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Máquinas agrícolas: produção e vendas permanecem aquecidas
A
produção total de máquinas agrícolas cresceu 29,2% nos primeiros quatro meses de
2004 frente a igual período de 2003, contrariando diagnósticos que apontavam
para um arrefecimento no mercado de máquinas agrícolas automotrizes, como
reflexo das perdas nos volumes colhidos decorrentes dos diversos distúrbios
climáticos que assolaram importantes cinturões produtores. Maior ainda foi a
expansão das vendas (mercados doméstico e internacional) que cresceram 34,1%
nesse período, impulsionadas pelo forte incremento das exportações que
contabilizou aumento nos negócios de 78,2% entre janeiro e abril do corrente ano
(tabela 1). TABELA 1 - Produção, vendas e exportação de máquinas
agrícolas automotrizes, Brasil, 2002 e 2003, Janeiro a Abril de 2003 e 2004
A característica sazonal desse mercado repercutiu no maior volume de transações
entre janeiro e abril para o segmento de colhedoras, com expansão de 45,9% na
produção, 42% nas vendas para o mercado interno e 64,6% nas exportações. Por se
tratar de equipamentos mais custosos, esse salto nas exportações alavanca mais
que proporcionalmente o resultado cambial dos negócios ocorridos.
Como na maior parte das culturas o calendário agrícola ainda não se iniciou, a
venda de tratores de rodas não teve crescimento tão vigoroso como o observado
nas colhedoras, computando aumento de 7% no quadrimestre. Também, nesse caso, a
exportação foi o principal vetor de crescimento ao somar elevação de 77% no
período.
A demanda internacional no primeiro quadrimestre do ano, também, foi responsável
pelo aumento da produção no segmento de máquinas para execução de obras, como as
retroescavadeiras e os tratores de esteira. No primeiro caso, o aumento de 654%
nas exportações imprimiu elevação de 8,8% na produção, enquanto no segundo o
incremento na produção foi mais significativo, atingindo 26,1% ante uma
exportação de 65,2%.
A demanda do mercado interno, embora tenha transitado por momento de
expectativas desfavoráveis, manteve suas aquisições, ampliando em 10,9% as
compras. Com a efetivação das transações ocorridas ao longo da semana do
Agrishow/Ribeirão Preto, é possível que os números se tornem ainda mais
favoráveis, pois foi expressiva a alta no número de contratos celebrados pelos
bancos que participaram da mostra anual.
No rastro desse momento favorável no mercado, cresceram também a ocupação e a
receita cambial alcançados pelo segmento. Ao término de 2003, 11.654
trabalhadores estavam empregados na indústria de máquinas agrícolas
automotrizes. Nesse primeiro quadrimestre do ano, o emprego já se elevou para
12.076, ou seja, incremento de 19,5%.
Quanto às receitas, o crescimento foi verdadeiramente exponencial, praticamente
mais que dobrando aquelas observadas entre janeiro e abril de 2003. Diante desse
desempenho, torna-se cada vez mais concreta a hipótese de o País se configura
como uma plataforma mundial de produção e exportações de máquinas agrícolas
automotrizes, ombreando o já consagrado exemplo da EMBRAER.
1 Emprego refere-se ao mês de abril.
Fonte: Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos
Automotores (ANFAVEA).
O dinamismo do mercado de máquinas, suportado pelo incremento da demanda e da oferta de crédito oficial, tem ensejado a prática de preços muitas vezes vistos como elevados. Já se comentou que uma das prováveis explicações para essa questão tem sido as cotações dos insumos estratégicos utilizados nesse segmento (aço, metais usinados, borracha, etc.) cujos preços têm sido majorados muito acima da inflação e da variação cambial.
FIGURA 1 - Índices mensais de preços pagos de máquinas
agrícolas pela agricultura paulista, Janeiro de 2003 a Abril de 2004
1994 = base 100
Fonte: Instituto de Economia Agrícola.
Visando produzir uma informação menos sujeita a vieses particulares, preparou-se quadro comparativo entre o índice de preços pagos para máquinas agrícolas pelos produtores (aquisição +
reparos de tratores e colhedoras), o índice de preços recebidos para produtos
vegetais e a evolução da relação de troca entre ambos para o período janeiro de
2003 a abril de 2004 em âmbito do Estado de São Paulo. O índice de preços pagos
pelas máquinas vem apresentando tendência positiva de crescimento, enquanto o
índice de preços recebidos pelos produtos vegetais, após atingir pico em abril
de 2003, vem oscilando com tendência declinante.
Dessa forma, a relação de troca apresenta substancial elevação em favor dos
fabricantes de máquinas agrícolas, exigindo dos agricultores cerca de 21% mais
em produtos para efetuar gastos relativos aos equipamentos, o que confirma a
existência de um descompasso entre aquilo que os produtores rurais têm recebido
pelos seus produtos e o que o mercado pratica em termos de preços para as
máquinas novas.
Moderfrota: uma questão emblemática
Diversos economistas de renome posicionam-se de maneira diferenciada quanto à
análise que fazem do Moderfrota. Para alguns, trata-se de exemplo de como
deveria ser uma política industrial, evidenciando relativo sucesso quanto a: a)
renovação da frota com aporte de tecnologias de fronteira ao campo (a chamada
agricultura de precisão); b) diminuição substancial das perdas na colheita com
reflexos sobre a rentabilidade dos produtores; c) maior rendimento operacional
com menores custos por hora de utilização; d) despesas com a equalização da taxa
de juros bastante compensada pela arrecadação de IPI com o aumento das vendas; e
e) ganho de escala da indústria induzindo a decisão empresarial de locar novas
plantas e constituir no País uma plataforma mundial para a produção e exportação
de máquinas agrícolas automotrizes.
Em campo oposto, situam-se outros economistas que percebem no Moderfrota uma política disfarçada de subsídios ao setor, os mesmos que nossas lideranças do agronegócio e da diplomacia se empenham em se opor quando tratam com representantes dos países desenvolvidos. Ademais, acreditam que a existência desse programa distorce a real 'competitividade da agricultura frente a outros setores nacionais. Se for verdade que a indústria pode investir sem socorro do governo e a agricultura não, então o subsídio é ineficiente: emperra o crescimento da economia porque desvia recursos de atividades mais competitivas'.1 A legitimação do argumento pauta-se pela noção de que, ao se eliminar os subsídios ao crédito, as renúncias fiscais e as vinculações orçamentárias, se criam condições para que o 'mercado funcione e os empresários não dependam do governo'.
A definição de uma política industrial para o Brasil praticamente não foi
possível ao longo dos oito anos de governo FHC devido à prevalência de leitura
similar à acima enunciada. Optou-se pela focalização em segmentos específicos
como foi o caso da indústria de máquinas agrícolas automotrizes. Neste atual
governo, instituiu-se uma política industrial elegendo-se dois setores (fármacos
e softwares) e dois aspectos que se correlacionam com toda a matriz industrial:
a microeletrônica e a inovação tecnológica. Especificamente, os agronegócios não
foram eleitos como setor prioritário para a destinação dos recursos.
Em primeiro lugar, é preciso analisar se os juros praticados pelo Moderfrota são
efetivamente subsidiados ou se se trata de um argumento insidioso. A taxa de
juros utilizada é a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), calculada a partir da
expectativa do IPCA, acrescida do índice do chamado Risco Brasil, refletindo
exatamente as condições vigentes no mercado, embora abaixo daquela definida pelo
governo como a taxa básica de juros (Selic). A pergunta é: até que ponto a
diferença existente entre as duas metodologias pode ser considerada como sendo
juros negativos?
Nossas aplicações na poupança normalmente rendem abaixo dos fundos que
acompanham a Selic. Portanto, a população poupadora subsidia o governo? A
remuneração que o governo confere ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) é
ainda mais baixa que a da poupança. Se essa é a origem de parte dos recursos
utilizados na equalização do Moderfrota, e a TJLP é mais elevada que a taxa de
correção do FAT, ainda assim estamos diante de um subsídio? Em nosso
entendimento, a TJLP reflete juros reais, ainda que menores do que as mais
baixas taxas praticadas pelo mercado. Todavia, é importante que os debates
continuem para que se esclareça mais esse assunto controverso.
O agronegócio brasileiro é, sim, competitivo e essa conclusão não precisa se
valer de fórmulas econométricas para validar a hipótese. Será que o resto do
mundo protege sua produção de açúcar da concorrência brasileira por que aqui
existem políticas públicas de crédito dirigidas ao segmento, como o Moderfrota e
outras destinadas ao segmento (como o Finame-agrícola, por exemplo)? Certamente
que não.
A cana-de-açúcar é apenas um dos produtos que efetivamente revelam amplas
vantagens competitivas frente aos principais concorrentes no mercado
internacional. Se for verdadeira essa assertiva, torna-se imperiosa a criação de
condições que confiram sustentabilidade de longo prazo para esse poder
competitivo. Portanto, as ações como o estímulo à inovação tecnológica (presente
na determinação da nova política industrial) e o crédito de investimento, focado
em bens de capital de alto conteúdo tecnológico, formam os principais vetores de
uma estratégia bem-sucedida nesse campo.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a idade média da frota de máquinas é de apenas
quatro anos contra quase quinze da brasileira. Esse fato revela a importância de
termos no País uma política que estimule a manutenção de uma frota relativamente
moderna e atualizada, caso os agronegócios formem um dos ramos em que a economia
brasileira pode exibir virtuosismo.
1 CARDOSO, Eliana. Verde-e-amarelo. Jornal Valor Econômico, 07/04/2004. p.A 11.
Sites consultados:
http://www.anfavea.com.br
http://www.iea.sp.gov.br
Data de Publicação: 08/06/2004
Autor(es):
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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