sua distribuição espacial
menos concentrada, mostra-se inequívoco. Isto reforça o papel setorial não
apenas como principal setor de economias continentais mas também como o único
presente e, por isso mesmo, capaz de levar o desenvolvimento para a totalidade
do espaço geográfico. Isso desde que amparados por políticas públicas
consistentes, uma vez que, desde há muito, já não são aceitas as teses da
geração expontânea.
Essas performances dos agronegócios derivam de políticas governamentais adotadas
na segunda metade dos anos 90s, tais como: a) a secutiritização da dívida dos
agropecuaristas que de 'caloteiros' passaram a ser 'empreendedores
bem-sucedidos', readquirindo o acesso ao crédito e, com isso, ao financiamento
do investimento em modernização; b) a desoneração do ICMS das exportações por
força da Lei Federal n° 87/96 (Lei Kandir), que destravou as vendas externas dos
agronegócios; c) a desvalorização cambial de 1999 que recoloca a competitividade
dos produtos brasileiros; d) políticas de aprimoramento da infra-estrutura da
logística setorial do Governo de São Paulo, em especial com o sucesso da
privatização por concessão das rodovias estaduais; e e) as estratégias de
políticas de qualidade pela defesa sanitária animal e vegetal, bem como a
geração de inovações tecnológicas.
Noutras palavras, é preciso reconhecer de forma definitiva que, em casos como o
dos agronegócios, nem sempre a continuidade representa o retrocesso e a mudança
o avanço.
2 SEADE: www.seade.sp.gov.br
3 ALESP: www.al.sp.gov.br
Data de Publicação: 16/09/2004
Autor(es): José Sidnei Gonçalves (sydy@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor