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Influenza aviária e mercado de rações
A recente constatação da Influenza Aviária (IA) – também chamada gripe do frango ou gripe das aves – em vários países do Continente Asiático, logo após a divulgação ao final do ano passado da 'crise da vaca louca' nos Estados Unidos, tem provocado reações das mais diversas no mercado de carnes em todo o Mundo. Dados da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO)1 indicam que, desde o início da incidência da gripe,
já morreram ou foram sacrificadas cerca de 100 milhões de aves. Além disso tem
ocorrido óbitos humanos em diversos países em decorrência desse mal. 1FAO: www.fao.org
Incluindo as aves criadas para consumo humano, atualmente tudo que 'voa' está
sob suspeita: os marrecos treinados para comerem as plantas invasoras dos
arrozais asiáticos provocaram por exemplo, por parte do Brasil, a suspensão da
importação do grão procedente da Tailândia. Lá, estas aves migratórias estão em
observação, posto que alguns desses animais mortos encontrados foram
identificados com o vírus da IA e especialistas daquele país alertam para a
grande possibilidade de eles servirem de veículo para a disseminação da
moléstia. Embora remota, esta possibilidade também se estende ao Brasil já que a
gripe, sob qualquer forma, sempre foi um mal globalizado de rápida disseminação.
Até os aviões em rotas intercontinentais que transportam turistas e/ou agentes
de negócios causam apreensão às autoridades sanitárias do Brasil, por poderem
internalizar o agente transmissor da doença.
Diante disso autoridades sanitárias e setor privado brasileiros estão atentos e tomando providências para evitar a entrada do vírus no País fato que, se ocorrer, poderá mudar todo o quadro otimista vigente por parte das cadeias produtivas de proteína animal. A Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ)2 acaba de constituir um grupo de trabalho
multidisciplinar, visando coibir a entrada do mal no País.
Cabe lembrar que a avicultura brasileira tem sido, ao lado da soja, uma
atividade exemplar em termos de inovação tecnológica, desde o seu impulso na
década dos sessentas e vem apresentando, no decorrer dos anos, um crescimento
espetacular, alicerçado na consolidada presença internacional, mesmo sem a
ocorrência de eventos fortuitos como o que agora se registra.
Esta performance se explica por uma série de razões: material genético de alta
qualidade; conversão alimentar; manejo; gestão do negócio, e presença de grupos
empresariais fortes e capitalizados, etc. A disponibilidade de grãos de
qualidade nutricional satisfatória também tem contribuído para o avanço do
segmento.
Estudo recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)3 sobre o desempenho e crescimento do agronegócio no
Brasil, mostra que a avicultura evoluiu 223% no período de 1990 à 2002.
As três principais fontes brasileiras de proteínas de origem animal, também segundo o mesmo estudo, melhoraram sua presença no âmbito mundial, com o market share passando de 3,17% em 1996 para 8,15% em
2002. Para efeito de comparação o complexo–soja (grão, farelo e óleo), principal
item do agronegócio exportador, passou de 28,01% para 36,68% o que revela de
fato sua forte competitividade.
O rol de clientes da carne de frango brasileira hodiernamente conta com 120
países e poderá ter seu leque ampliado, além de passar a substituir e suprir
também grandes exportadores da Ásia, como é o caso da Tailândia, afetada pelo
mencionado mal. Os Estados Unidos, líderes do mercado mundial, também foram
atingidos por uma cepa do vírus da gripe e tiveram algumas compras externas
suspensas, fato que poderá favorecer o Brasil. A Rússia poderá cancelar
embarques daquele país, que por sinal fora favorecido administrativamente meses
atrás em detrimento do Brasil.
As divisas auferidas com as aves ultrapassaram recentemente aquelas obtidas com
a carne bovina, tradicional item protéico animal mais importante da balança
comercial brasileira.
A agregação de valor é notável no segmento com evolução gradativa da venda de cortes especiais; carnes preparadas e pratos prontos em substituição ao frango inteiro, considerado commodity por, praticamente,
não apresentar diferenciação, independente de sua origem geográfica ou sistema
criatório.
A suinocultura por sua vez, o segundo mais importante segmento da cadeia
produtiva de alimentação animal, também tem mostrado ganhos, embora os níveis de
preços praticados no mercado interno e interferências externas- como o sistema
de quotas imposto pela Rússia e restrições sanitárias de outros países – venham
restringindo parcialmente seu desempenho comercial nos últimos anos.
Seu êxito pode ser creditado também aos avanços decorrentes da inovação
tecnológica e da organização da cadeia produtiva, deixando o país nivelado aos
produtores mundiais considerados mais eficientes.
Em condições normais de mercado, o setor espera redução de plantéis, já que as exportações podem cair até 30% em relação às 491,4 mil toneladas registradas em 2003, segundo a Revista Porkworld4.
A disponibilidade atual de carne in natura é muito
grande, sobretudo em virtude do regime de quotas que a Rússia implantou. A
diversificação de mercados seria uma saída estratégica para desovar os estoques.
O segmento apresenta boas perspectivas pelo efeito–substituição considerando que
alguns países, temendo os efeitos da gripe das aves, poderão optar pelo seu
consumo.
Quanto à carne bovina, o Brasil ocupa posição de destaque no cenário mundial em
termos de remessas e captação de divisas, lembrando que há tempos atrás o
Ministro Pratini de Moraes, da Agricultura, defendeu-se com afinco das acusações
do Governo Canadense da existência do mal da 'vaca louca' em território
brasileiro.
As retaliações à carne ocorreram por causa de ganho por parte da Embraer, numa
disputa jurídica em fórum internacional contra a Bombardier, empresa gigante da
aviação que não se conformou com a decisão e conseqüente perda de mercado. Isto
mostra as adversidades e restrições às quais estão sujeitos os produtos
transacionados no mercado internacional.
Em termos de consumo de grãos/ração a atividade é pouco representativa, com
expressão apenas no sistema de confinamento, já que a prática mais comum é a
criação no pasto (capim), em contraposição ao que ocorre nos países de clima
frio. Em conseqüência, por efeito da demanda derivada, o mercado de componentes
de rações também foi afetado, ou seja, o de grãos em geral e de milho e soja em
especial, que constituem, regra geral, a base da alimentação animal independente
do tipo de sua formulação e destinação.
Diante de todo esse quadro que vem causando entusiasmo entre os exportadores nacionais de carnes, cabe lembrar que aves e suínos representaram cerca de 82% do consumo de milho e soja utilizados no arraçoamento animal, segundo o Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal (SINDIRAÇÕES)5.
Nos últimos anos têm ocorrido apenas problemas localizados no abastecimento
destes ingredientes, mesmo com a evolução acentuada e contínua nas exportações
do complexo–soja e, mais recentemente, com a volta do milho (a partir de 2001)
ao mercado exportador.
Segundo dados recentes da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB)6, no caso do milho mesmo com a redução na área
cultivada, menor produção na safra de verão e, provavelmente, também na
safrinha, somando os estoques que estão em níveis satisfatórios, o abastecimento
deverá ser suficiente mesmo com o aumento do consumo esperado nos segmentos de
criação e na exportação do grão. É provável que por conta da maior procura, o
produto aumente de preço em condições de estimular os plantios vindouros, dado
que a opção pela soja em virtude dos preços estimulantes tem sido um atrativo
para os agricultores brasileiros.
No caso da soja, a safra poderá ser da ordem de 60 milhões de toneladas (+15%), estando previstos embarques, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (ABIOVE)7, de 25 milhões de
toneladas do grão; 16,4 milhões de toneladas de farelo e 2,8 milhões de
toneladas de óleo, com aumentos nos três itens em relação ao ano anterior, mas
sem visível comprometimento do mercado interno. Sem dúvida os preços deverão ser
favoráveis aos sojicultores, sobretudo pela esperada quebra na safra
estadunidense e aumento do consumo interno e dos embarques de farelo.
A expectativa diante da Influenza Aviária é que as
exportações de frango possam crescer entre 10 e 15% em 2004. Dados de janeiro
pp. mostram ganhos de 7% na quantidade exportada e 39% no valor em relação ao
mês correspondente do ano anterior, embora ainda não se possa creditar este
avanço aos efeitos da crise.
2 FIOCRUZ: www.fiocruz.br
3 IPEA: www.ipea.gov.br
4 PORKWORLD. Paulínia, v.3,
n.18, p.8, jan./fev. 2004
5 SINDIRAÇÕES: www.sindirações.com.br
6 CONAB: www.conab.gov.br
7 ABIOVE: www.abiove.com.br
Data de Publicação: 02/03/2004
Autor(es): Sebastião Nogueira Junior (senior@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor